Crítica | Better Man – A História de Robbie Williams (Better Man)

Nota
4

No mundo do entretenimento, poucas trajetórias são tão intensas e marcadas por altos e baixos quanto a de Robbie Williams. Desde seu início no Take That até sua bem-sucedida carreira solo, Williams sempre se destacou por sua irreverência, talento inegável e personalidade excêntrica. Sua história já seria suficientemente cativante se fosse contada de maneira tradicional, mas Better Man – A História de Robbie Williams vai além, optando por uma abordagem ousada e repleta de simbolismo para mergulhar no universo do artista. O resultado é uma cinebiografia que se diferencia das demais, desafiando convenções e explorando a psique de seu protagonista de maneira singular.

O filme percorre os altos e baixos da trajetória do icônico cantor britânico, desde sua juventude, passando pela explosão da fama com o grupo Take That e sua conturbada carreira solo. O que poderia ser mais uma jornada convencional ganha novas camadas ao optar por uma abordagem lúdica e quase surrealista, destacando-se entre os retratos biográficos mais tradicionais. Michael Gracey, diretor do longa, já demonstrou seu talento para o espetáculo visual em O Rei do Show, e aqui ele vai além, adotando um estilo que remete ao brilhante Rocketman, de Dexter Fletcher.

O elemento mais intrigante da produção é a escolha de representar Williams como um chimpanzé digital, utilizando tecnologia de captura de movimento. Se em um primeiro momento a decisão soa excêntrica, logo se revela como uma metáfora poderosa. O próprio cantor já se descreveu como um “macaco de circo”, refém das pressões da fama e da necessidade constante de entreter. A representação visual reforça essa sensação de desumanização, criando momentos que transitam entre o tragicômico e o emocionalmente devastador.

Além da ousadia estética, o filme se destaca por sua honestidade brutal. Enquanto outras cinebiografias frequentemente romantizam ou suavizam os aspectos mais sombrios de seus protagonistas, este longa não teme explorar os excessos e inseguranças de Williams. O próprio cantor participou ativamente da produção, garantindo que sua história fosse contada sem filtros. Seu envolvimento confere autenticidade ao relato, que não esconde os vícios, os erros e as crises que marcaram sua vida.

As sequências musicais são um dos pontos altos da obra. Gracey imprime dinamismo e criatividade a cada número, explorando cenários vibrantes e coreografias exuberantes. A cena que recria o videoclipe de Rock DJ é especialmente memorável, sintetizando o espírito irreverente do cantor e seu impacto na cultura pop. Da mesma forma, momentos mais introspectivos são enriquecidos pelo uso da música, como na tocante execução de Angels, que emociona ao refletir as dores e os anseios do protagonista.

No entanto, nem tudo funciona perfeitamente. A segunda metade do filme, ao abordar o declínio de Williams, por vezes se torna excessivamente fragmentada. Há um desequilíbrio entre o tom festivo e a densidade dramática, resultando em algumas passagens que poderiam ser melhor desenvolvidas. Ainda assim, a força do material e o carisma do protagonista mantêm o interesse do espectador.

O elenco de apoio também merece destaque. Jonno Davies, que interpreta Williams em sua fase adulta, entrega uma performance cativante, capturando as nuances do cantor sem cair na mera imitação. O trabalho dos atores que vivem os familiares e colegas de banda contribui para enriquecer a narrativa, oferecendo um contraponto às turbulências internas do protagonista.

Em um cenário onde cinebiografias musicais costumam seguir um caminho seguro, Better Man – A História de Robbie Williams se arrisca e, na maior parte do tempo, acerta. Sua abordagem lúdica e sua disposição em explorar a psique de seu protagonista fazem dele uma experiência singular. Pode não ser um filme para todos os gostos, mas certamente é um dos retratos mais ousados e memoráveis já feitos sobre um artista pop. A bilheteria pode não ter correspondido às expectativas, mas sua inventividade e sinceridade garantem um lugar de destaque no gênero.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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