Crítica | A Lenda de Candyman (Candyman) [2021]

Nota
4.5

“Essa é uma história sobre uma mulher chamada Helen Lyle.”

Os arredores de Cabini-Green avançaram durante os anos, deixando a lenda de Candyman em seu passado, mesmo que ainda circule pelas ruas uma história sobre a estudante de pós-graduação, Helen Lyle, que enlouqueceu e quase matou um bebê do gueto pouco antes de se suicidar se jogando numa fogueira. Atualmente, Anthony McCoy, a grande esperança negra da cena artística de Chicago, mora naquele mesmo prédio próximo ao gueto onde tudo aconteceu no passado e, quando ele escuta sobre a história de Helen, uma chama acende dentro dele, o fazendo buscar entender sobre o que realmente aconteceu para encontrar inspirações para uma nova fase artística de suas pinturas, ele só não esperava que isso fosse desenterrar um monstro há muito tempo esquecido, que após seu nome ser repetido cinco vezes seu nome em frente ao espelho, o Candyman voltaria para uma nova leva de crimes e banho de sangue.

Quase trinta anos depois do lançamento do filme de Bernard Rose, e depois de duas sequências que massacraram a franquia, uma nova sequência direta para o filme de 1992 é lançada. Com direção de Nia DaCosta e roteiro de Jordan Peele, Win Rosenfeld e DaCosta, o longa resolve situar seus eventos algumas décadas após a morte de Helen Lyle, depois que a comunidade das margens de Cabini-Green resolveu enterrar de vez o segredo sobre o que realmente aconteceu naquela noite. Segundo a premissa do novo filme, a lenda de Candyman acabou ficando esquecida pelos anos, com todas as pessoas que nele acreditavam decretando seu nome como proibido, até o dia em que uma pessoa quebra o silencio, mostrando que Candyman é muito mais do que uma pessoa, que a maldição que começou com Daniel Robitaille cresceu, que agora Candyman é uma colmeia, uma entidade que une todos os negros mortos injustamente pelos brancos.

Protagonizado por Yahya Abdul-Mateen II, o novo longa é a mistura perfeita do debate racial proposto no filme de 1992 com o discurso antirracista que já é marca registrada nas produções de Peele. A produção engrandece a mitologia e respeita toda a composição racial criada por Tony Todd para o Candyman, um negro que foi assassinado por ter se apaixonado pela filha de um fazendeiro branco, ao mesmo tempo que adiciona elementos que só enriquecem a premissa, dando ao Candyman força a medida que se une à revolta de outros negros assassinados injustamente, transformando um filme de terror de padrão hollywoodiano em mais um Terror Social para o currículo de Peele. O personagem de Yahya é preciso, ele caminha carregado de mistérios que são alimentados pelo desenrolar do longa (e que podem ser desvendados desde o primeiro ato por aqueles que forem mais atentos), justificando toda a obsessão que surge quando ele escuta falar do Candyman, deixando claro o quanto o papel dele nessa história é crucial e profetizado. Ao contrario de Rose, DaCosta nos brinca com o suspense e a inquietação por trás da lenda, deixando-o sem rosto ao mesmo tempo que traz um roteiro que enche o antagonista de rostos, mostrando que a questão não é sobre quem é o Candyman, mas sim o que o torna o Candyman, ele nos força a refletir sobre os diversos ‘Candyman’ que tivemos pelo mundo e sobre o quanto o racismo é a maior fonte de poder para esse ‘vilão’.

Teyonah Parris surge excelente no papel de Brianna, a namorada de Anthony que se envolve o tempo todo no enredo mesmo sem interferir verdadeiramente, se tornando o lado racional da história, tentando tirar seu amado da loucura que tomou Helen, e protagonizando uma das melhores cenas do longa no ato final. Já Nathan Stewart-Jarrett, que vive Troy (o irmão de Brianna), surge muito mais como um alivio cômico para toda a tensão da história, o longa está ciente do peso de sua mensagem e equilibra ele com as situações engraçadas protagonizadas por Nathan, fazendo com que ele, junto com a dupla protagonista, seja um dos agentes principais para os três pilares tonais da obra. Apesar de rápidas, as participações de Virginia Madsen, Tony Todd e Vanessa Williams são brilhantes, servindo como peças principais na conexão entre o filme de 1992 com o de 2021, tornando tudo tão natural e palpável que poderíamos facilmente enxergar os dois filmes funcionando como se tivessem sido feitos um para o outro. Infelizmente nem tudo é perfeito em todos os pontos, o roteiro acaba falhando em questões mínimas, que podem prejudicar futuramente a cronologia da franquia, como por exemplo em sua introdução, que se passa em 1977, antes dos eventos de 1988, não se encaixando na mitologia apresentada no primeiro longa, e sendo explicado posteriormente de uma forma que só se justificaria se a introdução se passasse após 1988.

Com uma abordagem certeira e um visual envolvente, A Lenda de Candyman aprofunda a mitologia da franquia ao mesmo tempo que a apresenta a novos espectadores, sabendo aterrorizar o público equilibradamente longo de seus 90 minutos. Surgindo como uma sequência bem feita para o longa de 92, a produção é bem preenchida com imagens assustadoras, um horror instigantes e temas ácidos, que só evidenciam ainda mais os debates sobre injustiça racial, nos levando junto para gritar por justiça, e garantem o sucesso do longa. Ao contrario das diversas outras sequencias de franquias de terror, essa não só consegue fugir da sina de arruinar seus monstros como consegue seguir o caminho oposto, trabalhando a dor por trás da maldição e enriquecendo o background do assassino por trás da lenda, tornando-o novamente um viral (que se torna assunto nos banheiros e corredores de escolas) e exaltando o poder que a raiva racial pode ter, adicionando profundidade à história que um dia foi um conto de Clive Barker e dando um avanço para a premissa que mudou a história do cinema décadas atrás.

“Candyman. Candyman. Candyman. Candyman. Candyman…”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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