Crítica | Alien, O Oitavo Passageiro (Alien)

Nota
5

Alien, O Oitavo Passageiro não é apenas um marco do cinema de ficção científica, mas uma obra que revolucionou a maneira como o terror é percebido no ambiente espacial. Ridley Scott, o diretor visionário por trás do filme, consegue capturar o medo primordial do desconhecido, criando uma atmosfera sufocante que, mesmo após mais de quatro décadas, ainda assombra e cativa o público. Desde a primeira cena, somos envolvidos em uma sensação de isolamento e perigo iminente, onde o espaço, com toda a sua vastidão, se torna um lugar claustrofóbico e aterrorizante.

A narrativa é construída de forma meticulosa, partindo de uma premissa relativamente simples: a tripulação da nave Nostromo intercepta um sinal de socorro vindo de um planeta desconhecido. Ao investigar, eles inadvertidamente libertam uma forma de vida alienígena mortal. O que poderia ter sido apenas mais uma história de monstros no espaço se transforma, nas mãos de Scott, em uma meditação sobre o medo, a sobrevivência e a natureza da humanidade diante do inumano.

Um dos aspectos mais impactantes de Alien é a maneira como o filme explora a tensão através do silêncio e da espera. A Nostromo é apresentada como uma nave industrial, funcional, mas não projetada para o conforto de seus tripulantes. Cada corredor escuro e apertado, cada ruído mecânico de fundo, contribui para a sensação de que algo está à espreita, sempre fora do alcance, mas sempre presente. Scott usa magistralmente a ausência de som para intensificar o suspense, criando um contraste perturbador quando o silêncio é rompido pelos gritos dos personagens ou pelo som alienígena da criatura que os persegue. Em vez de recorrer a sustos fáceis, o filme constrói seu terror de maneira lenta e deliberada, dando ao público tempo para sentir a crescente tensão antes de liberar o horror completo.

Sigourney Weaver, em sua interpretação de Ellen Ripley, oferece uma performance que desafia as convenções da época, tanto em termos de gênero quanto de narrativa. Ripley não é a típica heroína, ela é inicialmente uma figura de segundo plano, uma oficial que, devido à negligência e arrogância de seus superiores, acaba assumindo o papel de líder. Sua evolução ao longo do filme, de uma oficial cautelosa a uma sobrevivente determinada e implacável, é uma das transformações mais marcantes do cinema. Ripley é inteligente, pragmática e, acima de tudo, resiliente, e sua capacidade de sobreviver ao horror que a rodeia a transformou em um ícone cultural e em um símbolo de empoderamento feminino.

O design da Nostromo e dos ambientes alienígenas reflete uma visão futurista que é, ao mesmo tempo, suja e realista. O filme evita a estética brilhante e limpa de muitos filmes de ficção científica da época, optando por uma aparência mais gasta e utilitária. Essa escolha estética contribui para a sensação de realismo, fazendo com que o espectador sinta que a nave é um lugar onde as pessoas realmente vivem e trabalham, e não apenas um cenário de filme. Essa abordagem também aumenta a sensação de perigo, pois a Nostromo não parece ser um lugar seguro ou preparado para lidar com a ameaça que surge a bordo. A criatura alienígena, projetada pelo artista suíço H.R. Giger, não é apenas um ser extraterrestre, é uma manifestação física do horror inconsciente, combinando elementos orgânicos e mecânicos de uma maneira que parece tanto biológica quanto monstruosamente artificial.

Jerry Goldsmith contribui de maneira significativa para a atmosfera do filme com sua trilha sonora, que mistura elementos tradicionais e eletrônicos para criar um som que é ao mesmo tempo estranho e familiar. A música de Goldsmith não busca dominar as cenas, mas sim complementá-las, surgindo nos momentos certos para amplificar o medo e a tensão. Em muitas partes, a trilha sonora é quase imperceptível, permitindo que o som ambiente e o silêncio sejam os verdadeiros protagonistas. Essa abordagem musical reforça a sensação de isolamento e o perigo iminente, tornando cada som, cada nota, uma parte integral da experiência de terror.

O impacto cultural do longa transcende o próprio filme. Ele influenciou gerações de cineastas, escritores e artistas, estabelecendo novos padrões para o gênero de horror e ficção científica. O conceito de um terror biológico, de uma criatura que não é apenas uma ameaça física, mas também uma representação do desconhecido, tem ressonado em inúmeras obras desde então. A ideia de que o espaço, ao invés de ser uma fronteira para a exploração e a descoberta, pode ser um lugar de terror inominável, é uma inversão brilhante das convenções da ficção científica tradicional. Além disso, o filme lançou uma franquia que continua a evoluir e a desafiar as expectativas do público, embora nem todas as sequências tenham conseguido capturar a essência aterrorizante do original.

O legado de Alien também pode ser visto em sua abordagem inovadora para a representação de personagens femininas em filmes de terror e ficção científica. Antes de Ripley, as mulheres em filmes desse gênero eram frequentemente relegadas a papéis de vítimas ou de interesse romântico. Com Ripley, Scott e Weaver criaram uma personagem que é forte, independente e central para a trama, sem ser definida por sua relação com os homens ao seu redor. Isso abriu caminho para uma nova era de personagens femininas no cinema, que não só podem sobreviver a situações de perigo extremo, mas também podem ser as protagonistas de suas próprias histórias.

Em suma, Alien, o Oitavo Passageiro é mais do que um simples filme de terror espacial. É uma obra-prima que combina suspense psicológico, design visual inovador e uma narrativa cativante para criar uma experiência cinematográfica que permanece inigualável. É um lembrete de que, mesmo no espaço infinito, o medo do desconhecido ainda é capaz de nos prender, e que o verdadeiro horror muitas vezes reside não no que podemos ver, mas no que imaginamos estar à espreita nas sombras.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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