Crítica | A Forca (The Gallows)

Nota
3

Em um ambiente onde o passado nunca está realmente enterrado, as memórias de tragédias esquecidas têm o estranho hábito de retornar para assombrar aqueles que ousam desenterrá-las. Em meio aos corredores de uma escola comum, onde o drama juvenil e as pressões cotidianas geralmente são os protagonistas, uma presença sinistra desperta. A história se desenrola, entrelaçando ambição e medo, enquanto jovens inconsequentes brincam com forças que não compreendem, questionando até que ponto somos responsáveis pelos erros do passado. Quando o palco é armado, a tensão se intensifica, e o destino, cruel e implacável, aguarda sua próxima vítima.

A Forca tenta reviver o horror no estilo de found footage, um subgênero popularizado por sucessos como A Bruxa de Blair e a franquia Atividade Paranormal. O filme, que se passa inteiramente dentro de uma escola, onde um grupo de estudantes decide reencenar uma peça teatral que terminou em tragédia duas décadas antes, aposta no formato de filmagem “caseira” para aumentar o realismo e a imersão. No entanto, apesar de uma premissa promissora e momentos de genuína tensão, o filme falha em se destacar dentro de um gênero saturado por produções similares.

A jogada de marketing do longa na época de seu lançamento se destacou ao insinuar que o filme tinha base em “fatos reais”, uma tática comum no gênero de terror para aumentar a sensação de medo. Os produtores utilizaram o mistério ao redor de uma suposta maldição ligada à peça de teatro encenada no filme, levando o público a acreditar que a história tinha raízes em eventos verídicos. Esse aspecto foi amplamente promovido nas redes sociais e em materiais de divulgação, fazendo com que o filme ganhasse uma aura de autenticidade, o que atraiu ainda mais os fãs de horror interessados em histórias sobrenaturais aparentemente baseadas na realidade.

O ponto forte do filme reside na ambientação. As cenas noturnas na escola, com seus corredores longos e vazios, proporcionam uma atmosfera opressiva e claustrofóbica, que se intensifica à medida que os protagonistas percebem que não estão sozinhos. A trilha sonora é sutil, quase inexistente em alguns momentos, permitindo que sons ambientes — como o rangido de uma porta ou o eco de passos distantes — criem uma sensação constante de ameaça iminente.

Os personagens, embora baseados em estereótipos típicos de filmes de terror adolescente, são funcionais dentro da narrativa. Reese Mishler, interpretando o protagonista homônimo, traz um equilíbrio interessante entre arrogância e vulnerabilidade, especialmente quando confrontado com os eventos sobrenaturais. No entanto, é difícil criar uma conexão emocional mais profunda com os personagens, já que o roteiro limita suas complexidades a diálogos rasos e comportamentos previsíveis.

A maior crítica ao longa é a sua previsibilidade. Embora o formato de filmagem seja utilizado para tentar criar uma imersão mais intensa, ele também limita a variedade de ângulos e perspectivas, o que torna muitas cenas repetitivas. Além disso, os sustos, embora eficazes em alguns momentos, muitas vezes se baseiam em clichês do gênero — portas que se fecham sozinhas, sombras que aparecem rapidamente e personagens que desaparecem misteriosamente no meio da ação. Isso acaba diminuindo o impacto do horror ao longo do filme.

Ainda assim, o filme levanta uma questão interessante sobre a culpa e as consequências de ações passadas. A peça trágica que serve como o coração da história carrega consigo o peso da morte, e os personagens, ao escolherem reviver essa memória sombria, se colocam em uma posição vulnerável. Existe uma espécie de moralidade implícita na narrativa, onde brincar com o desconhecido ou mexer com o passado de forma desrespeitosa pode ter consequências mortais. Esse tema é refletido no próprio antagonista, cuja motivação está enraizada em uma tragédia injusta.

Outro aspecto positivo é a economia de recursos que o filme apresenta. Trabalhando com um orçamento modesto, os diretores Chris Lofing e Travis Cluff conseguem criar tensão com poucos elementos, focando mais no som e na sugestão visual do que em efeitos especiais elaborados. Isso ajuda a manter o espectador envolvido, mesmo quando a narrativa começa a tropeçar em sua própria simplicidade.

O clímax do filme, no entanto, não corresponde às expectativas construídas ao longo da trama. Embora o suspense se acumule de forma eficaz, a resolução final parece apressada e um tanto anti-climática. O espectador é deixado com uma sensação de que algo ficou faltando — uma conclusão mais impactante, talvez, ou um desenvolvimento mais profundo do mistério central.

Em resumo, A Forca é um filme de terror que consegue criar momentos de tensão genuína, mas que se perde em sua própria fórmula. O uso do formato de “found footage” é tanto um ponto forte quanto uma limitação, e o filme acaba não inovando dentro de um gênero já saturado. Para fãs de terror que buscam uma experiência rápida e despretensiosa, o filme oferece sustos eficientes. No entanto, para aqueles que esperam por algo mais original ou narrativamente complexo pode deixar a desejar. Ainda assim, seu questionamento sobre os efeitos do passado e a moralidade de reviver tragédias oferece uma reflexão interessante no meio de tanto caos sobrenatural.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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