Crítica | As Polacas

Nota
1

Dirigido por João Jardim, As Polacas é um drama nacional que se passa em 1867 e retrata vivências reais de mulheres judias da Polônia que, ao sofrerem pela miséria e antissemitismo na Europa, vinham para o Brasil com promessas de emprego e uma vida melhor, mas na realidade eram forçadas à prostituição. As Polacas traz uma temática e contexto histórico pouco abordado em livros e no audiovisual no geral, mas de extrema importância. No entanto, o olhar do diretor deixa o filme tomar um outro rumo. Essas mulheres são colocadas em segundo plano, enquanto as violências e abusos se tornam os verdadeiros protagonistas. Fetichizando suas dores, o diretor deixa clara sua falta de sensibilidade ao abordar vivências femininas, quando se percebe uma ênfase tão grande em cenas de sofrimento.

De início, a atuação de Valentina Herszage como Rebeca parece meio engessada, até o espectador iniciar a familiarização com a narrativa. Esse aspecto mais “contido” é totalmente proposital para o panorama da obra, que coloca justamente mulheres nesse local de total submissão. Mesmo entendendo todo o contexto de abuso devido ao tráfico sexual em que estão inseridas, ainda assim existia uma organização ali presente de mulheres polacas que ajudavam umas às outras com o intuito de não só resistir como enfrentar essas violências. Contudo, o enfoque dado ao desenvolvimento das relações entre essas mulheres é totalmente superficial, de uma maneira que o público não consegue criar vínculo com praticamente nenhuma personagem.

Dessa maneira, o verdadeiro foco se destina totalmente a relação de poder que os homens exercem sobre as mulheres, principalmente a relação abusiva do Tzvi (Caco Ciocler) com todas elas. As Polacas não hesita em trazer cenas de violência doméstica e estupro longas e sem cortes, enfatizando a noção de fetichização descrita anteriormente. Não é como se as violências advindas do patriarcado e a realidade cruel daquela época (que infelizmente ainda é bastante presente na atualidade) tivesse de ser ignorada. Todavia, existem diversas outras formas de retratar esse panorama sem adentrar em um contexto de sensacionalização dessas dores. As Polacas poderia ter evidenciado muito mais a força dessas mulheres em resistir a toda essa exploração, assim como também ter colocado essas corporeidades em protagonismo, de fato.

Portanto, fica evidente que As Polacas é uma obra claramente transpassada pelo “male gaze”, que espetaculariza um assunto que requer muita sensibilidade. As personagens mulheres são colocadas em segundo plano, o que leva a uma atriz brilhante como a Valentina Herszage ter uma atuação engessada mesmo enquanto protagonista. Diante disso, qualquer mulher que assista esse filme sentirá algum tipo de desconforto ou raiva. Retratar existências femininas em situações de vulnerabilidade exige um olhar sensível e perspicaz, o que João Jardim não teve ao dirigir As Polacas.

Estudante de cinema, pernambucana

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