“Essa é Kurôzu. A cidade onde nasci e cresci. O que venho relatar agora… são os estranhos ocorridos que aqui se deram…”
Kirie Goshima sempre viveu uma vida tranquila e sem grandes preocupações na pacata cidade de Kurôzu, onde conhece cada cidadão pelo nome e verdadeiramente sente-se em casa. Mas, acontecimentos perturbadores começam a surgir na pequena cidade, causando alvoroço entre seus moradores.
Ventos misteriosos sopram em curvas, folhas e ramos se enrolam em padrões estranhos, que constroem uma sensação constante enquanto redemoinhos sinistros invadem aos poucos a cidade. Tudo piora quando os aspectos espirais começam a afetar os moradores locais, transformando suas feições e despertando padrões obsessivos que consomem toda alma presente nos arredores de Kurôzu.
Sendo avisada por seu namorado, Shuichi Saito, Kirie tenta escapar da estranha maldição, mas o fenômeno helicoidal parece se estreitar ao seu redor, trazendo um claustrofóbico aprisionamento dentro da espiral. Seria ela forte o suficiente para escapar da maldição aterradora ou apenas mais uma peça no padrão pouco natural que consome a cidade?
Junji Ito tem um dom, e isso é inegável. O mangaká tem o poder de subverter aspectos positivos da cultura na qual está inserido, trazendo uma forma perturbadora em seus traços belos e macabros. E é justamente ao abusar do abismo hipnótico de seus enredos que Ito toma controle da narrativa.
Uzumaki aproveita bem esse crescimento apoteótico, sintetizando, com maestria, o medo puro e primitivo que carregamos em nosso interior. Ito aproveita seus cenários calmos e tranquilos em uma crescente desconcertante, construindo camadas profundas nas personas exibidas para despertar a insanidade cósmica ali presente. Cada aspecto é usado com maestria, trazendo uma sensação vertiginosa que consome o leitor e desperta, ainda mais, o crescimento espiral que a narrativa procura adotar.
Surgindo através de pequenas crônicas, as histórias vão construindo seus subtemas de maneira precisa e avassaladora, até despertar uma insanidade crescente que consome as páginas em sua totalidade. Inicialmente, os capítulos não parecem ter grande ligação entre si, afastando-se do cerne principal apenas para retornar com força em um momento oportuno, demostrando o quão grandioso os efeitos podem ser.
Causas sociais bastante comuns no nosso dia-a-dia, são levadas ao extremo, frisando ainda mais a obsessão dos personagens que ganham ares titânicos ao longo da jornada. Cada cenário é bem explorado, trazendo novas dimensões à maldição e construindo vertentes magníficas do horror, o que nos deixa vidrados a cada virada de página e inteiramente perturbados com o rumo da narrativa.
E é exatamente nisso que mora o grande acerto do mangá: sua ambientação sublime. Somos mergulhados em suas reviravoltas e acompanhamos o crescimento dos atos, nos amedrontado quando necessário e pescando as pistas soltas que parecem crescer durante as páginas. Kirie serve como nossa âncora, nos prendendo à narrativa enquanto observa os acontecimentos ao seu redor. É através dela que o enredo avança, e é com ela que passamos a nos importar com os personagens mostrados.
Shuichi, por outro lado, tem a função de nos alertar e despertar nossos sentidos. O rapaz consegue enxergar através das espirais, analisando sua verdadeira natureza enquanto se torna ainda mais recluso e solitário com o avançar da maldição. Embora seja bastante ignorado pelos demais, é com ele que percebemos a profundidade dos acontecimentos e como isso parece mais interligado do que imaginávamos.
Repleta de temas pesados e momentos grotescos, Uzumaki está longe de ser uma obra fácil. Bebendo diretamente do horror cósmico de Lovecraft, a obra traz uma crescente avassaladora que extrapola o convencional ao construir um gore inteligente e perspicaz que sabe aproveitar cada segundo de sua narrativa. Avaliando a insanidade humana e sua reação ao extraordinário, o mangá nos tira de nosso lugar comum e nos mostra a verdadeira face por trás de nossos pecados, trazendo assim uma análise angustiante sobre aquilo que não queremos enxergar.
“Devo estar passando por isso por causa daqui… desta cidade amaldiçoada pela espiral. Mas estou sem força de vontade para fugir deste lugar… será que os cachos de meu cabelo estão roubando a minha energia?”
Phael Pablo
Preso em um espaço temporal, e determinado a conseguir o meu diploma no curso de Publicidade decidi interagir com o grande público e conseguir o máximo de informações para minhas pesquisas recentes além, é claro, de falar das coisas que mais gosto no mundo de uma maneira despreocupada e divertida. Ainda me pergunto se isso é a vida real ou apenas uma fantasia e como posso tomar meu destino nas minhas mãos antes que seja tarde demais...