Crítica | Cinderela (Cinderella) [2021]

Nota
2.5

“Nós somos parte da Nação do Ritmo”

Em um reino antiquado e extremamente preso às tradições, a viúva Vivian luta para sobreviver junto às suas filhas, a metida Malvolia e a egocêntrica Narissa, e de sua enteada, a esforçada Ella, que sonha em um dia se tornar uma estilista famosa. Não muito longe, o Príncipe Robert, que só quer saber de bebedeira e diversão, se vê obrigado a conseguir uma esposa e assumir o trono, uma obrigação que ele não deseja de jeito nenhum, enquanto recebe a pressão de seus pais, o Rei Rowan e a Rainha Beatriz, que não enxergam que a verdadeira vocação de comando do reino está na Princesa Gwen, a caçula da família. Todas essas estórias começam a se cruzar quando, depois de Robert rejeitar mais uma noiva, o Rei resolve fazer um baile onde o Príncipe terá a obrigação de encontrar uma noiva, e que lugar melhor para Ella conseguir contatos que a tirem do pesadelo de morar no porão da casa de Vivian?

Kay Cannon não é um nome que passe despercebido, ela é a criadora da franquia Pitch Perfect, o que motivou uma enorme expectativa no momento que a Columbia Pictures a anunciou como diretora de uma nova versão musical de Cinderela, que teria roteiro de James Corden, era uma aposta certeira em mais um longa de sucesso na carreira dos dois executivos. Modernizando o conto sem mudar sua essência, o longa se passa na época original mas se desenrola salpicado por diversos ideais progressistas, debatendo sobre empoderamento feminino ao mesmo tempo que solta piadas durante seu desenrolar. Se o longa tinha uma expectativa de se tornar um sucesso imediato, não foi isso que vimos chegar na Amazon Prime em 3 de Setembro de 2021, protagonizado por Camila Cabello, Billy Porter e Idina Menzel, o filme se perde completamente em meio a tanto potencial, nos entregando um resultado que mais parece um projeto de filme da Disney que não deu certo.

A Cinderella de Cabello é uma jovem sonhadora, ela não é aquela jovem que busca um casamento dos sonhos para sair das garras de sua madrasta, mas sim uma garota que quer ser sua própria salvadora, sem depender de ser a sombra atrás de um grande homem. As cenas musicais da cantora são perfeitas, o que justifica completamente os motivos da escolha, e, mesmo que Cabello mostre que tem um grande potencial para trabalhar com comédias, seu trabalho de atuação fica um pouco agridoce em certos momentos, deixando a dúvida de se a cubana realmente deveria ter seu primeiro trabalho como atriz sendo uma protagonista. O príncipe de Nicholas Galitzine é um rebelde indomável, ele é totalmente avesso a todo o tradicionalismo e às obrigações que deve ter como futuro rei, ele só quer poder viver sem a pressão de ter que casar com alguém por arranjo, quer ter tempo para conhecer seu verdadeiro amor. Infelizmente Galitzine não brilha o suficiente no papel de protagonista, ele é uma ferramenta na mão do roteiro que foca muito mais nos grandes nomes com papeis coadjuvantes do que no príncipe que parece não ter muito a adicionar ao enredo.

A Madrasta de Menzel é uma revelação, ela traz nuances por trás da maldade de Vivian, nos mostrando uma mulher amargurada depois de ser obrigada a abrir mão de seus sonhos por conta do casamento. Infelizmente a atriz é ofuscada no longa, sendo subaproveitada pelo roteiro, o que é um erro ao se considerar seu currículo maravilhosamente respeitável nos musicais e em contos de fada, como o musical Wicked e o filme Frozen. As participações de Porter, que vive a fada agênero Fab G, e de Corden, um dos camundongos que vivem com Ella, podem ser bem pontuais, mas ganham uma certa importância para o desenrolar da trama, até maior do que as participações de Maddie Baillio e Charlotte Spencer como as irmãs postiças de Ella. Por outro lado, a Rainha Beatriz de Minnie Driver e a Princesa Gwen de Tallulah Greive acabaram tendo menos tempo de tela do que necessitavam, temos várias sequencias que mostram que as duas buscam combater o machismo impregnado na sociedade, mas o longa não dá espaço suficiente para que elas evoluam ou tenham uma interferência relevante no enredo, perdendo a chance de seguir um caminho que só enriqueceria a mensagem por trás da trama.

Considerando que estamos falando de um musical, a trilha sonora é um ponto essencial de se considerar, mas devemos lembrar do passado de Cannon, lembrar que ela fez sucesso com uma franquia musical onde as letras não eram parte essencial do roteiro, onde suas personagens tinham um motivo para estar cantando o tempo todo e por isso as releituras das músicas soavam tão agradáveis. Em Cinderella, as letras deveriam ser a essência da história, é através delas que boa parte da trama deve ser desenvolvida, o que faz a releitura de 2021 ser infeliz na hora de ser considerado como um verdadeiro musical. É gostoso assistir releituras de MadonnaQueenJanet JacksonEd Sheeran e tantos outros, mas o problema é que as letras não foram feitas para complementar a história, o que faz com que as cenas sejam tudo menos um devaneio narrativo que guie a evolução do roteiro, são sequencias que veríamos facilmente em um episódio de Glee mas que não se encaixam bem em uma releitura de Cinderella. Por outro lado, é impossível falar da trilha sem citar a excepcional “Material Girl” executada por Idina, a letra se encaixa perfeitamente em sua personagem e acaba se tornando o ponto alto musical do filme, soterrando até “Million to One”, musica criada por Cabello especialmente para o filme.

Se mostrando uma versão mais atual e da história, Cinderela até poderia ter sido uma releitura marcante se tivesse uma melhor execução de sua proposta. Apesar de a atuação de Cabello evoluir positivamente no decorrer do longa, ela começa um pouco fraca, como se ela ainda estivesse se encaixando no papel, o que só piorado pela forma como boa parte do elenco não tem um brilho que a ajude a carregar bem o enredo, e os que tem o potencial para melhorar a trama são os que tem menos tempo de tela. A modernização do conto foi um ponto positivo, apesar de a produção ainda pedir mais debates de certos temas e um melhor efeito especial para compor toda a narrativa, mas a sensação de acerto ainda é visível. Não é um daqueles filmes maravilhosos que todos esperávamos, mas seria mentira dizer que ele não consegue ser divertido e seria facilmente um daqueles filmes para se assistir num domingo a tarde ou ser exibido em uma futura sessão da tarde.

“É, vocês vão saber meu nome.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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