Crítica | Lady Bird: A Hora de Voar (Lady Bird)

Nota
4

Conhecida por suas atuações nos filmes Frances Ha e Mistress America, Greta Gerwig estreia na direção com o universalmente aclamado Lady Bird: A Hora de Voar, vencedor do Globo de Ouro de Melhor Filme – Comédia/Musical e indicado a cinco categorias no Oscar (incluindo Melhor Filme e Melhor Direção).

O roteiro, também assinado pela diretora, conta a história de Christine – ou “Lady Bird”, como ela se autodenomina -, uma adolescente que mora com os pais e o irmão em Sacramento, na Califórnia, onde está concluindo o ensino médio e tenta definir em qual faculdade vai cursar o ensino superior. Ela é frequentemente insatisfeita não apenas com a cidade em que vive, mas também com os modos severos e às vezes controladores de sua mãe. No papel da Lady Bird está Saoirse Ronan e no papel da mãe está Laurie Matcalf, ambas estupendas e indicadas a Melhor Melhor Atriz e Melhor Atriz Coadjuvante.

Passando pelos elementos principais que rodeiam a vida de uma adolescente de classe média tanto em casa quanto na escola, sem nunca cair na caricatura ou no teen convencional, Lady Bird tem uma narrativa dinâmica – porém nunca acelerada – que mostra a passagem do ano de modo que a plateia mal sinta o tempo passar. Primeiro porque a montagem nunca deixa as cenas se prolongarem além do necessário, o que torna os poucos silêncios e reticências dramáticas bastante comoventes; segundo, o timing cômico entra em bom equilíbrio com a sensação de que se está assistindo a vida de uma família de verdade, com problemas de verdade. Essa sintonia entre cinema adolescente indie e  realismo direto favorece um alto nível de conexão com a história, independente do sexo ou idade do espectador.

A cinematografia, aliás, se alia a essa simplicidade: a câmera acompanha suavemente a movimentação dos personagens pelos cenários (quase sempre pequenos) e se mantém frequentemente estática, dando espaço para os atores interagirem com fluidez. A trilha sonora é discreta, conferindo humor quando as cenas pedem e se mantendo ausente quando a dramaticidade das discussões familiares falam mais alto.

É importante deixar registrado que Lady Bird é, na verdade, uma semi-autobiografia. Greta Gerwig está tratando aqui – com várias licenças dramáticas, claro – da sua relação cíclica com a cidade de Sacramento, da sua ida à Nova York no início da fase adulta, das suas inclinações artísticas e criativas e, acima de tudo, da sua relação turbulenta e ao mesmo tempo cheia de afeto com sua mãe, a enfermeira Christine Sauer. Essa relevância dada à cidade e àquele amor materno cheio de contradições fica clara no terceiro ato do filme, onde o roteiro encontra o momento certo de passar sua mensagem através de uma belíssima rima visual.

Não que esses obstáculos e situações que ocorrem na vida da Lady Bird nunca tenham sido trabalhados no cinema antes – foi e muito. O diferencial no trabalho de Greta não está na escolha dos temas (amadurecimento feminino, relação de pais e filhos, apego à cidade, conflitos adolescentes, visão de religiosidade, semelhanças de gerações) e sim na inteligência com que ela filma tudo isso como se estivesse num eixo só; não passa a impressão de que o assunto está sendo mastigado ou “debatido”, e sim que são elementos que compõe a vida e o crescimento de todos; às vezes é imperceptível aos nossos olhos, mas nunca às nossas emoções.

 

De Recife (PE), Jornalista, leonino típico, cinéfilo doutrinador.

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