Nota
Um Completo Desconhecido, dirigido por James Mangold e indicado a oito categorias no Oscar 2025, é mais uma biografia ficcional, que pouco se destaca entre tantas outras bem mais impactantes como Bohemian Rhapsody (2018) ou I Wanna Dance with Somebody (2022). Contando a história do célebre artista Bob Dylan, que foi de um jovem cantor de folk completamente desconhecido ao ápice da fama na década de 60, a obra musical traz bastante enfoque, para além da carreira em si, as suas relações amorosas. No entanto, Um Completo Desconhecido se torna um filme raso, quando o diretor opta por deixar no ar toda a infância, adolescência e origens de Dylan, que inclusive estão presentes em sua autobiografia Crônicas Vol. 1, para literalmente escancarar como o artista tinha uma personalidade tão “forte” que beirava a arrogância. Além disso, outro fator que enfraquece mais ainda a obra, para além da narrativa, é o fato de ser um musical, mas o protagonista estar desafinado em boa parte das performances.
Um Completo Desconhecido é aquele tipo de obra que preenche boa parte dos requisitos de um indicado ao Oscar. O filme é tecnicamente bem ancorado, com uma ótima direção de atores, para além de uma montagem, figurino e cenografia bastante fiéis e coerentes com o contexto da época de ascensão do Bob Dylan. Entretanto, apesar de o diretor dar check em todos esses elementos, ficou faltando o principal: o sentido da obra. Existe uma falha bastante evidente no desenvolvimento da narrativa, que promete um emblema, um grande clímax, que nunca chega. Existe uma perceptível sensibilidade na atuação do Timoteé Chalamet, que consegue entregar um Bob Dylan bastante fiel à realidade, com todos os trejeitos e o destaque para a sua personalidade bastante forte. No entanto, o mistério que percorre o seu passado (infância e adolescência), que, para afora de não ser mostrado, o próprio protagonista não fala sobre; além de um grande enfoque sobre o seu drama romântico (que de drama na verdade não tem nada), faz a obra desandar do seu real caminho.
Ao entender a jornada de Bob Dylan, fica notório como Um Completo Desconhecido é uma obra superficial em termos de pesquisa. Existe muito conteúdo a ser retratado e produzido a partir da história de vida do artista. Todavia, o longa acaba por cometer o mesmo erro que diversas biografias ficcionais cometem, que é: tratar da vivência do artista de maneira rasa, apenas expositiva e pouco imersiva. A própria transição que o artista realizou do folk para o rock, que gerou tantas controvérsias na carreira do astro, poderia ter sido muito melhor explorada e aprofundada. Dessa maneira, outro fator importantíssimo que influencia tanto na indicação do Timoteé para o Oscar de Melhor Ator, como interfere na qualidade geral do filme, é o insatisfatório desempenho das performances musicais do protagonista. Já que a obra se propõe a ser uma autobiografia ficcional com músicas originais, o básico esperado é que essas produções sonoras tenham grande destaque no filme. Contudo, a cantoria de Um Completo Desconhecido passou tão despercebida, que a obra mesmo indicada a tantas categorias, não recebeu indicação na que deveria ser a sua principal (já que é a base do filme): Melhor Trilha Sonora Original.
Assim, Um Completo Desconhecido deixa a grande dúvida do real intuito da obra: era para ser uma homenagem ao artista ou uma mostra de como seu lado revolucionário na verdade estava encoberto por uma personalidade bastante misteriosa, insensível e arrogante? É muito válido retratar as contradições de um artista. No entanto, apesar da similaridade da atuação do Timoteé com o real Bob Dylan, faltou a captura da essência, que, para além da atuação, está presente: tanto na forma/ponto de vista em que a narrativa é construída, como no nível de profundidade diegética na qual a persona está inserida e sendo desenvolvida. Portanto, faltaram diversos elementos em Um Completo Desconhecido, sendo o principal deles: um destino a se chegar através de todo o caminho percorrido.