Crítica | Sra. Harris Vai a Paris (Mrs. Harris Goes to Paris)

Nota
4

“Vou comprar um vestido. Um Christian Dior, de Paris.”

Ada Harris é uma empregada doméstica viúva em meio à década de 1950, mas sua vida acaba mudando completamente quando ela se apaixona por um vestido Dior de uma de suas patroas, a fazendo se dedicar a juntar dinheiro para conseguir viajar a Paris e conseguir um vestido de Christian Dior só pra ela. Dedicada e cativante, Sra. Harris começa sua jornada usando todas as suas forças para realizar seu novo sonho, sacrificando cada segundo do seu dia para ganhar mais dinheiro, dando todo o seu esforço físico e mental para chegar ao Dior, e presenciando momentos históricos acontecerem ao seu redor enquanto busca pelo tão desejado vestido de grife.

Baseado no livro de 1958, escrito por Paul Gallico, a dramédia histórica dirigida e produzida por Anthony Fabian é uma encarnação realista da alegoria, que já está arraigada na cultura popular, da gata borralheira que sonha em se tornar a Cinderela, é a história de uma senhora de seus 40 anos que vive de uma renda baixa e possui um coração de ouro, mas que acaba se apaixonando perdidamente por um vestido, um desejo que transcende a fúria consumista e se transforma na sede pelo status que aquele vestido representa. Deixando praticamente de lado um desejo por um príncipe encantado, deixando a vida amorosa da viúva em último plano, o filme é completamente guiado pela busca de Ada por possuir um traje exclusivo, para usar nem que seja por uma noite e poder voltar para o batente no dia seguinte. Carregado com a doçura de sua protagonista, o roteiro de Fabian, Carroll Cartwright, Keith Thompson e Olivia Hetreed consegue se sustentar pela forma como mostra a dificuldade de Ada extrapolar as aparências e provar que o dinheiro suado de uma doméstica vale tanto quanto o de qualquer socialite.

No papel da Sra. Harris, Lesley Manville prova toda a competência que lhe garantiu o Oscar em Trama Fantasma, toda a bondade, simpatia, honestidade e humildade da personagem parecem o combustível perfeito para fazer o enredo funcionar, mesmo que comece lento e cansativo, mas é com a chegada em Paris que a evolução de Ada vai mais longe, mostrando a forma como ela cativa a todos onde passa, tocando no coração de muitas pessoas dentro da Casa Dior e nos proporcionando ir mais fundo nas histórias das pessoas, principalmente NatashaAndréClaudine Colbert. Falando em Claudine, o papel ranzinza e antagonista desempenhado de forma contida pela maravilhosa Isabelle Huppert é essencial na trama, Claudine é um ótimo contraponto para Ada, ela é o braço direito de Dior e comanda a Casa, mas ela tem muitas camadas escondidas por trás de sua rispidez, que acabam sendo balançadas pela alegria contagiante da doméstica. A Natasha de Alba Baptista é outra forma do roteiro de abordar sobre irmos além das aparências, a modelo da Dior é tudo menos fútil, ela está afundada pela banalidade de suas funções, sendo resumida a sua beleza e se remoendo por dentro com todo o conhecimento e dilemas que carrega, principalmente por seu interesse profundo em grandes livros de filosofia e  a forma como os questionamentos dos livros parecem perfeitos para força-la a rever suas escolhas de vida.

Carregado de uma critica social explicita, Sra. Harris Vai a Paris surge como uma quebra de padrões num período em que as salas de cinema estão cheios de filmes de heroísmo, com uma trama que se encaixa perfeitamente com a época em que se passa e deve ser assistida de coração aberto. Trazendo a história pela primeira vez para os cinemas, o longa aquece nosso coração e nos diverte enquanto planta em nossas mentes uma semente de que tudo é possivel, sem grandes pretensões, nos levando a uma viagem entre os altos e baixos da vida de sua protagonista, algo tão real quanto palpável. Com uma narrativa simples, Fabian vai construindo uma fantasia que explora os desejos presentes em qualquer classe social e racial, os sonhos que movem o mundo e que ajudam a construir as pessoas, é nesse patamar que encontramos Sra Harris, uma mulher que descasca suas camadas ao mesmo tempo que se impõe a enfrentar todos os obstáculos para ter seu vestido, transpondo ate suas condições sociais e até etárias, e mudando a vida de várias pessoas no caminho.

“É o que somos, Vi. Mulheres invisíveis.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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