Crítica | Jogador N°1 (Ready Player One)

Nota
4

Em 2044,  o jovem Wade Watts (Tye Sheridan), como o resto da humanidade, prefere a realidade virtual do jogo OASIS ao mundo real. Quando o criador do jogo, o excêntrico James Halliday (Mark Rylance) morre, os jogadores devem descobrir a chave de um quebra-cabeça enigmático para conquistar sua fortuna inestimável. Para vencer, porém, Watts terá de abandonar a existência virtual e ceder a uma vida de amor e realidade da qual sempre tentou fugir.

Uma nostalgia estilo Sessão da Tarde é sempre bem-vinda para os amantes da cultura pop das décadas de 80, 90 e 2000. Porém, há limites que devem ser realmente estabelecidos entre a homenagem e a repetição, elemento este responsável por desequilibrar um filme e torna-lo desprovido de uma identidade própria.

Felizmente, nas mãos de Steven Spielberg, “Jogador Número 1” consegue elevar a premissa do escritor Ernest Cline de unir o nostálgico ao drama e ao entretenimento a uma personalidade que não deixa de remeter aos clássicos filmes do cineasta e as produções cinematográficas, televisivas, musicais e da indústria de jogos da qual o longa se inspira, mas que também se preocupa em utilizar do antigo para ao mesmo tempo oferecer algo novo, como uma distopia futurística mais bem amarrada e explicada para que um público jovem possa compreender a relação tecnologia x humanidade.

De fato, não havia ninguém melhor que Steven Spielberg para levar o romance ficcional de Cline, lançado em 2011, para as telonas. O diretor marca não só o seu retorno triunfal às produções de fantasia, ficção científica e aventura, mas também um admirável respeito pela obra e pelas obras da qual a história utiliza como referência. Spielberg, conduz com eficiência e um perceptível entusiasmo o roteiro assinado por Zak Penn e pelo próprio Ernest Cline, o que faz com o filme funcione bem como adaptação, sem que em nenhum momento haja fuga com a premissa do livro, o que agradará bastante os fãs da obra.

Além disso, o roteiro encontra a oportunidade de fazer alusão ao mundo da qual vivemos, onde há um verdadeiro jogo entre o mundo real e o virtual, onde críticas sutis a respeito de como a sociedade está mais desconectada da realidade e as consequências disso são bem inclusas a trama, mas que poderiam ter uma maior exploração com o decorrer do filme.

Com a apresentação de tantos problemas no futuro da qual a história se passa, 2044, que remetem a nossa realidade, era necessário um aprofundamento maior nas questões sociais e ideológicas. Mas, prezando pelo equilíbrio entre história, desenvolvimento e ação, o filme preferiu não se arrastar a ponto de se tornar excessivo ou até mesmo cansativo. Das críticas idealizadas pela trama, a que melhor se desenvolve é o perigo de uma corporação, a IOI, que almeja descobrir os Easter Eggs dentro do OASIS e controlar tanto o jogo como seus usuários, ou seja, o planeta. Esta ameaça do filme é também muito bem representada pelo antagonista, Nolan Sorrento (Ben Mendelsohn, já conhecido pelo talento em interpretar vilões), que remete ao típico personagem em nível superior de filmes infanto-juvenis da década de 80, responsável por causar o terror nos protagonistas.

Os personagens de “Jogador Número 1”, à propósito, são interessantes e bem atribuídos à trama. Há o personagem principal, com nome de “super-herói”, Wade Watts (interpretado pelo carismático Tye Sheridan), que, apesar de ter um desenvolvimento maior, não ofusca os outros heróis, como Art3mis (interpretada pela brilhante Olivia Cook), Aech (Lena Waithe), Sho (Philip Zhao) e Daito (Win Morizaki), todos eles com ótimos intérpretes e que possuem grandes momentos tanto dentro do OASIS quanto no mundo real.

E que momentos! “Jogador Número 1” não mede esforços em presentear um bom fã da cultura pop com eletrizantes cenas de corrida, revelando veículos icônicos como o DeLorean (Trilogia De Volta Para o Futuro), a moto do Kaneda da animação Akira, o Batmóvel da série “Batman” com Adam West, entre outros, além de cenas de ação envolvendo personagens famosos, cenários de jogos e filmes que são capazes de extrair lágrimas daquele que sempre terá uma criança interior viva e bem alimentada da melhor fonte de nostalgia.

Com uma história que une a distopia futurística à realidade e ao fabuloso mundo da cultura pop, regado com lições de vida a lá Roald Dhal de “A Fantástica Fábrica de Chocolate”, “Jogador Número 1” está para se tornar um marco na carreira de Steven Spielberg não só pela volta do diretor aos filmes que formaram sua identidade cinematográfica, mas pelo fato do mestre ter tratado com carinho e respeito o legado que a indústria de entretenimento nos deixou e que tanto influencia em nossas vidas.

 

 

Jornalista, crítico de cinema, fotógrafo amador e redator. Quando eu crescer, quero ser cineasta.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *