Crítica | Borat: Fita de Cinema Seguinte (Borat Subsequent Moviefilm)

Nota
3.5

Quase 15 anos depois do primeiro filme, Sacha Baron Cohen volta a interpretar o irreverente repórter Borat Sagdyiev em “Borat: Fita de Cinema Seguinte” (2020), com um teor ainda mais crítico e ácido. Através de uma excentricidade diferente de antes, o cazaquistanês novamente percorre pelas ruas norte-americanas à procura de furos de reportagens e das figuras bizarras do lugar, construindo pontes que cativam todos à sua volta – inclusive, suas próprias ações.

Diferentemente da primeira obra, o segundo consegue ser um pouco mais ácido justamente pelo mundo mais globalizado em que vivemos e pelo momento de eleição dos EUA. Nesse contexto, o roteiro afiado encontra modos de criticar a postura do presidente Donald Trump e usar sua xenofobia como denúncia e representação dentro do filme. Afinal, desde o início de tudo, Borat e sua origem são recebidos com olhares desconfiados e acabam submersos no estereótipo que o estadunidense – e o Ocidente num geral – cria sobre o Oriente Médio, como se fosse um continente exótico e inferior.

Aqui, Jason Woliner faz questão de demonstrar que, ainda que uma pessoa receba carisma de outros à sua volta, ela não está livre do estigma e da discriminação, tal qual o Borat. Quanto mais cai em situações constrangedoras e formula vexames para seus entrevistados, mais o jornalista é criticado, como se não tivesse outros exemplos mais obcecados pela mídia. Nesse sentido, a direção promove momentos que beiram à armação e quase nada pode ser comparado ao primeiro filme, já que a mudança do cenário e o pensamento são drásticas – exceto o preconceito das pessoas, que ainda se mantém.

Além disso, observamos a chegada de Tutar, a filha de Borat, e todos os seus dilemas. Observadora e centrada nos seus objetivos, a menina surge na pele de uma porta-voz do feminismo e contra o conservadorismo da sociedade, e almeja estudar e trabalhar, confrontando os princípios que a impedem. Aos poucos, a personagem se torna a mais realista da trama e um resquício de lucidez em meio ao caos, moldando seu próprio destino e fugindo das imposições machistas com as quais o seu pai – e a comunidade no geral – a cria. Repare que, embora os dois tenham uma boa relação, Tutar almeja a liberdade e tomar suas próprias decisões.

Mais do que isso, a figura da jovem evidencia que a ideologia conservadora dos Estados Unidos não é muito diferente da de seu país. Afinal, sofre os mesmos julgamentos em ambos lugares e tenta mudar essa condição. Dito isso, a crítica à política de Donald Trump se mostra certeira e propícia, comparando o republicano a um líder que ele mesmo diz “combater”, ironicamente, bem como o espaço que o filme encontra de criticar silenciosamente o governo brasileiro, usando e abusando da onda de fake news.

Membro novo no elenco, a atriz búlgara Maria Bakalova se destaca como a determinada Tutar e rouba a cena, construindo boas camadas para a personagem e criticando posicionamentos diversos no filme. Sempre afiado, Sacha Baron Cohen, por sua vez, ainda mantém os trejeitos e o tom sarcástico que são marcas do Borat, além de sustentar o nível do personagem durante a trama. Fica aqui a torcida para que ambos sejam lembrados nas futuras premiações, visto que a Amazon já afirmou que os dois atores serão pré-indicados. Ótima e grandiosa dupla.

Entre erros e acertos, a continuação equilibra o estilo irônico imortalizado no primeiro, mesmo que o nível seja um pouco inferior, e se forma com um filme necessário no atual momento. Num ambiente tomado pela tecnologia, a facilidade de interações entre pessoas diferentes cresce, ao mesmo tempo que distancia e fortalece esse tipo de filmagem. Um bom exemplo de que uma continuação pode ser muito bem-vinda, sem sombra de dúvidas.

 

Apenas um rapaz latino-americano apaixonado por tudo que o mundo da arte - especialmente o cinema - propõe ao seu público.

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