Crítica | Amor, Sublime Amor (West Side Story) [2021]

Nota
4.5

Remakes são arriscados, principalmente quando se trata de uma obra clássica. Afinal, há toda a preocupação de que uma refilmagem não esteja à altura da original, permitindo que as comparações sejam inevitáveis. Isso não significa que uma releitura tenha de ser obrigatoriamente superior, mas que consiga resgatar a essência do original. E isso, ultimamente, tem sido difícil não só nas telas do cinema, como na televisão. Porém, há exceções. E vamos falar de uma.

Em um dado momento, dois jovens trocam olhares, em meio a uma dança que se mescla com um confronto silencioso entre dois rapazes, num baile que encabeça o início de “Amor, Sublime Amor”, remake do clássico de 60 anos atrás. Ali, entre cores vibrantes e expressões que resgatam o final da década de 50, é perceptível a ideia do musical: percorrer por situações ditas “comuns” para que a história seja contada e vivida. Se essa já era a ideia de Robert Wise no original, nas mãos de Spielberg não foi diferente.

É interessante como o filme busca não só os amantes de musicais, mas também pessoas que não são muito ligadas ao gênero. Afinal, há a preocupação de desenvolver os personagens, principalmente a relação de Tony e Maria e os conflitos urbanos entre norte-americanos e porto-riquenhos. A premissa é muito bem articulada entre os números e não fica algo “forçado”, tampouco fora do contexto. Porém, em um dado instante, a construção do casal principal derrapa um pouco pela falta de um empenho maior de Ansel Elgort, que pouco sabe expressar as camadas de seu Tony. O romance, tal qual no original, continua com uma construção incômoda, mesmo que Rachel Zegler saiba brilhar com a sua Maria. Por causa disso, os coadjuvantes roubam a cena. E merecidamente.

Se os secundários brilham, nada mais justo falar primeiro sobre o alicerce desse brilho. A própria figura de Anita (Ariana DeBose, uma grata e gigante surpresa em cena que honra o legado de Rita Moreno no papel), a amiga de Maria, não é jogada de escanteio e tem seu devido destaque. Repare que a extravagância da personagem é o palco de tudo, rendendo gloriosos momentos – como esquecer os esfuziantes números da jovem? – e críticas muito bem articuladas. Afinal, a figura do latino aqui não é estereotipada, nem demonizada.

Temos a visão egocêntrica dos estadunidenses, assim como temos a dos latinos, que buscam o espaço nesse ambiente desigual – algo que, inclusive, corrige um pouco o retrato de 61. Por essa razão, a figura da Anita se torna ainda mais necessária, cuja voz ativa ecoa de forma avassaladora. Ela luta pelo seu espaço e não abaixa a cabeça e isso por si só já é o bastante para tirá-la dos estereótipos.

Além disso, a câmera de Spielberg é tão espetacular aqui. E sensível. Confortante ver a versatilidade desse grande cineasta. Um bom exemplo disso é o paralelo e a ilusão que ele provoca em certas cenas, tal qual o reflexo da água que parece a vista do céu, num momento sublime que não fica de fora do contexto. O único porém (vale ressaltar), diante de tantas qualidades, é para a escolha de Ansel Elgort, que parece pouco apático em alguns trechos e, de certa forma, prejudica sua interação com Zegler e seu arco na obra.

Fora isso, Amor, Sublime Amor é uma obra extremamente cativante, crítica e, apesar do mesmo nível do original, sabe dosar seus números e corrigir certos equívocos vistos no passado. A facilidade com que Spielberg introduz os personagens (vale destacar também Riff, o líder da gangue interpretado por um ótimo Mike Faist) é natural e nada soa artificial, assim como a simbolização da trilha escolhida. Tem muito sentimento envolvido nas sequências, o que torna a experiência ainda mais rica. Com certeza, um dos melhores filmes de 2021. Um remake que, diferente de alguns, soube superar o original. Um deleite.

 

Apenas um rapaz latino-americano apaixonado por tudo que o mundo da arte - especialmente o cinema - propõe ao seu público.

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