Review | Dear White People [Season 1]

Nota
4

O que esperar de uma série que fala abertamente sobre racismo? Discutindo isso de forma didática, muito importante salientar. O que esperar de uma série que acaba com o mito de que racismo não existe e do racismo reverso? O que esperar de uma série que tem alguns episódios dirigidos por Tina Mabry, diretora de Mississippi Damned, ou Barry Jenkins, diretor de Moonlight? Sem dúvidas, podemos esperar um trabalho excelente. Não só isso, mas didático e informativo também.

Em Dear White People, série baseada no filme lançado em 2014, vamos acompanhar um grupo de estudantes negros de uma universidade do EUA, onde a maioria dos alunos são brancos. Na série conheceremos, Samantha White (Logan Browning), Lionel Higgins (DeRon Horton), Coco Conners (Antoinette Robertson), Joelle Brooks (Ashley Blaine Featherson) Troy Fairbanks (Brandon P Bell) e Reggie Green (Marque Richardson) que precisam lidar com o racismo institucional presente na universidade. Essa discussão no campus toma grandes proporções quando alguns alunos brancos fazem uma festa de halloween com o tema Blackface, onde eles usam referências às pessoas negras para se fantasiar.

Com um texto ágil e e crítico e um humor ácido (com direito a alguns shades), Justin Simien não teve medo de expor nada. Vale lembrar que ele também foi diretor do longa a qual a série foi baseada. É impossível não se sentir preso a cena desde os primeiros momentos e não se questionar acerca do que está sendo visto ou dito ali. Aqui, o Simien teve muito mais tempo para aprofundar as questões raciais do que no filme em 2014. Note que falo apenas das questões raciais, pois em outros assuntos abordados houve um pequeno deslize (um dos erros da série. Acredite, ela não é perfeita). Alguns episódios foram dirigidos por diretores que já trouxeram essa temática para as telas, como, por exemplo, Barry Jenkins (conseguiu o Oscar com Moonlight) e Tina Mabry. Ou seja, propriedade para falar sobre o assuntos, eles têm. E isso é inavegável.

Outro acerto é que cada episódio é focado em determinado personagem. É claro que isso pode se repetir durante a temporada, não se assuste. Assim, garante que vejamos as mesmas situações através de pontos de vistas diferentes. Além disso, cada personagem consegue discutir um assunto específico dentro do assunto-base, que nesse caso é o racismo, como por exemplo, a Coco que traz o colorismo e a solidão da mulher negra ou a Samantha que traz questões sobre o relacionamento inter-racial. Mesmo tendo várias abordagens diferentes, todos os personagens acabam sendo interessantes em cena e, acreditem, os 20 minutos de duração dos episódios acabam se tornando 5 pela agilidade do roteiro. O que é impossível não comentar é: cadê o episódio focado na Joelle, a melhor amiga da Samantha? (Quem sentiu falta desse episódio?).

Claro que tantos acertos não impedem que haja alguns erros… A trama tropeça no quesito sexualidade. É importante salientar que isso não tira a importância das questões levantadas na série. O tropeço começa com a descoberta do Lionel, interpretado pelo DeRon Horton, um gay negro que se apaixona pelo amigo hétero, mostrando um esteriótipo que leva muita vezes às atitudes preconceituosas vindas de pessoas heterossexuais, que acabam achando que é um “padrão” que há no público LGBTQI+ e acham que podem ser atacados por qualquer um que faça parte desse público. E não para por aqui, ainda levantam a bissexualidade como uma forma de traição, quando deveriam tratar como algo normal.

Aqui, a professora tem um caso com um dos protagonistas que mostra que ela “não é lésbica quando esta na cama com ele”. Vale lembrar que, quando se propõe discutir sobre tais temáticas, é importante ter um cuidado na maneira de como vai abordá-lo, principalmente para não mostrar que isso é uma forma de “pegar geral” ou “indecisão”, já que não é um assunto muito discutido. Sabemos que Dear White People fala sobre questões raciais e não sexualidade, mas raça nos faz lembrar de grupos sociais, que acaba nos levando às características de determinados grupos. Assim como negros, há o LGBTQs, feministas, entre outros. Ou seja, é importante um certo cuidado quando começa a afunilar determinado assunto.

Em suma, essa produção original Netflix é uma boa forma de discutir assuntos que têm estado em alta nos últimos tempos ou levar questões que ainda são invisibilizadas. E o melhor é que isso é tratado de uma forma clara, sem complexidade. O importante é abrir os olhos e ouvidos para o que está em cena e observar o quanto isso é real. Se você não faz parte do público branco, é uma forma de se sentir representado, de dar voz a quem normalmente não tem tanta (ou nenhuma) voz.

Se você não faz parte do público negro, essa é uma boa forma de entendê-los e parar de achar que racismo não existe (talvez você só não pratique ou pratique e não perceba), pois, sim, ele existe e está presentes (muitas vezes) em situações tão sutis e, para muitos, quase imperceptíveis (seja numa compra, numa festa ou na própria universidade). O que não dá é achar que a série faz apologia a violência contra brancos ou racismo reverso, como muitos afirmaram. Depois de assisti-la, você perceberá que esses “achismos” não fazem sentido nenhum.

 

https://www.youtube.com/watch?v=ac6X4EYIH9Y

Universitário, revisor. E fotógrafo nas horas vagas.

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