Crítica | As Vozes (The Voices)

Nota
3.5

Jerry é um cara bacana, ele trabalha no setor de empacotamentos e remessas de uma fabrica de banheiras em Milton e é apaixonado por Fiona, do setor financeiro da empresa. Toda sua vida parecia normal, até que ele acabou matando a garota acidentalmente, mas por sorte ele acabou recebendo a ajuda de Mr. Whisker, seu gato, e de Bosco, seu cachorro, que conversam com ele e o ajudam a se safar desse enorme problema.

Combinando os antagônicos gêneros da comédia com o horror visceral, As Vozes é um filme de 2014 que trata de uma forma extremamente bipolar o drama psicológico, o humor negro e o terror slasher. Jerry é um esquizofrênico assumido, com direito a acompanhamento psiquiátrico e comportamento fora do comum, durante o decorrer do longa vamos vendo a consciência do homem se projetando em seus bichinhos, com Mr. Whisker personificando o diabinho e Bosco sendo o anjinho, nos permitindo ir cada vez mais fundo na mente surreal do protagonista, que é majestosamente interpretado por Ryan Reynolds. O longa é tão bem construído que, aos poucos, vamos vendo o intenso contraste entre as cenas do dia-a-dia de Jerry, que assumem uma fotografia tão bem iluminada que beiram a fantasia, e as cenas de assassinato, que assumem uma clima sombrio, tenebroso que dão ao protagonista um ar sádico, maquiavélico, sanguinário, que se contrastam também com a personalidade inocente que o homem tem.

A produção, que assume uma pegada trash raiz, vai misturando cada um de seus elementos antagônicos, como numa receita culinária, nos brindando com uma surpreende obra prima, que tinha tudo para dar errado e não deu. Jerry vai afundando cada vez mais na sua insanidade a medida que vai se deixando levar pelos conselhos de seu terrível gato e seu doce cão, que vão o transformando num assassino em série, o convencendo a não voltar a tomar seus remédios, ou dos pedidos de Fiona, cuja a cabeça decepada (que ele guardou) surge pedindo companhia e o inspirando a matar mais pessoas para não deixa-la sozinha naquela fria geladeira. O longa vai nos levando cada vez mais fundo na mente e nos problemas de Jerry, mesclando a suavidade da comédia e do romance em algo completamente medonho, que vai tomando um rumo inesperadamente mórbido. É incrível como o elemento da culpa é usado no filme como catalizador, para afundar o homem em seus problemas mentais, e as cores tão vivas são usadas como quebra de clima, dando uma ar tão suave ao longa, que é brutalmente pesado e obscuro.

Lançado no Brasil direto para DVD, o filme dirigido por Marjane Satrapi é chocante de tantas formas que nos seduz rápida e abruptamente, mesmo com seus personagens fracos, que poderiam ter deteriorado a trama se seu protagonista não tivesse uma força roteirística tão grande. O longa usa cores fortes para nos mostrar o mundo criado pela mente problemática do protagonista, nos forçando a entrar em sua fantasia e acreditar na realidade fantasiosa do homem, mas quando surge a realidade, tudo fica eletrizante e arrepiante, o filme muda completamente para algo tenebroso. Nada seria tão espetacular se não fosse por Reynolds, que entrega uma de suas melhores performances e nos leva para o seu lado, nos fazendo ver Jerry como uma vítima de seus problemas e não como um assassino, apesar de ser impossível ter empatia com as personagens coadjuvantes e suas subtramas fracas. O longa ainda ganha uma cereja no bolo com seu desfecho, que acontece por meio de uma cena final inesperada, que se funde aos créditos e resume toda a experiencia esquizofrênica de assistir a essa produção.

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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