Crítica | Deus Não Está Morto (God’s Not Dead)

Nota
3

“O que eu quero de todos vocês, é que preencham as folhas que eu distribui com três pequenas palavras: Deus está morto.”

Josh Wheaton é um jovem protestante que se matricula na controversa cadeira Filosofia 150, aula que é ministrada pelo professor Jeffrey Radisson, um ateu fervoroso, que exige que seus alunos, na primeira aula, entreguem-lhe um papel escrito “Deus está morto”, um requisito básico para ser aprovado na cadeira. Quando Josh se torna o único aluno da classe a se recusar em cumprir a tarefa, Radisson obriga que ele, como unica forma de não ser reprovado, prepare uma palestra que prove que Deus não está morto, tendo a chance de, em seu discurso, convencer toda a classe do contrário do que suas aulas ensinam.

Há muitas décadas existe um relato, que já é considerada uma lenda urbana, surgida desde antes de a internet se tornar popular, onde um estudante evangélico debate com um professor ateu em frente da classe, um debate onde o estudante tenta defender seus conceitos de Deus perante seus colegas, indo contra os conceitos ensinados pelo professor. O relato foi mudado pelos anos, chegando até a ter versões que alegam que o estudante era Albert Einstein (algo que já foi desmentindo pelos fatos), mas sempre terminam com o estudante defendendo sua visão e sendo aplaudido pela classe. Talvez tenha sido essa história que baseou o roteiro de Cary Solomon e Chuck Konzelman, que fizeram uma releitura mais profunda do relato e fundiram com o livro God’s Not Dead: Evidence for God in an Age of Uncertainty, de Rice Broocks, para criar uma versão mais acadêmica e cientifica do debate, livro que inclusive aparece no filme como uma das bases do debate de Josh. No longa, Josh recebe três semanas, com três debates, onde precisa defender a existência de Deus, enquanto Radisson se mostra firme, derrubando cada um dos argumentos de seu aluno com seus fatos científicos, o que cria um embate psicológico poderoso, envolvente e curioso.

A grande trama principal do longa é protagonizada por Shane Harper e Kevin Sorbo, sendo Harper o grande mocinho, o inocente rapaz cristão que luta com todas as suas forças para defender suas crenças, e Sorbo o grande vilão, o agressivo professor que está pronto para devorar seu aluno e reprova-lo na primeira falha do garoto, mas o longa ainda trás tramas paralelas, que parecem desconexas com o decorrer do longa, mas, aos poucos, vão assumindo posições mais claras e interferindo na trama ‘Wheaton v Radisson’. Ao longa do filme vamos conhecendo Mina (Cory Oliver), a jovem esposa de Radisson, que começa a se questionar sobre sua relação, quando vê sua mãe definhando e percebe que precisa se agarrar a suas crenças cristãs, o que faz seu casamento ficar em perigo; Amy (Trisha LaFache), que acaba de descobrir um câncer e fica perdida em sua vida, algo que prejudica seu namoro com Martin (Dean Cain), o executivo que é irmão de Mina e se afastou da família quando sua mãe começou a ficar senil; Temos ainda Martin Yip (Paul Kwo) e Ayisha (Hadeel Sittu), dois alunos de Radisson que questionam suas crenças, que estudam secretamente o cristianismo em degradação dos ensinamentos que cresceram aprendendo, já que são, respectivamente, vindos de uma cultura oriental e islâmica; e temos, por fim, como grande guia espiritual do longa, o Reverendo Dave (David A. R. White), o homem que surge para orientar religiosamente cada um dos personagens nos momentos em que eles mais precisam, e que surge como alivio cômico do filme em vários outros momentos.

O grande problema do longa, no entanto, talvez seja o fato de ele emergir demais na religião e, por consequência, esquecer que está tratando de um tema que deveria ser voltado para todos os públicos. O longa promete um embate emocionante, cheio de discussões entre um cristão e um ateu, mas parece tão focado em vilanizar o ateísmo que acaba perdendo a chance de ser um filme interessante, se tornando uma grande disputa de poder, chegando ao ponto de criar uma motivação forte para o antagonista mas não usa-la da melhor forma, usando a tênue linha que divide o amor e o ódio para definir a atitude do professor, de uma forma que não tem quase nenhum impacto moral real, apesar de usar excelentes citações para defender cada um dos pontos. Com seus 113 minutos, o filme prefere deixar uma premissa de que o ateísmo é um monstro criado pela magoa do que realmente debater sobre os fatos e defender sua visão, que poderia ser muito melhor embasada pelo livro de Rice Broocks, livro com fortes argumentos capazes de levar a trama ao mesmo final sem usar artifícios tão preconceituosos. O contrario acontece com as subtramas do longa, que apesar de se basearem bastante na fé não chegam para mostrar em que acreditar mas como aconselhamentos de como agir, vemos nas redenções de Mina, Amy, Ayisha, Yip e Martin que a fé pode levar qualquer pessoa a mudar sua forma de ver o mundo, se fortalecendo para fazer escolhas que o fazem lutar contra atitudes moralmente erradas.

O grande problema da produção é justamente ter um bom material e não usa-lo de forma efetiva, o roteiro exibe falhas fáceis de enxergar, talvez acumulando os principais problemas que causam todos os preconceitos inerentes da indústria cinematográfica cristã. O filme tenta pegar uma corrente de e-mails do passado e revitalizar em algo moderno e cativante mas, por incrível que pareça, as melhores partes do filme são justamente aquelas que não foram inspiradas nessas mensagens, criando várias tramas que, se julgadas separadamente, poderiam produzir filmes de recepção inversas. Indo fundo num melodrama que, em certos momentos, incomoda, o longa se coloca num cenário predominantemente ateu, colocando os cristãos como minoria, e usando seu protagonista como agente da mudança, o colocando como único defensor da fé em sua sala, lutando para mudar a mente de todos os outros e não apenas de seu professor, dando a entender que todo o sistema universitário dos Estados Unidos luta para silenciar os verdadeiros cristãos no campus (ideologia baseada nos diversos processos que figuram o sistema judiciário americano), o que faz o longa comprar uma briga desnecessária e, como já dito, deixar de se empenhar na trama que realmente o teria deixado bem mais receptivo para todos os públicos.

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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