Crítica | Cruella

Nota
4.5

“Você possui talento, pode ter sua marca. Se tem um instinto assassino é a pergunta de ouro.
Eu espero que sim.”

Estella (Emma Stone) nunca foi alguém comum. Brilhante, inquieta e com um gênio verdadeiramente diabólico, a jovem aprendeu desde cedo a revidar qualquer coisa que o mundo jogasse a sua frente. Mas, após a morte de sua mãe, a garota teve que aprender a se virar, suprimindo seu lado perverso e aproveitando aquilo que aparecesse em seu caminho.

Junto com Horácio (Paul Walter Hauser) e Gaspar (Joel Fry), a jovem torna-se uma vigarista de primeira, aplicando pequenos golpes enquanto alimenta seu talento ao costurar disfarces perfeitos para suas tramoias. Mas, mesmo estando feliz em sua nova vida, Estella ainda sente que pode ser mais do que realmente é. Por isso, quando surge a oportunidade de trabalhar na botequim mais conceituada de Londres, ela a agarra com unhas e dentes, chamando assim a atenção da Baronesa de Von Hellman (Emma Thompson), uma lendária fashionista que se mostra tão assustadora quanto chique.

Enquanto tenta sobreviver ao mundo magnifico que sempre sonhou, Estella descobre segredos obscuros que despertam uma nova vontade em seu ser. Aproveitando as novas ondas da revolução punk dos anos 70, a brilhante órfã decide abraçar seu lado mais rebelde, e trazer a tona alguém tão magnifica, elegante e, bem, porque não dizer… cruel, para executar com perfeição seus planos de vingança.

Cruella DeVil é uma das vilãs mais memoráveis já feitas. Perversa, caricata e extremamente maligna, a antagonista elevou sua obra, trazendo um acerto magistral que se estende de seu livro de origem ao longa animado que perpetuou seu nome. Por isso, recontar sua história e lhe dar um protagonismo para que conhecêssemos outro lado de sua persona era um golpe arriscado, principalmente quando a própria Disney tentava amenizar os feitos de seus vilões a ponto de, às vezes, torná-los os mocinhos injustiçados de suas jornadas. Surpreendente, não poderíamos estar mais enganados.

Dirigido pelas hábeis mãos de Craig Gillespie, Cruella traz uma releitura em live-action de sua vilã, reestruturando alguns conceitos já conhecidos de sua persona sem negar seu cerne psicólogo, que aflora a cada nova passagem do longa. O filme não tenta esconder a maldade de sua protagonista e, mesmo que use de eventos traumáticos e revelações devastadoras para narrar sua história, ele nos mostra que certos aspectos sempre estiveram ali… esperando para tomar o controle.

Desde o princípio a protagonista se mostra agressiva, geniosa e rebelde, saindo do lugar comum e vivenciando uma batalha constante para controlar seu lado mais sombrio. Cruella não tem medo de quem é, trazendo isso em seu cerne e tomando o controle daquilo que estiver ao seu alcance… seja para o bem ou para o mal. Sua dualidade é imensurável, trazendo dinamismos interessantes que acrescentam ainda mais à trama, nos tirando do lugar comum enquanto expõe um leque de possibilidades para o que pode acontecer aqui.

Emma Stone sabe bem disso e aproveita cada segundo de sua deliciosa personagem. Stone consegue balancear as duas personas ali presentes, transmitindo com veracidade as nuances necessárias para conduzir sua narrativa em momentos perfeitos para seu crescimento. Percebemos quando cada lado assume o controle, trazendo dinâmicas diferentes e explorando novas camadas, além de explorar bem os conceitos estabelecidos sem perder o cerne de sua personagem. A atriz brilha durante todo longa, carregando uma das melhores performances de sua carreira e entregando tudo aquilo que não sabíamos precisar até vê-la em tela.

Horácio e Gaspar deixam de ser apenas capachos da vilã para ganhar personalidades e desejos próprios. Gaspar é alguém mais perspicaz, que serve como voz da razão ao perceber coisas não ditas por seus companheiros, enquanto Horácio traz o alívio cômico oportuno para a trama, referenciando sua personalidade original enquanto acrescenta novos ingredientes à mistura. O relacionamento entre o trio ocorre de forma orgânica e coesa, de modo que conseguimos entender o que acontece ali sem que o roteiro precise esfregar na nossa cara a força dos laços que unem os personagens.

A trupe ainda conta com a ajuda dos adoráveis Buddy e Wink, que trazem momentos deliciosos para a trama. Outra grata surpresa se encontra em Artie (John McCrea), um artista punk dono de um brechó, que casa perfeitamente com o estilo rebelde da nossa protagonista, servindo como espelho anárquico da vontade escondida dentro dela.

Mas, o que seria de uma história sem uma vilã magnifica para despertar o nosso pior? Emma Thompson entrega toda malícia e refinamento que sua personagem poderia pedir. Magnata e soberana em seu universo, a Baronesa atropela qualquer um que se meta em seu caminho criando assim uma relação bastante similar ao Diabo Veste Prada com a jovem Estella. A constante admiração e ódio entre elas traz combustível à narrativa, inebriando o público com seus movimentos fabulosos e nos deixando sedentos para o próximo ato da trama.

Por falar em fabuloso, o longa respira e vivência a moda em cada segundo de seu desenvolvimento, se tornando inevitável falar desse componente tão magistral durante a rodagem. Criados por Jenny Beavan, os figurinos trazem um deleite visual, que consegue transitar entre o ar clássico da Baronesa e a rebeldia punk de Cruella. A quebra de padrões e o marketing de guerrilha trazem momentos icônicos para o filme, explorando bem a época na qual se posiciona e trazendo uma das transformações visuais mais completas dos últimos anos. Não seria surpresa se as artes de figurino, cabelo e maquiagem fossem indicadas ao Oscar no próximo ano.

A trilha sonora, repleta de hits, engrandece ainda mais as cenas, mostrando um acerto oportuno que conversa com os sentimentos da protagonistas. Sentimos seu entusiasmos, decepção, loucura e maldade de forma crescente e contínua, o que melhora ainda mais nossa passagem ao longo da história.

Divertido e deliciosamente diabólico, Cruella se mostra uma das melhores releituras dos amados clássicos de nossa infância. Trazendo algo inteiramente novo mas sem perder o cerne que nos trouxe até aqui, o longa nos presenteia com um deleite visual, que nos conquista por suas manobras enquanto conhecemos toda insanidade contida em sua protagonista. Mostrando assim que podemos criar algo proveitoso sem pedir desculpas contínuas sobre o que nos tornou o que nos somos. E, acredite, nunca foi tão magnifico ser cruel.

“Meu nome é Cruella. Muito brilhante, um pouco má e só um pouquinho maluca.”

 

Preso em um espaço temporal, e determinado a conseguir o meu diploma no curso de Publicidade decidi interagir com o grande público e conseguir o máximo de informações para minhas pesquisas recentes além, é claro, de falar das coisas que mais gosto no mundo de uma maneira despreocupada e divertida. Ainda me pergunto se isso é a vida real ou apenas uma fantasia e como posso tomar meu destino nas minhas mãos antes que seja tarde demais...

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