Nota
Poucas temáticas do cinema já tem uma fórmula tão bem estabelecida como o “filme de boxe”. Touro Indomável, a franquia Rocky e Menina de Ouro sozinhos, cada um de seu jeito, formataram a estrutura narrativa e estilística pela qual a temática deve se guiar e dificultaram todos os concorrentes subsequentes de trazer alguma novidade. É um desafio no mínimo complicado reinventar o cinema de boxe, portanto, e até mesmo repaginá-lo; a saída mais inteligente encontrada pelo brasileiro 10 Segundos para Vencer, então, foi referenciar e, porque não, reverenciar.
O longa é uma cinebiografia de Éder Jofre (Daniel de Oliveira), o primeiro brasileiro a receber o cinturão de campeão mundial de boxe, em 1961, nos Estados Unidos. De maneira mais específica, o filme conta a trajetória do lutador da infância até a sua vida conjugal, mas com o foco principal na relação com seu pai e treinador Kid Jofre (Osmar Prado).
Não há muito o que inventar, de fato, nas cenas de luta – que não são poucas – e o diretor José Alvarenga Júnior trabalha de maneira criativa o crescendo da intensidade e do envolvimento de Éder com o boxe, colocando a câmera cada vez mais dentro do ringue e quase deixando o público participar dos golpes. E, ainda que seu trabalho com texto possa ser recorrentemente exagerado, a direção de atores é precisa em termos de tom. Daniel de Oliveira, usualmente muito bem (embora nada pareça com o real Éder Jofre), transmite simultaneamente a determinação e a dúvida em relação ao destino que traçou.
Osmar Prado, no entanto, rouba o protagonismo e, com sua energia característica e olhar penetrante, torna o seu Kid Jofre severo e intimidador, mas também amável para com o filho. Há também a importante participação de Ricardo Gelli, fundamental para o espectador entender a relação dos personagens centrais de pressão e frustração.
Nesse gênero, é comum buscar o tratamento mítico e também tentar subvertê-lo quebrando caricaturas, e Alvarenga não hesita em fazer as duas coisas: ele consegue criar os momentos inspiradores e catárticos no mesmo fôlego que os desconstrói logo na cena seguinte (a pressão de Kid sobre Éder em relação à dieta e treinamento não diminui com suas vitórias, só aumenta). O uso da trilha sonora é eficiente ao provocar, em duas notas, o sentimento de dor e alegria que representa significativamente a essência da vida do personagem e desse esporte, e é particularmente bem utilizada (ainda que não inovadora) a inserção de cenas reais no meio dos acontecimentos do filme, misturando imagens documentais e ficção na mesma tonalidade de preto e branco.
Se por um lado não foge da estrutura convencional de roteiro biográfico sobre um esportista e nunca consiga aprofundar a personalidade de seu protagonista como poderia, 10 Segundos para Vencer encontra sua força motriz na interação da dupla central de atores e no engajamento do público com a eminência de glória e derrota numa curta porcentagem de tempo. Deixando claro que não há vitória sem sacrifício, o filme dialoga sobre a compensação que é passar por esse auge com a sensação de missão cumprida, para quem luta com ímpeto e paixão como Éder, é claro.