Nota
Em maio de 1940 a ilha da Inglaterra estava prestes a ser derrotada pelos Alemães, e a Batalha de Dunquerque estava matando vários dos soltados ingleses enviados para a guerra. O caos e o medo da invasão só fazia crescer entre o povo britânico e em decorrência da pressão da oposição, o então atuante primeiro-ministro renunciou e entrou em seu lugar Winston Churchill, que passa a enfrentar mais pressão ainda do parlamento, não apenas pelo estado em que a nação se encontrava, mas também pelo seu jeito, digamos, peculiarmente tempestuoso. Eis que a situação política entra num impasse quando membros do partido do primeiro-ministro e da oposição insistem num acordo com Hitler para estabelecer o estado como parte do Terceiro Reich, enquanto Winston se opõe a qualquer ideia de rendimento ou negociação.
Joe Wright, diretor dos elogiados Orgulho e Preconceito (2005) e Desejo e Reparação (2007), mas também do péssimo Peter Pan de 2015, teve para O Destino de uma Nação a decisão perfeita de escalar o ator britânico Gary Oldman para encarnar o Churchill – talvez “incorporar” soe mais adequado –, e como já era de se esperar, é dele o maior triunfo do filme. A figura de Churchill é, em si, verdadeiramente fascinante e parece estar em alta, já que foi explorada recentemente no filme Churchill (2017) e na primeira temporada da série The Crown (2016), mas é com Oldman que ela ganha, de fato, vida própria: modos autoritários e manipuladores, manias de uísque de manhã e charuto a quase toda hora, um senso de humor cruel e uma energia que assusta inclusive ao Rei George VI – nada disso passa imperceptível pelo ator, que faz de cada embate no gabinete uma inflexão interpretativa mais e mais interessante de acompanhar.
Esse impacto no centro da atuação dá a O Destino de uma Nação um nível de engajamento muito raro em filmes históricos; a plateia está tão hipnotizada com a caracterização daquele personagem e tão interessada em entender o raciocínio estratégico dele que é praticamente impossível ficar indiferente. Os ágeis e muito bem escritos diálogos ajudam a tornar a narrativa acessível sem parecer didática e são eles, deve-se dizer, o que conta a história aqui (toda a parte envolvendo a batalha de Dunquerque e a guerra em si é retratada de relance em belíssimos planos-sequência, diga-se de passagem).
Mas não dá para creditar apenas a interpretação central do biografado e a eficiência do texto, porque tudo isso só funciona porque a direção de Joe Wright se mantém sóbria, competente e surpreendentemente cheia de pulso; sua assinatura nunca foi das mais reconhecíveis devido à quantidade de elementos de cinema clássico/tradicional que ele recolhe e, nesse sentido, O Destino de uma Nação não é diferente, e nem por isso se torna menor. A maneira como a câmera caminha entre os corredores e cômodos no espaço majoritariamente fechado é vigorosa e energética, o que ajuda o filme a superar, por exemplo, suas constantes desaceleradas no crescendo na narrativa, que horas parece engrenar para algo maior e cai sutilmente, subindo de novo em seguida (a personagem de Lily James é uma dessas promessas de primeiro ato que nunca se cumprem).
O ato final é o único momento em que a direção de Joe Wright parece ter cedido à tentação de satisfazer demais o público com um corte redondinho, e fica a sensação de que faltou algum impacto real além do letreiro que sobe antes dos créditos. Ressalvas à parte, ainda é de se admirar quando um cineasta não muito pessoal consegue entregar um filme todo prontinho e bem orquestrado para que um grande ator e um grande personagem se tornem um só, e consiga fascinar e entreter simultaneamente.