Crítica | Os Estranhos: Capítulo 1 (The Strangers: Chapter 1)

Nota
1.5

O misticismo do horror, que tão bem penetra as sombras de nossa psique, depende de uma confluência delicada entre narrativa, direção e execução. Em Os Estranhos: Capítulo 1, dirigido por Renny Harlin, essa trilha sinuosa, que deveria nos levar ao âmago do medo, se perde em um labirinto de clichês e repetições, criando uma experiência que falha em capturar a essência aterrorizante de seu predecessor de 2008. Se o terror é uma arte de insinuações e sutilezas, Harlin parece ter se esquecido disso, entregando-nos um remake que soa como uma paródia sem intenção.

O filme começa com uma premissa quase idêntica à original: Maya (Madelaine Petsch) e Ryan (Froy Gutierrez), um jovem casal que, durante uma viagem para o noroeste do Pacífico, se veem forçados a passar a noite em um Airbnb isolado devido a uma falha mecânica no carro. Este cenário, que deveria ser um prelúdio para uma noite de terror psicológico, se desenrola de forma previsível quando três estranhos mascarados invadem sua paz. O que poderia ter sido uma atualização moderna e assustadora do clássico de Bryan Bertino, se torna um exercício desajeitado em repetição e falta de originalidade.

A escolha dos protagonistas não contribui para o resgate do suspense. Petsch e Gutierrez, apesar de seus esforços, não conseguem criar a mesma tensão palpável que Liv Tyler e Scott Speedman ofereceram no filme de 2008. A dinâmica entre o casal parece artificial, com diálogos fracos e pouco convincentes, como o inapropriado pedido de casamento no clímax do terror, que só serve para desconectar ainda mais o público do sentimento de perigo iminente.

Harlin, conhecido por filmes de ação como Duro de Matar 2, falha em traduzir sua experiência para o gênero do horror. As cenas que deveriam evocar medo são mal executadas, com jump scares previsíveis e uma edição que mais confunde do que assusta. O roteiro falha ao tentar criar tensão nos aparecimentos dos invasores, parecendo não saber como trabalhar eles. Seriam humanos? Fantasmas? Super-humanos? Uma confusão gritante a cada nova aparição que confunde – não de uma boa forma – a cada instante. A falta de clareza nas sequências de perseguição é um exemplo explicito de como o filme se perde em sua própria construção, nunca conseguindo estabelecer uma geografia clara que permita ao público se situar e, portanto, se sentir ameaçado.

Narrativamente, Os Estranhos: Capítulo 1 não oferece nada de novo. A promessa de explorar as origens dos estranhos mascarados é rapidamente abandonada, resultando em uma repetição do enredo do original. O filme de Bertino destacava-se por sua simplicidade e impacto, especialmente no final devastador onde os assassinos revelam não ter motivo algum para suas ações, um golpe no público que questionava a natureza aleatória do mal. Harlin, por outro lado, se apoia em um sadismo niilista que falta profundidade e propósito, transformando o horror psicológico em mera violência gratuita.

A comparação com o original de 2008 não é apenas inevitável, mas necessária para entender as falhas fundamentais deste remake. Bertino manipulava a ausência de informações para intensificar o medo, enquanto Harlin insiste em explicar visualmente cada movimento em diálogos expositivos, subestimando a inteligência do espectador e diluindo a atmosfera de terror. Além da narrativa fraca, a execução técnica deixa muito a desejar. A edição desajeitada torna difícil seguir a ação, enquanto a trilha sonora parece uma reciclagem barata dos piores tropos do gênero.

A trilogia planejada pode ter tido a intenção de expandir o universo dos estranhos, mas este primeiro capítulo não consegue justificar a necessidade de sua existência. Em vez de inovar ou adicionar camadas à mitologia dos assassinos mascarados, Harlin entrega um produto que parece mais uma obrigação contratual do que uma obra apaixonada. O cliffhanger final, ao invés de instigar curiosidade, só reforça a sensação de que estamos sendo preparados para mais do mesmo, sem promessas de redenção ou criatividade.

Em última análise, Os Estranhos: Capítulo 1 é um lembrete amargo de como remakes e reboots podem falhar miseravelmente quando não há uma visão clara ou um respeito genuíno pelo material original. Harlin tinha em mãos a oportunidade de reimaginar um clássico do horror para uma nova geração, mas optou por seguir um caminho fácil e seguro, resultando em um filme que é tanto irrelevante quanto esquecível. Se a intenção era reviver o terror que Bryan Bertino tão habilmente criou, Os Estranhos: Capítulo 1 não é apenas uma falha, mas um insulto à memória de um filme que ainda ressoa com o público por sua habilidade de assustar e perturbar.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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