Crítica | Till – A Busca por Justiça (Till)

Nota
4.5

“Esse é o cheiro do corpo do meu filho. Fedendo a ódio racial.”

Em 24 de agosto de 1955, Emmett ‘Bo’ Till, um menino de 14 anos negro que tinha vindo de Chicago para o Mississipi passar as férias com seu primo, elogiou a beleza de Carolyn Bryant, uma balconista branca de uma mercearia, e assoviou para ela. Alguns dias depois, Roy Bryant e JW Milam, dois homens brancos, invadiram a casa de seu tio a noite e o levaram para um galpão onde o espancaram até a morte. Uma morte por motivações racistas que destruiu uma mãe e acabou se transformando no combustível para uma das maiores lutas pelo direito negro na época, a morte de Bo doeu profundamente em toda a comunidade negra dos estados, mas foi a garra e a força de Mamie Till-Bradley quem inspirou a comunidade negra a enfrentar a justiça, dominada pelos brancos, e tentar fazer justiça pelo jovem Bo.

A história real do assassinato de Bo Till e da luta de Mamie é um projeto ao qual Chinonye Chukwu se dedicou desde 2020, e o resultado do projeto só mostra o quanto seu trabalho excepcional conseguiu o que queria ao expor um caso doloroso e tão importante para a comunidade negra americana. A roteirista e diretora foi fundo na história, se baseando nas pesquisas de Keith Beauchamp e trazendo a consultoria de Simeon Wright, primo de Bo e testemunha de seu sequestro, o que só ajudou a trazer uma versão tão carnal, sem maquiagem e incisiva do caso. O longa, que por coincidência foi lançado após a promulgação da Lei Anti-linchamento Emmet Till e no mês da inauguração da estatua em memória de Emmett no Mississipi, se mostra essencial para o mundo lembrar do perigo que o racismo, que resiste até hoje entranhado na sociedade, pode oferecer e o poder que o amor e a raiva de uma mãe pode atingir na busca por justiça, mesmo que ela demore anos para ser feita.

Jalyn Hall no papel de Bo, Frankie Faison como John CarthanWhoopi Goldberg como Alma Carthan entregam um trabalho maravilhoso, envolvidos na trama e carregando o peso que é representar essa história tão carregada de dor, mas é Danielle Deadwyler no papel de Mamie quem rasga nossa alma em pedaços, ela encarna o papel doloroso da mãe de Bo de uma forma que nos faz sentir a dor que aquela mulher sentiu há quase setenta anos atrás, ela consegue encarnar uma poderosa e canalizar para a tela de uma forma indescritível, que com certeza vai levar muitos espectadores às lagrimas muitas e muitas vezes. Mamie com certeza será um papel que vai marcar a carreira de Deadwyler, e pelo qual ela merece toda aclamação, assim como a história de Mamie e Bo marca a alma de todos que o assistirem. Não é a toa que o filme  tenha sido eleito um dos melhores filmes de 2022 pela National Board of Review e deixa no ar a dúvida do por que não vermos o longa aparecer no Oscar depois do excelente roteiro de Chukwu e da aclamadíssima atuação de Deadwyler, atuação que tenho certeza que poderia facilmente ser uma das preferidas para o prêmio de Melhor Atriz.

Doloroso e extremamente atual, Till – A Busca por Justiça traz a tona um debate tão antigo quanto atual, que nos lembra o quanto a sociedade parece evoluir tão vagarosamente quanto a certos assuntos e até nos coloca para questionar até quando vamos precisar de tantos filmes sobre o sofrimento do povo negro (que parece sempre histórias tão iguais e ao mesmo tempo mostram ‘personagens’ tão diferentes) para que mudanças comecem a ser realmente feitas. Till não é o primeiro e, provavelmente, não será o último a falar sobre a dor de ser negro, mas merece muito destaque pela forma como ele nos toca profundamente, como a diretora escolheu a abordagem correta para tocar na maior parte da audiência possivel: o ponto de vista de uma mãe. Till pode não ser inventivo ou revolucionário ao trazer alguma trama nova ou em mudar a forma de se contar sua história, mas ele deixa claro que não estamos ali para ver algo novo, mas sim para enxergar que algo novo precisa ser feito para que os dilemas raciais do passado parem de continuar sendo tão atuais.

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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