Nota
“O Natal não é só um dia, é um estado de espírito.”
Kris Kringle, enquanto passeia pelas ruas de Nova Iorque, acaba ficando indignado quando percebe que o homem fantasiado de Papai Noel na Parada Anual do Dia de Ação de Graças da Macy’s está bêbado. Se sentindo ofendido ao perceber que um homem que o representa não é moralmente correto, ele decide reclamar com Doris Walker, a funcionária da loja encarregada do desfile, que acaba demitindo o bebâdo e, sem opção, chama Kris para assumir o posto de papai-noel na Parada e trabalhar na loja Macy’s da Rua 34, atendendo as crianças como Papai Noel. Mas Kris não é qualquer idoso trabalhando como Papai Noel, ele é O Papai Noel original, mudando completamente a forma de abordagem da Macy’s com seus clientes e, ao conhecer a filha de Doris, Susan Walker, se dedicando a fazer a garotinha acreditar que Papai Noel realmente existe, e é ele.
Um clássico natalino lançado originalmente em 4 de junho de 1947, o longa dirigido e roteirizado por George Seaton, e distribuido pela 20th Century Fox, usa o conto de Valentine Davies para construir uma envolvente trama sobre a importancia do espírito natalino, usando a figura de Kris para carnalizar esse espirito natalino ao nos colocar frente a frente com o idoso de longas barbas brancas que afirma ser o Papai Noel, nos fazendo o tempo todo questionar se devemos ou não acreditar nessa afirmação, ao mesmo tempo que o coloca como instrumento direto de transformação dentro e fora da Macy’s. Como diria o nome original do longa, Kris opera um milagre em meio à Rua 34 quando faz uma loja abrir mão da fome capitalista pelo bem do marketing difarçado de espirito natalino, quando o fato de Kris indicar outras lojas aos pais quando os pedidos de brinquedos feitos pelas crianças não podem ser atendidos pelo estoque da Macy’s chega aos ouvidos da chefia, junto a diversos elogios dos clientes e números que indicam um aumento nas vendas, e faz com que essa atitude se estenda aos funcionários da loja e, logo após, até à Gimbels, principal concorrente da Macy’s.
Mas até onde o espirito natalino é capaz de transformar as pessoas? É nesse ponto que a trama de Susan é colocada em evidência, uma garota que foi criada por uma mãe solteira que fez questão de não alimenta-la com ilusões, que a fez sempre saber que contos de fadas são só histórias e Papai Noel não existe, mas quando essa descrença cruza com a presença de Kris, tudo fica instavel, o que leva Doris a entrar em parafuso, até onde as ações de Kris podem ajudar no seu emprego? Será que um velho louco como esse pode prejudicar a Macy’s? Um questionamento que extrapola os escritórios, passa pelas mãos do egoísta psicólogo da Macy’s, Granville Sawyer, e acaba indo parar no Tribunal de Nova Iorque, onde, com a ajuda do jovem advogado Fred Gailey, vizinho de Doris que é apaixonado por ela, luta para provar ser o verdadeiro Papai Noel como afirma.
A entrega de Edmund Gwenn ao papel de Kris é surpreendente, o ator absorve completamente a persona do Papai Noel e, mesmo aos que não conhecem a conexão do nome Kris Kringle com Papai Noel, fica obvio desde a primeira cena quem o idoso realmente é. A atuação é um dos pontos altos do longa, o que fortalece ainda mais a moral da história por trás do enredo, sobre a verdadeira importancia do espirito natalino e da crença, não é atoa que o papel tenha dado ao ator o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante em 1948. A doçura de Natalie Wood como Susan, que se equilibra perfeitamente com a dureza do seu ceticismo, é outro ponto alto, colocando o papel de questionar Kris nas mãos singelas e inocente de uma criança, que luta contra a natureza das ilusões que circundam essa idade. Justamente por conta desse contraste é que se torna tão interessante enxergar Kris, que não se abala pela descrença da menina, trazendo de forma natural e fluida as provas para a sua afirmação, como a bela cena do homem expondo saber falar holandes ao acolher uma triste orfã perdida numa terra que não conhece. Maureen O’Hara e John Payne, respectivamente Doris e Fred, trazem o ritmo que a história precisa para avançar, se tornando motores essenciais para mover as engrenagens das principais tramas apresentadas.
Mágico e tocante, De Ilusão Também Se Vive mostra o verdadeiro significado do Natal ao mesmo tempo que coloca o expectador para questionar suas crenças, o que o fez merecer os Óscares de Melhor Ator Coadjuvante, Melhor História Original (categoria que deixou de existir alguns anos depois) e Melhor Roteiro Adaptado, além da indicação a Melhor Filme. Sendo considerado, pela Biblioteca do Congresso, como sendo “culturalmente, historicamente ou esteticamente significativo”, o longa envelhece de forma dúbia, provando que ainda possui um roteiro praticamente atual e eficiente, mas trazendo pequenos incomodos por efeitos datados de produção que poderiam facilmente ser resolvidos com um remake, trazendo a trama para os dois atuais, que claramente é um tempo onde o espirito natalino está em excassez, e onde a magia do Natal pode ser muito melhor representada, brincando com os pequenos detalhes que o filme apresenta de uma forma menos discreta, mas ainda assim sutil.
“- Você sabe o que é imaginação?
– Claro, é quando a gente vê coisas que não existem”
Icaro Augusto
Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.