Crítica | Luca

Nota
3.5

Luca é um jovem monstro marinho que se encanta pelo mundo terrestre e, em um certo dia, acaba fazendo amizade com Alberto, um desbravador monstro marinho que coleciona objetos de humanos e tem o sonho de explorar esse novo mundo numa vespa italiana. Luca nos mostra uma versão de A Pequena Sereia sem príncipe encantado ou bruxa do mar, mas com um tempero de aventura infantil como Os Goonies. O diretor Enrico Casarosa utiliza de metáforas visuais e de roteiro para trabalhar temas importantes, como diversidade e preconceito, mas com um toque bem delicado, em que muitos vão apenas enxergar como um filme sobre amizade na infância.

O diretor imprime o verão da Itália lindamente com aquela vila perfeitamente estruturada, onde conhecemos cada arquétipo de personagem que existe. Um filme cheio de cores de verão, o azul e ciano marinho, o verde e amarelo presentes em todo momento, claramente foi uma homenagem a toda a infância na Itália, a paixão pelas vespas, o futebol, a pesca, aquele cidade costeira com tema náutico, tudo é envolvente. O apelo visual é incrivel, tanto nas transformações dos personagens, de monstro marinho a humano, quanto nas brincadeiras de menino, a sutileza da inocência infantil ao descobrir o mundo, como também ao reagir a certa malícia das crianças da cidade. O longa traz ainda a competição de bicicleta, lembrando um pouco a vibe de Turma da Mônica e Irmão do Jorel, e a amizade com Giulia, que se desenvolve a partir da exclusão, mas cria laços fortes e desperta a vontade de aprender, de ir a escola, a descoberta da educação.

Luca nos acalenta o coração a cada olharzinho de descoberta do mundo, também nos faz tirar uns risinhos dos pais tentando trazer o Luca ao fundo do mar novamente. Alberto nos encanta pela vontade de viver, de não ter medo, da irmandade e carinho por Luca, mesmo sendo tão diferente dele e unidos por ser um monstro marinho, de amar o mundo humano. Giulia mostra toda a possibilidade de coisas que a educação traz, a competição e o senso de justiça. O gato de Giulia traz momentos muito cômicos e seu pai entrega uma doçura em um homem rústico e robusto. Na dublagem brasileira, Cláudia Raia entrega muito no papel da Signora Mastroianni, a responsavel por organizar a Copa Portorosso, e a escolha de Rodrigo Cagiano, Pedro Miranda e Bia Singer, respectivamente, para dublar Luca, Alberto e Giulia, dá um toque mais infantil ainda à obra. Um pouco previsível, o roteiro poderia trabalhar mais na relação de Luca com Alberto, já que no começo do filme vemos um laço e uma química imensa, até que determinado momento tem um corte abrupto, e depois uma reconciliação que poderia ser muito melhor explorada. O famoso “Silêncio, Bruno!” dá um golpe de ensinamento sobre controlar a ansiedade, o que é perfeito em meio a toda a proposta da produção.

Luca investe bem no visual e na doçura, porém poderia ter investido mais em um drama e em desenvolver questões de diversidade de forma mais clara, não com um filtro de leveza para todos os públicos. Esperamos dos filmes da Pixar aquele sentimento ou emoção que só um filme da Pixar traz, aquele diferencial, mas em meio a tantos conteúdos novos, talvez a empresa acabe pecando em não conseguir despertar esse seu diferencial numa nova narrativa. Luca explora o sentimento de férias de verão infantil em um contexto muito próprio, que talvez a geração Z não entenda por completo, pois aborda uma infância mais próxima daqueles que viveram os anos 90 e 80, esses sim poderão ter um sentimento nostálgico incrível. O protagonista tem um brilho próprio e atrai pessoas boas, uma família que ele escolheu, vencendo preconceitos e fazendo sua família entender que essa é sua felicidade, ser livre e feliz do jeito que ele é, é uma metáfora muito clara ao que o grupo LGBTQIAPN+ vive, porém o filtro Disney não permite explorar esse tema de forma completa, fica no clichê do “entendedores entenderão” e nos deixa questionando até quando teremos queerbating ou mensagens subliminares em vez de algo claro e sem medo de críticas, não apenas focado em se apoiar em um ambiente seguro.

 

 

Formado em cinema de animação, faço ilustrações, sou gamer, viciado em reality shows, cultura pop, séries e cinema, principalmente terror/horror

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