Crítica | Comer, Rezar, Amar (Eat Pray Love)

Nota
3

Elizabeth (Julia Roberts) é o tipo de mulher que tem tudo na vida: tem uma casa bonita, um marido amoroso, uma carreira bem-sucedida, mas ela não tem mais o importante: o amor próprio. Após uma viagem para o Camboja, ela começa a se perguntar se as previsões que lhe foram feitas irá acontecer: se o casamento dela vai ser mal sucedido, se ela vai perder dinheiro ou não, e ao voltar para casa ela se depara com um dilema: se ela continuar com seu marido, o próximo passo é ter um filho, e como sua amiga Delia (Viola Davis) a alerta: “Ter filhos é como fazer uma tatuagem na testa, você tem que querer muito!”. Em meio a tanta ansiedade ela decide mudar sua vida, se separar do seu marido e partir para uma aventura em outro país, assim ela segue para começar a sua aventura na Itália. Essa premissa de Comer, Rezar, Amar, do diretor Ryan Murphy, que conquistou muitas pessoas em 2010 com essa obra no mínimo peculiar. 

Consagrado por séries populares como Glee (2009), American Horror Story (2011) e Pose (2018), o diretor Ryan Murphy teve como seu segundo longa metragem o filme Comer, Rezar, Amar, que já era um best seller bem popular desde seu lançamento em 2006 pela autora Elizabeth Gilbert. O longa tem presente bastante da identidade de Murphy, que é reconhecível até hoje nos seus trabalhos, especialmente por ter sido lançado perto de uma de suas séries de maior sucesso, Glee, é perceptível que o estilo de filmagem é muito parecido, com cenas, cortes e closes nos personagens que parecem ter sido tiradas da série adolescente e colocadas num cenário mais maduro. E as semelhanças dos projetos se mantém pela personagem principal ter um humor muito parecido com a da personagem principal de Glee, Rachel Berry (Lea Michele), sendo mais perceptível principalmente no começo do filme. Mas, apesar de se intitular como uma comédia romântica, o filme se distancia bastante disso logo após o seu 1º de 3 atos, tendo um foco mais intimista e mais sério ao chegar em sua conclusão.

Comer, Rezar, Amar é de fato um filme bastante popular, mas que aparenta ser levado a sério demais para um romance que se prende a tantos clichês. Além de ter sido lançado em uma época onde o diretor Ryan Murphy promove uma certa diversidade na maioria dos seus trabalhos, a maior parte dos personagens podiam chegar a ser bastante insensíveis para as comunidades que ele queria representar. No longa, na verdade, não chega a um extremo de insensibilidade, mas também perpetua estereótipos. A personagem da Viola Davis, por exemplo, tem o estereótipo da “amiga negra para a protagonista” que serve apenas para aconselhá-la para a sua aventura, mas que não tem nenhuma profundidade e desenvolvimento e realmente só aparece no filme para dizer que existe uma personagem negra. Mas Murphy, que foi muito bem sucedido em trabalhos mais recentes, como por exemplo Pose, que dá um show em como fazer representatividade de personagens de grupos marginalizados, não carrega a culpa sozinho por produzir um filme que está sempre à beira da apropriação cultural. 

Comer, Rezar, Amar é dividido em três atos principais, que dizem respeito a jornada da personagem de auto descoberta: Comer na Itália, onde ela vai para uma viagem gastronômica para tentar se divertir novamente, Rezar na Índia, onde ela tira diversos dias meditando e vivendo em templos e Amar quando ela finalmente decide se abrir para o amor novamente. As passagens da personagem Liz por esses países estão recheadas de uma fetichização cultural, seja pelo endeusamento da cultura italiana, o que já é um clichê clássico de filmes de romance, ou até pela jornada espiritual na Índia que beira a apropriação cultural, com a atriz Julia Roberts usando as indumentárias indianas para se sentir mais pura e elevada. Ainda falando sobre a passagem pela Índia, outro clichê é endossado pelo filme da “Branca Salvadora”, onde uma pessoa branca se dispõe a ajudar um país mais pobre apenas para mostrar a sua própria “bondade”, e tudo isso se confirma com o monólogo final da Liz, onde a mesma diz, em tradução livre: “Quando você se joga nesse mundo afora buscando se ajudar, você acaba ajudando ‘tutti’ (outros em italiano).”.

Comer, Rezar, Amar se tornou um clássico por ser um romance com uma pitada de auto-ajuda, mas que envelheceu bem mal. Não chega a ser um dos piores filmes em termos de representatividade ou de insensibilidade com os temas que tratam, mas que de fato não ajudam bem o espectador a se conectar com a jornada da Elizabeth. Julia Roberts por sua vez, consegue mesclar bem os momentos de humor e de seriedade, embora não seja uma exímia atriz de comédia, ela consegue se adequar bem ao estilo de comédia do diretor Ryan Murphy, que por sua vez se mostra hoje em dia muito mais amadurecido em suas produções em comparação a sua obra de 2010. Apesar de tantos defeitos é um filme que pode divertir bastante por seguir uma premissa tão trivial e previsível no seu roteiro, então acaba sendo um filme leve, e que mesmo se levando um pouco a sério demais, dá para tirar um bom entretenimento se você fizer justamente o oposto: não levar a protagonista tão a sério.

 

Ilustradora, Designer de Moda, Criadora de conteúdo e Drag Queen.

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