Crítica | O Segredo da Cabana (The Cabin in the Woods)

Nota
4

Dana Jules resolveram passar um feriado em uma cabana nas montanhas, na casa do primo de Curt, namorado de Jules, junto com Marty Holden, mas o que eles não esperavam era que essa cabana fosse cheia de segredos, que circundam os itens misticos guardados no porão, e de câmeras, que garantem que o grupo de amigos serão estrelas de um ‘reality’ macabro e completamente inesperado. Quando o grupo desce ao porão, e Dana acaba descobrindo um diário antigo e lendo suas palavras, uma família de mortos volta a vida e começa a caçar um a um dos hospedes da cabana, criando uma experiencia típica de filmes de terror.

A premissa por trás do roteiro de Drew Goddard e Joss Whedon é surpreendente, a trama possui três grandes camadas que vão se revelando vagarosamente e nos mostrando três filmes diferentes. O roteiro, que foi escrito em três dias pela dupla, tem a intenção de ‘revitalizar’ o gênero filme de terror e ser uma sátira crítica sobre a tortura pornô, e com toda a certeza acerta em cheio nos seus objetivos. A trama se inicia praticamente como um terror clássico, um grupo de jovens que vai para uma cabana isolada e com um histórico macabro e acabam despertando os espíritos dos antigos moradores (um grupo de xucros sádicos representados pelos Buckner), mas quando o filme vai se desenrolando e vamos conhecendo o trabalho de Gary SittersonSteve Hadley, a premissa vira completamente e se transforma em um reality do governo, onde vemos que tudo parece ser uma experiencia de uma agencia secreta, que está sendo realizada simultaneamente em várias partes do mundo, até que, inesperadamente, a terceira camada se revela e tudo ganha um tom muito mais fantástico e empolgante, tendo a maior reviravolta da trama.

Com a direção do próprio Goddard e a produção de Whedon, o longa introduz um toque pós-moderno nos filmes de terror e deixa claro seu desejo de subverter os clichês ao mesmo tempo que os abraça, tudo para posteriormente trazer à tona um novo significado a eles, um significado muito mais profundo. A dupla teve o intenso cuidado até de introduzir dois personagens marcantes na trama, que apesar de pouco destaque fica claramente representando visões críticas sobre toda a situação. De um lado temos Daniel Truman, um segurança novato que se mostra o tempo todo estar ali apenas pelo emprego, e representa aqueles que teriam que lutar contra sua bussola moral ao trabalhar em algo tão controverso e ao mesmo tempo discordar do que está fazendo. Do outro temos Wendy Lin, a cientista que parece saber de todos os segredos e propósitos e, apesar de concordar com tudo que acontece, ainda sente vergonha de sua participação e parece buscar uma bolha de sanidade que a ajude a fugir de toda a situação.

Como se não bastasse, o filme de terror, que normalmente é uma produção tão superficial, mostra que a dupla de roteiristas quis inovar de uma forma tão intima que criou uma profundidade moral indescritível na obra. Um único filme foi capaz de criar uma mitologia tão forte, que o roteiro não pede continuidades mas conquista o público de uma forma que ele deixa brechas para tantas outras sequencias ou prequelas, tanto com seu final que é tão definido e ao mesmo tempo uma ponte perfeita para uma sequencia com um tom diferente, quanto sua mitologia, que nos apresenta mais de 60 novas possibilidades de filmes (todas como referencias a filmes de terror e suspense da história do cinema), principalmente ao deixar claro que essa experiencia é anual e acontece em várias partes do mundo, nos mostrando que há 60 formas de a trama se desenrolar só nos EUA (deixando os fãs sedentos por ver o desenrolar de cada uma dessas possibilidades) e que é possivel até fazer filmes mostrando como as experiencia acontece em cada uma dos lugares do mundo onde ela se desenrola.

Além da trama em si, as referencias veladas da trama são outro show a parte, que nos levam a dar de cara com Sigourney Weaver (uma grata surpresa aos fãs do terror clássico) surgindo numa participação como The Director, a pessoa que está comandando todo esse experimento sádico pelo mundo e surge como uma alegoria ao papel de Goddard, um diretor de filme de terror, que é responsável por explorar o medo e a carnificina para entreter àqueles que consomem seus experimentos. A dupla ainda escolheu trazer a participação de Tom Lenk, que vem como homenagem ao passado da dupla (que não trabalhavam juntos desde que finalizaram Buffy the Vampire Slayer e Angel), e criaram, dentro da mitologia, O Ritual, que é uma das maiores alegorias do filme, tendo diversos elementos roteirísticos que faz uma piada metalinguista à estrutura básica de um filme de terror, brincando o tempo todo com suas alegorias para metalingualizar os filmes de terror e representar todos os participantes em formas dos clichês e de símbolos como Os AnciãosA Organização.

No fim, o que fica claro é que Drew Goddard e Joss Whedon criaram uma obra do terror que transcende seu gênero de uma forma tão surpreendente que, quando analisado a fundo, nos deixa esbasbacado com tamanha pretensão e egocentrismo, brincando com o público e com nossos conceitos, nos conquistando não pelo terror (que surge de forma mediana) mas pela forma como conseguem ir além, brincando inclusive com a diversidade do terror e suspense ao referenciar os experimentos do mundo e mostrar o terror clássico (EUA), o horror japonês (Kyoto), os filmes de catástrofe (Estocolmo), monstros gigantes (Buenos Aires) e horror gótico (Madri).

Cheio de analogias e auto-reflexões ao cinema de terror ao redor do mundo, O Segredo da Cabana se torna um filme quase perfeito, falhando apenas por não ter se arriscado ainda mais em seu primeiro ato para nos levar a ver um verdadeiro terror americano.

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *