Crítica | Green Book: O Guia (Green Book)

Nota
3

De todos os indicados ao Oscar na categoria de Melhor Filme em 2019, nenhum deles é tão polido e esquemático quanto Green Book: O Guia, protagonizado por Viggo Mortensen e Mahershala Ali. Dirigido por Peter Farrelly, o longa trata de uma história real que aconteceu nos Estados Unidos na década de 1960, quando um motorista branco de origem italiana (Mortensen) teve de conduzir um pianista negro muito sofisticado por uma turnê no sul do país. O termo “Green Book” se refere ao guia The Negro Motorist Green Book, usado pelos negros durante meados do século XX.

O roteiro, coescrito por Farrelly, adota a narrativa tradicional de road-movie como forma de desenvolvimento gradativo das situações às quais os personagens serão submetidos, o que abre espaço para muito senso de humor. É exatamente esse tom jocoso que a direção traz (habituada com a comédia) no intuito de discutir seus temas e dar um pouco mais de dimensão a seus protagonistas, ainda que, no papel, estes não vão muito além da caricatura.

A composição dos atores também ajuda bastante Green Book: O Guia a não “estancar”, sendo a química dos dois fundamental para que ele “acelere”. Viggo Mortensen se vê tão à vontade no papel de Tony Lip, com seus trejeitos grosseiros e o bom coração vendido pelo filme, que mal dá para afirmar seu esforço interpretativo. Mahershala, como sempre, esboça aquele sorriso expressivo com a mesma intensidade e inteligência de sua seriedade, e não deixa em momento nenhum de ser divertido quando contracena com seu companheiro. Aliás, se o roteiro tem algo de realmente interessante, além dos diálogos de Tony com Don Shirley, é a amarração de todos os pequenos detalhes que surgem em cena para que estes tenham uma repescagem adiante, banal ou não. Pode-se dizer, então, que, embora construído dentro da caixinha, Green Book: O Guia fez a lição de casa sem dificuldade.

Chama atenção, porém — num período histórico em que as premiações assumem cada vez mais um caráter político e social, com discursos contundentes e pulso temático (de Corra! até Infiltrado na Klan) — que os holofotes estejam voltadas para um filme tão normativo e adocicado quanto este aqui. É bem verdade que nem todos tem o dedo incisivo de um Spike Lee, mas, se você propõe discutir questões tão difíceis e ásperas do momento (ainda mais levando em conta o peso político que as premiações acarretam), é esperado pelo menos um pouco mais de dentes e um pouco menos de açúcar.

De Recife (PE), Jornalista, leonino típico, cinéfilo doutrinador.

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