Crítica | Anything’s Possible

Nota
4

Kelsa (Eva Reign) é uma jovem que está muito ansiosa para sua vida fora do ensino médio. Apesar disso, ela tem tudo o que quer no momento: boas notas, duas melhores amigas incríveis, o seu sonho de ser fotógrafa de animais e o seu canal do youtube, que mesmo sem muitas visualizações ela consegue tocar as pessoas com as suas vivências como uma garota trans no ensino médio. Enquanto isso, seu colega do colégio, Khal (Abubakr Ali), tem um enorme crush nela, mas não sabe como chegar nela, ainda mais após ver os vídeos que ela posta sobre suas vivências, ele se sente intimidado por toda a sua confiança. Mas após descobrir que sua melhor amiga, Em (Courtnee Carter), tem um crush nele, Kelsa, que estava começando a se interessar por Khal, decide postar que talvez não esteja pronta ou não precise de um namorado. Sem saber da confusão, Khal decide criar coragem para chamar Kelsa para sair, mas já pensando no drama que isso pode causar. Dirigido por Billy Porter, Anything’s Possible é um leve romance adolescente que está disponível na Prime Video.

Em seu primeiro trabalho como diretor, o ator Billy Porter estreia com um filme adolescente sobre uma garota trans e suas vivências no ensino médio. Para muito além da semelhança de temática, o filme parece se inspirar bastante no filme brasileiro Alice Júnior, que antecedeu a produção da Prime Video sendo lançado em 2019. Ambos os filmes tem uma leveza em tratar das temáticas de transfobia, mas sem perder a seriedade das situações enfrentadas pelas protagonistas e que inclusive compartilham conflitos parecidos no clímax do filme. Apesar disso, Anything’s Possible se mantém relevante com a sua temática em meio a tantas tensões com relação a direitos de pessoas trans nos Estados Unidos, especialmente por cutucar o pânico moral que conservadores estadunidenses perpetuam sobre a comunidade trans. 

 Anything’s Possible também conta com a estreia nas telonas de Eva Reign, e fica bem nítida a sua inexperiência em atuação, mas que acaba sendo também um charme do filme por transmitir o sentimento que a Kelsa sente de querer ser uma adolescente como as outras, de parecer despercebida, e de fato por alguns momentos dá-se a impressão de que estamos acompanhando a vida da Kelsa de uma forma documental devido a forma que a atriz se expressa. Já seu companheiro de cenas, Abubakr Ali, se mostra bem familiarizado com atuação, até por ter algumas séries em seu currículo. Abubakr consegue capturar bem a essência do galã de filmes adolescentes, com expressões dignas da atuação do Noah Centineo, mas que funciona muito bem para a proposta do filme e para atingir bem um público mais adolecesnte.

A química dos dois em cena funciona muito bem, o roteiro consegue mostrar bem a inexperiência em relacionamento dos dois e como tudo isso é muito novo e ambos vão se ajudar a descobrirem sobre a paixão juntos. Mesmo com temas e conflitos que são de fato muito sérios, o desenvolvimento do romance dos dois personagens é muito leve e surpreendentemente rápido, o que é uma coisa muito boa pela falta desse tipo de romance com pessoas trans como protagonistas, além do romance fluir muito bem pelo par da Kelsa, o Khal, não entrar em conflito pela identidade da Kelsa, mas inicialmente muito mais pela sua inexperiência de não saber como chamar uma garota para sair.

Anything’s Possible também é muito bem produzido, tendo uma boa preocupação com os cenários, a fotografia, mesmo não chamando tanta atenção, e, claro, os figurinos, que são parte uma importantíssima desse filme. Kelsa é uma personagem fashionista que usa a moda para se expressar, mesmo tendo o sonho de ser fotógrafa de animais, o seu interesse por roupas é falado e mostrado muito bem no filme. Dá para perceber que as suas roupas tem um misto de uma curadoria de styling para o que está na moda hoje em dia no Tiktok, e algumas peças que são customizadas para as personagens, visto que até os personagens secundários também apresentam um ótimo estilo que representam bem suas personalidades. Outro fator importante do longa é a trilha sonora que é muito bem encaixada nas cenas e que surpreende o filme não ter tido mais momentos musicais além do seu encerramento, com uma música cantada pelo diretor Billy Porter. 

Anything’s Possible é um romance super leve e que trazuma representatividade importante para pessoas trans: Um romance “bobinho” adolescente. Apesar de tanta leveza, o filme aborda também temas com muita seriedade e sem estereótipos dos personagens ou de tramas que perpetuam má representação de personagens trans. Ao invés disso todos os seus personagens são bem construídos e bem pensados, onde cada detalhe de suas roupas, estilo e objetos de cena falam bastante sobre suas personalidades e até sobre seu desenvolvimento no decorrer do filme. Além disso, mesmo não inovando em fotografia ou ambientações, o filme tem uma trilha sonora coerente com os personagens e que ajuda bastante no desenvolvimento do romance de Kelsa e Khal. Anything’s Possible não é um filme complexo ou profundo, mas é sem dúvida um respiro em meio a tantas produções passadas que retratam pessoas trans apenas em seus sofrimentos e sem personalidade além da sua identidade, portanto Kelsa é um bom exemplo de uma representatividade necessária: Uma garota trans com personalidade em um romance adolescente leve.

 

Ilustradora, Designer de Moda, Criadora de conteúdo e Drag Queen.

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