Crítica | Parthenope: Os Amores de Nápoles (Parthenope)

Nota
1.5

Nascida no mar de Nápoles em 1950, a jovem Pathernope (Celeste Dalla Porta) sempre esteve acostumada a receber olhares e a atenção de todos que passavam pelo seu caminho. Bela, Pathernope cresceu e foi aprendendo cada vez mais a usar de sua beleza para conseguir o que queria. À medida que o tempo passa, a garota passa seus dias conhecendo sempre novas pessoas, mas não parece querer manter algo mais sério com ninguém, tendo uma vida muito cômoda seduzindo desconhecidos que alimentam ainda mais o seu ego. Apesar de se alimentar com tais futilidades, Pathernope também faz faculdade de antropologia, e acaba chamando atenção de um dos seus professores mais ranzinzas, que apesar de achá-la apenas uma jovem petulante, vai acabar aceitando o seu convite para orientá-la em seu projeto final. Mas, mesmo com tanta calmaria no litoral italiano, uma tragédia vai abalar a vida de sua família, fazendo-a ter um interesse especial por um tópico de pesquisa para conseguir lidar melhor com o luto, mas que é imediatamente recusada por seu novo orientador. Pathernope, que estreia no dia 20 de março nos cinemas brasileiros, é o novo trabalho do diretor italiano Paolo Sorrentino, que traz uma estética já conhecida de outros trabalhos, numa obra que mantém os mesmos padrões de projetos anteriores. 

Paolo Sorrentino, que já recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional por seu filme The Hand of God (2021), surge novamente com seu novo projeto, que traz uma mesma atmosfera que The Hand of God, com jovens italianos explorando suas sexualidades, porém dessa vez tratando de temas ainda mais profundos. O diretor, que também roteiriza o filme, tenta a todo custo elevar o seu texto com uma metalinguística sobre frases prontas: onde ele se utiliza dessas frases prontas para justamente elevar o seu texto, ao mesmo tempo que critica os personagens que a usam para se parecerem mais inteligentes, o que cria em diversos momentos bons jogos de palavras entre os personagens, principalmente entre a Pathernope e seu orientador, Devoto Marotta (Silvio Orlando). Mas o roteiro de Sorrentino é de longe um ponto positivo para o filme, já que mesmo com cenas de impacto de embates interessantes de Pathernope com os homens que surgem em sua vida, o roteiro não sabe exatamente onde quer chegar. O longa passa por diversos temas desde mais simples como a sexualidade e juventude, passando pelo luto, culpa, e até mesmo com algumas críticas sociais aqui e ali, mas cada ato em que os temas são desenvolvidos nem sempre acabam se interligando, fazendo com o que em diversos momentos o filme inteiro se resuma a coletâneas aleatórias de momentos de Pathernope que nem chegam a ter impacto na sua vida, e muito menos tem ligação com o que acontece posteriormente.

Pathernope é um ótimo exemplo para explicar como o “male gaze” pode estragar um filme. Por ser uma personagem sensual em sua essência, Sorrentino parece se perder na sexualidade da jovem, deixando a personagem vazia. A sensualidade é uma característica inerente de Pathernope, mas que ao mesmo tempo se torna o único traço de sua personalidade, já que, sua inserção no curso de Antropologia parece que é mais um recurso de fazê-la recitar frases prontas do que de fato torná-la inteligente, como o filme tenta mostrar-se. Apesar das tomadas claramente sexualizadas, esse acaba se tornando o menor dos problemas para a personagem, visto que nem ela mesma sabe porque ela cria esse instinto de seduzir a todo o momento, apesar da mesma afirmar em um momento do filme que sabe como usufruir da sua beleza, como uma referência que a mesma usa da sua beleza para chegar onde quer. O filme poderia de fato ser interessantíssimo se usasse dessa sensualidade exacerbada de Pathernope de forma inteligente, tornado-a uma personagem inteligente, ambiciosa e estrategista, que utiliza da sua beleza como uma forma de manipular as pessoas ao seu redor para conseguir o que ela quer, mas no fim a própria sensualidade da personagem não tem um motivo em específico para acontecer além da sexualização da mesma.

Ainda assim, Pathernope é um filme estonteante, provando pelo menos a incrível capacidade de Sorrentino de dirigir um longa. A cinematografia, que é assinada por Daria D’Antonio, que também foi responsável pela fotografia de The Hand of God, se mantém num nível elevadíssimo depois de três anos da parceria desses dois. Tendo o cenário de Nápoles como plano de fundo, a arquitetura italiana e as paisagens belíssimas do litoral de Nápoles são um belo plano de fundo para as cenas que tornam o longa mais fácil de ser assistido. A parceria de Sorrentino e D’Antonio funciona tão bem, que as composições de cena também são muito bem pensadas, mostrando uma maior preocupação desde o último filme juntos, onde conseguem criar momentos coreografados, mas que não parecem forçados, criando uma ótima linha tênue entre o perfeccionismo estético de cena e uma naturalidade entre os atores, focando muito na simetria entre os takes, que também eleva bastante os momentos contemplativos do longa.

O cuidado estético, muito mais refinado, do diretor se mostra também em duas questões principais: A paleta de cores e o figurino. O uso da paleta de cores no filme é bastante inteligente, se aproveitando das belezas naturais para ilustrar os momentos mais leves, mas usando de forma brilhante a luz como indicativo de emoção, seja alegria, tristeza, desconfiança ou ternura. Mas quem de fato surpreende é o figurino, que tem um ótimo destaque durante a época de 60, com uma das cenas de abertura tendo um foco nas roupas das personagens, ilustrando brilhantemente o espírito do tempo. Mas o figurino também tem um papel importante para contar a história de personagens que aparecem a partir da segunda metade do filme, onde cada um consegue ter seu momento, ilustrado pelos seus figurinos.

Pathernope traz cenários encantadores da Itália que ilustram esse romance sobre uma jovem decidida, mas tudo isso embalado pelo olhar machista do diretor Paolo Sorrentino. A fotografia estonteante não é novidade para Sorrentino, que já em outras produções costuma explorar bem os cenários e posicionamentos de câmera, fazendo um trabalho impecável na composição de suas cenas, assim como na direção, criando mais um belo projeto de se assistir. A beleza estética do filme é notado principalmente pelo bom uso de três elementos: fotografia, paleta de cores e figurino, onde os dois últimos são os principais responsáveis para criar momentos de conexão com os personagens que na maioria das vezes se mostram como desconexos com a trama em si, onde mesmo quando faz sentido eles criarem uma conexão com a Pathernope, ao mesmo tempo eles parecem não afetar a sua trajetória de forma alguma.

Apesar de lindo, o filme se mostra com inúmeros defeitos, especialmente com relação ao seu roteiro. Mesmo com os esforços na atuação de Celeste Dalla Porta, que faz a Pathernope de uma forma excelente, e dos esforços do diretor em conduzir bem suas cenas e atores, o roteiro não eleva o filme. A visão sexualizada que o roteiro cria sobre a Pathernope impede o filme de criar uma personalidade interessante para a personagem que chega a princípio com uma premissa super interessante de uma personagem que usa sua sensualidade de forma inteligente e ambiciosa para conseguir o que quer, e o longa de fato acredita que segue essa premissa, mas o resultado acaba se tornando vazio, sem alma e sem personalidade alguma.

 

Ilustradora, Designer de Moda, Criadora de conteúdo e Drag Queen.

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