Nota
“Leo, se você roubasse um beijo de alguém, como é que você faria para devolver?”
“Qual o seu nível de preguiça?” Depois de umas longas férias sem fazer nada, Leo (Ghilherme Lobo) e Gi (Tess Amorim) não veem a hora de voltar ao colégio, na busca de algo emocionante acontecer. E dessa vez eles deram sorte, porque o aluno novo, Gabriel (Fábio Audi), vai entrar nessa dupla de amigos e abalar um pouco a dinâmica dos dois. Enquanto isso, Leo tenta cada vez mais ser independente dos pais, que se preocupam muito com ele por ser cego e, numa tentativa de acabar com tantas cobranças, ele pensa em fazer intercâmbio. O romance gay adolescente dirigido por Daniel Ribeiro, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, conquistou muitas pessoas em 2014, quando foi lançado, quatro anos após o curta que o inspira.
Após dois curtas, Daniel Ribeiro apostou numa adaptação em longa-metragem do seu curta Eu Não Quero Voltar Sozinho (2010), trazendo de volta aos papéis de Leonardo e Gabriel, Ghilherme Lobo e Fábio Audi. O curta havia conquistado muitos fãs já em 2010 pela sua repercussão no Youtube, e só era uma questão de tempo para ser adaptado em longa-metragem. Até hoje em dia é muito difícil ter histórias LGBTQ+ leves e sem dramas que girem em torno de homofobia, ou sem um grandes arcos de sofrimento do personagem ou sem um final trágico. Pensando exatamente nisso, que desde o curta metragem ficava nítida a preocupação do diretor em trazer uma leveza na história com relação aos conflitos dos personagens, onde a grande preocupação do Leo acaba sendo a de muitos adolescentes, de ser independente.
A escolha de elenco foi muito bem pensada pelo diretor, que após ter escolhido Ghilherme Lobo como Leonardo, fez todo um estudo para que ele conseguisse interpretar um personagem cego. A prática, que hoje em dia é chamada de “Crip Face” (quando um ator sem deficiência interpreta um personagem com deficiência) pesou na época, principalmente levando em consideração que em 2009, durante a novela Caras e Bocas, a jornalista Danieli Haloten interpretou a personagem Anita. Uma escolha que, segundo o diretor, precisou acontecer pois foi difícil encontrar um ator PcD para o papel, já que a princípio havia sido pensado para um ator na faixa de 15 anos, idade que Ghilherme Lobo tinha na época das filmagens do curta.
Um dos pontos que fazem Hoje Eu Quero Voltar Sozinho ser tão aclamado e querido é, sem dúvidas, a leveza como as temáticas são tratadas, atrelado às atuações dos três atores principais que, mesmo para hoje em dia, tendo um vocabulário mais datado para as gerações z e alpha, conseguem passar bem o espírito do tempo em que foram produzidos.
Os atores de Leonardo e Gabriel tem uma química ótima em cena, e conseguem transmitir muito bem todas as dúvidas e emoções adolescentes, trazendo essa tensão de desejar um ao outro mas sem saber se é correspondido, numa fórmula que foi muito bem trabalhada tanto pela direção quanto pelos atores. Algumas cenas exprimem muito bem isso, como por exemplo, no vestiário, onde Fábio Audi consegue passar muito bem o nervosismo de Gabriel ao ver o Leonardo tomar banho, mas ao mesmo tempo tendo que se concentrar para ajudar o, até então amigo, quando ele terminasse. Além disso, Tess Amorim também consegue passar muito bem a imaturidade de Giovana durante todo o filme, que contribui muito bem para o desenvolvimento da sua personagem e do conflito com os outros dois.
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho já pode ser considerado um clássico do cinema LGBTQ+ brasileiro, e ele tem ótimos motivos para isso: um filme leve e divertido mas sem deixar de ser apaixonante. Tudo isso graças ao cuidado do diretor Daniel Ribeiro, que se preocupou desde o início da produção em conseguir trazer um novo tipo de representatividade, que trouxesse esperança para os jovens LGBTs que fossem assistir o filme. Trazendo de volta o elenco principal do curta de 2010, a química e o amor dos atores com o projeto fica nítida no produto final, que é embalado pela música da banda Belle & Sebastian.