Crítica | A Cor Púrpura (The Color Purple) [2023]

Nota
3.5

Para muitos de nós, nossas relações familiares representam uma parte importantíssima das nossas vidas, por isso é quase impossível nos ver sem nossos parentes mais importantes. Imagine ser separada de sua irmã querida, que era sua única companheira em um lar abusivo, e passar mais de 30 anos sem uma notícia sequer sobre ela. É isso que Celie (Fantasia Barrino/Phylicia Pearl Mpasi) passou em A Cor Púrpura após sua irmã, Nettie (Ciara/Halle Bailey), ser expulsa de casa por seu marido abusivo Mister (Colman Domingo).

A versão 2023 de A Cor Púrpura foi dirigida por Blitz Bazawule, famoso por Black is King, e é uma adaptação direta do musical produzido em 2005 por Oprah Winfrey, que por sua vez é uma adaptação direta do filme de 1985, dirigido por Steven Spielberg. Mudando pouquíssimas coisas do filme original e apenas adicionando vários números musicais ao longa, a nova adaptação consegue trazer uma nova roupagem ao drama que já era bem atual na sua época. As músicas e as coreografias do filme conversam bastante com as cenas, sendo muito bem pensadas e sem  tirar o peso dramático que o filme exige em muitas delas, e isso mostra o trabalho minucioso da direção em fazer essa mistura entre teatro e cinema de uma forma coerente.

Para quem conhece a obra original pelo livro da Alice Walker de mesmo nome, sabe que as personagens Celie e Shug, no filme interpretada pela Tariji P. Henson, tem um envolvimento amoroso em dado momento e acabam tendo uma noite juntas, despertando o lado sexual da Celie após uma conversa muito importante para a trama. O que não acontece nem na adaptação de 1985 e muito menos na adaptação de 2023, o que acaba sendo uma surpresa, já que em algumas entrevistas o próprio Spielberg fala sobre se arrepender de não ter colocado o romance das duas de forma mais explícita no seu filme, e pelo o mesmo ser um dos produtores da nova versão, junto com a Oprah Winfrey, dava a impressão que o romance das duas seria melhor abordado no novo longa, o que não aconteceu.

Apesar da decepção com relação ao tratamento de Celie e Shug, enquanto na versão de 1985 de A Cor Púrpura quem brilhava era Whoopi Goldberg e Margaret Avery, na nova adaptação, embora todas tenham um destaque imenso com os números musicais, principalmente a Halle Bailey, quem rouba a cena sem dúvidas é Danielle Brooks no papel de Sofia. Famosa por seu papel em Orange is the New Black, da Netflix, Danielle Brooks foi a escolha perfeita para o papel, até porque a mesma também fez Sofia na adaptação da Broadway de 2005. Mas além da sua atuação ser impecável, seus vocais acompanham no mesmo nível da sua atuação. Embora ela não tenha quase nenhuma chance de levar a estatueta do Oscar como atriz coadjuvante, visto que a favorita é Da’Vine Joy Randolph de Os Rejeitados, sua atuação tem mais destaque pela importância da sua personagem para a trama e pelo desenvolvimento dela, que continua excelente desde 1985, mas apesar de Da’Vine ter tido uma grande performance no filme, sua personagem ainda tem um desenvolvimento muito pobre comparado ao da Danielle.

Apesar disso, as atrizes que fazem Celie também têm performances muito diferentes e, ao mesmo tempo, muito boas, cada uma de seu jeito. É impossível não comparar o trabalho das duas com o de Whoopi, e com isso Phylicia Pearl Mpasi, que faz a jovem Celie, consegue transmitir Whoopi até com as expressões faciais. Já a Celie de Fantasia Barrino consegue ser muito distinta da sua antecessora de 1985, por trazer uma Celie com mais personalidade, o que não faz com que a Celie de Whoopi fosse ruim, muito pelo contrário, a primeira performance consegue transmitir melhor a complexidade da personagem que foi moldada por todos ao redor dela sem conseguir se expressar, enquanto a Celie de Fantasia passa mais um olhar de medo na sua atuação do que o olhar submisso da primeira Celie.

A nova adaptação de A Cor Púrpura traz uma nova roupagem ao clássico de Steven Spielberg de 1985 com números musicais, mas ainda se mantém muito fiel ao filme original, o que em alguns pontos é um problema. Apesar de se manter muito conservador ao retratar suas personagens, o filme consegue levar a Broadway às telonas, não só pelas performances musicais muito bem executadas, como também cenários e figurinos que remetem à velha Hollywood da MGM. Cumprindo a promessa em emocionar do começo ao fim, a jornada das irmãs Celie e Nettie traz uma experiência incrível para as salas de cinema.

 

Ilustradora, Designer de Moda, Criadora de conteúdo e Drag Queen.

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