Nota
“Quinze segundos são o bastante para mudar tudo completamente”
Lily Bloom supera uma infância traumática, onde tinha que assistir seu pai bater em sua mãe periodicamente, e decide começar uma nova vida em Boston, onde pretende realizar o sonho de abrir seu próprio negócio, mas um dia, enquanto está no telhado de um prédio, acaba conhendo o charmoso neurocirurgião Ryle Kincaid, um paquerador nato que desencadeia uma conexão intensa com Lily e, à medida que os dois se apaixonam profundamente, faz a mulher achar que encontrou o amor verdadeiro. Mas, enquanto Lily está começando a crescer com sua loja e o romance de Lily e Ryle se torna mais forte, ela começa a ver lados de Ryle que a lembram do relacionamento de seus pais. Como se não bastasse a agitação que sua vida já estava passando, Atlas Corrigan, seu primeiro grande amor nunca encerrado, reaparece repentinamente em sua vida, o que faz com que o relacionamento com Ryle fique mais abalado. Agora Lily precisa aprender a confiar em sua própria força para fazer uma escolha impossível para o seu futuro.
É Assim Que Acaba é o primeiro romance de Colleen Hoover a ser adaptado para o cinema. O projeto nasceu em meados de 2019, quando Justin Baldoni adquiriu os direitos de adaptação do romance (que venhamos e convenhamos, não tem nada de romantico), para seu estúdio, Wayfarer Entertainment. Com roteiro de Christy Hall, o filme traz Justin na direção e protagonizando como Ryle, o que mostra a dedicação do executivo para garantir que essa obra ganhe as telonas, uma dedicação que fica evidente na atuação do ator, que é um dos grandes destaques da produção. Justin entrega um frieza ideal para o papel, o que contrabalança perfeitamente com a personalidade impulsiva e poderosa que Ryle possui, como se ele fosse capaz de ter todas que quisesse, mas encontra um grande desafio quando não consegue transar com Lily naquela noite no telhado. Outro grande ponto da personalidade de Ryle é seu jeito dissimulado, inocente e manipulador, que convence Lily a confiar nele mesmo depois de ser agredida, algo que o ator consegue tirar de letra, Justin consegue ao mesmo tempo ser o galã, o mocinho e o vilão com uma facilidade que permite que o personagem seja adaptado perfeitamente. Mas essa não é a história de Ryle, é a de Lily, e Blake Lively prova que foi uma ótima escolha para o papel, ela consegue deixar exposta a determinação, força de vontade e empatia que torna Lily tão exemplar e tão vulneravel, ela é sedutora o tempo todo, mas ao mesmo tempo seus traumas deixam ela vulneravel, como se estivesse em busca de um amor que pudesse a acolher depois de tudo que viveu com seus pais. Blake fortalece a trama e entrega tudo, lembrando muito dos traços de Serena van der Woodsen quando vemos ela se entregar para Ryle, acreditando cegamente no amor do cafajeste redimido, e que acaba sendo facilmente manipulada pelas pessoas ao seu redor.
O trio protagonista se completa com Brandon Sklenar, que no papel de Atlas entrega uma versão mais compassiva do personagem, apesar de Atlas ainda mostrar um lado protetor quando se trata de Lily, a construção do filme parece trazer uma versão mais quebrada de Atlas, mais afetada pelo que sofreu na infância ao apanhar de seu padrastro e ser expulso de casa pela sua mãe, ele também possui mais marcas, algo que faz ele e Lily se conectarem com mais força na infancia, mas que acaba tirando muito do ar de porto seguro que o personagem possui na versão literaria, mesmo que isso não prejudique tanto o curso do enredo do filme. Apesar do filme funcionar muito bem sozinho, é importante ressaltar que há algumas mudanças feitas durante a adaptação, muitas mudanças até melhoram a fluidez da trama, como a introdução que se torna mais rápida, outras acontecem para tirar elementos que poderiam alongar a trama, como remover o imã de Boston e, por consequência, trocar o nome do restaurante de Atlas de BIB’s para Roots, mas há cenas que fazem um pouco de falta, principalmente por serem detalhes pequenos que ajudavam na construção de alguns personagens no livro, como é o caso da foto no telhado que vira um quadro, e fala muito sobre a obsessão que Ryle tem por Lily. Talvez as mudanças que mais pesam na adaptação seja a forma como mudam muito a personalidade de Alyssa e como a história de Atlas e Lily acaba sendo acelerada demais (fazendo meses de relação virarem dias), mas apesar de poder ser incomodo para quem leu o livro, essas mudanças não pesam em nada para quem for assistir ao filme sem referências. Apesar disso, no geral, o longa é uma adaptação muito fiel ao livro, muito talvez se deva ao fato de Colleen ter supervisionado o roteiro e ter selecionado um grupo de fãs para lê-lo e apontar cenas e falas do livro que eram essenciais adicionar na adaptação.
Denso e polêmico, É Assim que Acaba é uma adaptação arriscada e um tanto fiel, corrigindo problemas do livro ao mesmo tempo que cria novos, o longa encontra um grande desafio no momento de escolher entre ser comercial e ser relevante. O livro de Colleen Hoover é marcante por ter sido inspirado na história dos pais da autora, uma história sobre abuso doméstico que serve para conscientizar quem passa por isso, que serve para ensinar a ter empatia com quem passa ou passou por isso, mas que acaba sendo doloroso para quem passou por isso ou conhece alguem que já passou, mas infelizmente o filme acaba escolhendo seguir um caminho mais comercial e minimiza muito do que Ryle faz a Lily e muita da história de Atlas, o que faz uma história sobre sobrevivência virar um filme sobre amadurecimento. Apesar de minimizar muito o enredo, talvez numa busca por tornar a trama mais leve, diminuir os gatilhos e garantir a classificação de 16 anos, a produção de Justin Baldoni sabe escolher o melhor caminho para conduzir o roteiro de um filme e ainda assim ser uma grande homenagem aos fãs do livro. Temos easter-eggs mil no decorrer do longa, que remetem diretamente a Procurando Nemo, Ellen DeGeneres e cenas que fazem referência a eventos que só quem leu o livro vai entender, além de termos um cameo da Colleen em um momento bem inesperado. Talvez o grande ponto de interrogação da adaptação seja justamente suas escolhas, até onde as mudanças da adaptação descaracterizam o objetivo do livro? Até onde o roteiro ajuda a história e até onde atrapalha? Até onde a fidelidade pode ajudar na bilheteria e até onde a romantização pode prejudica-la?
Icaro Augusto
Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.