Nota
A década de 80 foi responsável por vários filmes sobre as dores e os amores da adolescência. Tal qual a realidade, vimos os dilemas próprios dessa fase e seus impactos na formação desses jovens. Embora beba dessa fórmula, “O Clube dos Cinco” trouxe uma roupagem diferente, a partir do momento em que comédia e drama se unem para alcançar seu objetivo: o diálogo com o público jovem, independentemente do seu perfil.
Aqui, somos apresentados ao atleta Andrew, ao valentão John, à neurótica Allison, à patricinha Claire e ao nerd Brian, trancafiados numa sala de detenção da escola por motivos diferentes. Imagina passar uma noite de sábado com pessoas totalmente opostas? Em 97 minutos, John Hughes expõe que, até dentro de personalidades distintas, há semelhança nos mínimos detalhes. Mesmo estigmatizados por “rótulos”, aos poucos, arrancam suas máscaras e escancaram seus reais sentimentos, mudando para sempre suas vidas.
Desde o princípio, o que mais chama a atenção é o desenvolvimento sólido dos personagens. Apesar dos estereótipos, conseguimos enxergar a vida real em cada comportamento aparentemente fictício e nada soa artificial. Nesse contexto, o primeiro encontro dos cinco protagonistas é marcante, visto que uma aparente inimizade entre ambos salta aos olhos do espectador, como se cada um estivesse renegando a companhia do outro. Não é difícil pensar na situação, visto que o próprio ambiente escolar é cercado de diferenças que ecoam nos corredores e nas salas de aula e ninguém está livre dessas comparações.
Em todo momento, o roteiro busca fugir de tabus e não hesita em dialogar com temas pertinentes como virgindade, sexo e drogas. Como lidar com esses anseios? Nesse sentido, as conversas são naturais, ainda que os adolescentes encontrem dificuldades para o diálogo. Afinal, a demonização dessas temáticas dentro de casa reverbera nos quatro cantos da sociedade, e faz com que haja uma certa ignorância sobre a questão, não permitindo um tratamento natural e distanciando relacionamentos de informações.
Quanto mais os cinco jovens destrincham seus dilemas e suas sensações, mais o espectador se envolve com aquela confidência inesperada, tal qual a pandemia, onde as relações familiares são postas à prova com a convivência diária o dia inteiro. Invadir a intimidade do outro – com o consentimento – passa a ser a opção de sobrevivência naquele lugar, como uma forma de desabafar sobre os tormentos e as inseguranças que assombram as criaturas da narrativa.
Mais do que isso, é ter a conclusão de que até a pessoa mais segura de suas atitudes também têm suas inseguranças, e só não as vomita por medo do julgamento da sociedade. Hughes não romantiza, por exemplo, a violência com a qual John trata todos, nem a arrogância de Claire. Ele condena ambos, mas expõe que seus comportamentos são frutos da mentalidade bruta de um ciclo que parece não ter um fim, mesmo que tenham chances de redenção. A mensagem é clara: em nome das aparências e para sobreviver a uma sociedade moralista, vale tudo – até mascarar as reais intenções.
Incrivelmente sintonizado, o elenco se mostra o maior acerto da trama. Molly Ringwald e Anthony Michael Hall, intérpretes de Claire e Brian, captam toda a essência de seus personagens e se tornam os maiores nomes da obra, emulando tipos que aparentam estar à beira de uma explosão. Emilio Estevez (o Andrew), Judd Nelson (o John) e Ally Sheedy (a Allison) também defendem com muito mérito seus perfis e se destacam positivamente em vários momentos. A impressão, do início ao fim, é que todos encarnaram literalmente seus papeis e dão mais veracidade à história.
35 anos depois, “O Clube dos Cinco” se mostra tão atual do que antes e ainda mantém suas mesmas problemáticas. Divertido na medida certa e pesado no que propõe, o filme cativa, toca na ferida e consegue dialogar com quem assiste, construindo uma identificação única entre os personagens e o “mundo real”. É a maneira mais clara de mostrar a desconstrução de pessoas e o quão uma simples troca de confidências pode significar excessivamente e mudar os rumos. Grandioso demais.
Vinicius Frota
Apenas um rapaz latino-americano apaixonado por tudo que o mundo da arte - especialmente o cinema - propõe ao seu público.