Crítica | Como Treinar o Seu Dragão 2 (How To Train Your Dragon 2)

Nota
5

Passados cinco anos desde que dragões e vikings se aliaram em uma coexistência antes inimaginável, o céu sobre a Vila de Berk reflete agora a paz e a liberdade de quem fez das diferenças uma força. Entre voos e batalhas amistosas, a comunidade se ajusta a uma vida em harmonia com criaturas que um dia temeram. No entanto, enquanto novas fronteiras se abrem para esse povo, segredos há muito enterrados e perigos desconhecidos surgem no horizonte, ameaçando romper o equilíbrio conquistado.

Em Como Treinar o Seu Dragão 2, Soluço (Jay Baruchel) embarca em uma jornada de descoberta pessoal e heroísmo. Agora mais maduro e curioso sobre o mundo além de Berk, ele explora terras distantes com seu inseparável amigo, o dragão Banguela. Ao longo dessa jornada, Soluço descobre uma colônia de dragões e irá reencontrar alguém a muito perdida. Mas o encontro também revela uma nova ameaça: Drago Bludvist (Djimon Hounsou), um caçador de dragões determinado a dominar todas as criaturas e usar sua força para oprimir os povos. Dessa vez, o jovem herói é forçado a enfrentar não apenas uma batalha para salvar seu lar, mas também a própria responsabilidade que lhe cabe como líder em formação.

O enredo do segundo filme expande o universo criado no primeiro, aprofundando os vínculos e os desafios entre personagens, agora mais complexos e marcados pelo tempo. Soluço se vê diante de escolhas que põem à prova seu senso de dever, e sua relação com Banguela é explorada em um nível emocional mais maduro, realçando a cumplicidade e a coragem necessárias para proteger aquilo que amam. A narrativa se destaca ao aprofundar o crescimento dos personagens, especialmente Soluço, que, além de lidar com as expectativas de seu pai, Stoico, precisa confrontar a própria visão de mundo. Ele não é mais o jovem curioso, mas alguém em busca de respostas sobre seu passado e sobre o que significa, de fato, liderar. A introdução de novos dragões e a revelação de segredos familiares trazem um peso emocional que eleva a trama, proporcionando momentos de intensa vulnerabilidade e conexão.

A relação entre Soluço e Banguela atinge novas camadas. Agora parceiros experientes, eles enfrentam não apenas perigos físicos, mas conflitos internos, que exigem lealdade e compreensão em meio a desafios inéditos. Banguela, ao desenvolver um novo status entre os dragões, coloca Soluço diante de uma dura realidade: a de que seus destinos podem seguir rumos diferentes. Drago, por outro lado, emerge como um vilão implacável, cujo contraste com a pureza dos dragões representa a ambição humana em sua forma mais sombria. Ainda, o reencontro de Soluço com um importante personagem do passado traz uma carga emocional que reverbera ao longo da narrativa, enriquecendo o arco de transformação do protagonista.

O desenvolvimento dos personagens secundários também enriquece a narrativa. Astrid, Melequento, Perna-de-Peixe e os Gêmeos Cabeludos, todos crescem em suas personalidades, contribuindo com humor e lealdade à história central, enquanto enfrentam as próprias jornadas de amadurecimento. Valka (Cate Blanchett), em especial, é uma adição surpreendente; com sua paixão pelos dragões e seu conhecimento vasto, ela é a mentora que Soluço não sabia que precisava, trazendo à tona uma nova perspectiva sobre o papel dos dragões e sua importância. Além disso sua relação com Stoico (Gerard Butler) e passado explorado são a razão de uma das cenas mais lindas da história das animações.

Visualmente, o filme é um espetáculo de animação, onde cada detalhe contribui para criar uma ambientação épica e envolvente. A DreamWorks Animation supera-se mais uma vez, combinando tecnologia avançada e um olhar artístico apurado, que resulta em sequências de voo deslumbrantes e cenas de batalha eletrizantes. A qualidade das texturas, da iluminação e das expressões faciais dos personagens conferem uma profundidade que ultrapassa os limites da tela. John Powell retorna com uma trilha sonora vigorosa e emotiva, elevando cada momento com uma composição que é, ao mesmo tempo, poderosa e delicada, guiando o espectador por uma montanha-russa de emoções.

As questões morais e sociais levantadas pelo conflito com Drago Bludvist adicionam um peso inesperado à história. Representando a dominação pelo medo e pela força bruta, Drago desafia diretamente a filosofia pacifista e conciliadora de Soluço. Esse embate simbólico entre violência e empatia não apenas move a trama, mas oferece ao público uma reflexão sobre poder e responsabilidade, especialmente no que se refere à liderança e ao compromisso com a comunidade.

Ao balancear a emoção com a ação, Como Treinar o Seu Dragão 2 mostra a evolução de seus personagens e se aprofunda nas relações humanas e suas complexidades, revelando que o verdadeiro heroísmo está na compaixão e na coragem de enfrentar os próprios medos. Ao abraçar o crescimento e o desconhecido, o filme transmite uma mensagem poderosa sobre aceitação e sacrifício, provando que, mesmo em meio à fantasia, temas universais encontram seu lugar.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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