Crítica | Terrifier

Nota
3

Há um tipo de terror que não pede contexto ou lógica, apenas um convite à inquietação e à repulsa. Nesse gênero, não há necessidade de narrativas elaboradas ou complexas motivações para os vilões; o que importa é a imersão na atmosfera de medo e repulsa. Essa abordagem se destina a provocar a audiência não com histórias, mas com imagens e sensações brutais, testando até onde o público consegue suportar o grotesco. É nesse cenário de horror extremo que conhecemos Art, uma figura que redefine os limites do pavor ao se aproximar do absurdo, desafiando qualquer expectativa de conforto.

Terrifier, dirigido por Damien Leone, é um mergulho brutal no terror slasher que se apoia em um estilo visual grotesco e perturbador, focando mais no espetáculo do que na narrativa. Lançado em 2016, o filme nos apresenta o icônico Palhaço Art (David Howard Thornton), uma figura de pesadelos que rapidamente se tornou um símbolo do terror pela sua ausência de lógica ou razão. Diferente de outros assassinos icônicos, Art não possui uma motivação ou um passado explicado; ele é simplesmente o terror encarnado, um agente de caos que não hesita em explorar os limites do sofrimento humano.

A trama é bastante simples: duas amigas, Tara (Jenna Kanell) e Dawn (Catherine Corcoran), após uma noite de Halloween, se veem em uma situação aterrorizante quando encontram Art. A partir daí, o filme se transforma em uma sequência de cenas de violência extrema, onde o enredo parece menos importante do que a construção de cada assassinato, elaborado com uma precisão quase cirúrgica e sem qualquer intenção de poupar o público dos detalhes mais sórdidos. Para fãs do gênero, essa abordagem pode funcionar como um atrativo, mas mesmo os mais acostumados ao slasher podem achar que Terrifier ultrapassa o limite entre o horror legítimo e o grotesco gratuito.

Visualmente, o filme é audacioso e desafiador. A paleta de cores frias e a fotografia escura criam uma atmosfera de abandono e vulnerabilidade, enquanto os efeitos práticos, usados com um detalhismo cru e explícito, capturam cada gota de sangue e cada expressão de desespero das vítimas. É um trabalho que relembra o horror visceral dos anos 80, mas com uma intensidade que dificilmente seria encontrada em produções mais comerciais. No entanto, em vez de construir suspense ou atmosfera, a estética grotesca é empregada de forma a chocar repetidamente, o que pode acabar esvaziando o impacto do terror, tornando-o monótono e repetitivo.

David Howard Thornton, como Art, faz um trabalho eficiente ao transformar o personagem em uma ameaça verdadeiramente aterradora. Sua performance mímica e o sorriso perturbador conferem uma autenticidade assustadora ao palhaço, que consegue ser mais perturbador quando está imóvel do que em ação. Entretanto, essa representação de terror absoluto também tem suas limitações. Art the Clown não é um personagem que evolui ou que cria qualquer tipo de conexão com o público, o que limita o impacto emocional do filme. O espectador se vê observando a violência de forma quase impassível, sem um ponto de apoio emocional ou uma narrativa que o conduza.

Leone parece apostar que a intensidade visual de Terrifier bastará para prender o público, mas a ausência de profundidade ou complexidade narrativa transforma o filme em um exercício de violência sem propósito. Em vez de desenvolver uma tensão crescente ou um desfecho surpreendente, ele parece preocupado apenas em ir mais longe na exploração visual do sofrimento, o que torna o filme mais exaustivo do que satisfatório.

No entanto, é inegável que Terrifier possui um apelo específico, especialmente para fãs de terror extremo que apreciam um espetáculo visual sem censura. A sensação de desconforto é constante, e o filme cumpre seu papel de inquietar o público. Ainda assim, para aqueles que procuram uma experiência de terror mais equilibrada, que una o medo ao suspense e à narrativa, Terrifier pode decepcionar, parecendo mais uma exibição de efeitos práticos do que uma história de horror genuína.

Com uma premissa básica e um apelo restrito ao grotesco, Terrifier não é um filme para todos. Ele é, acima de tudo, uma celebração da violência gratuita, onde o terror se traduz em cenas explícitas e um desinteresse por qualquer outro aspecto da construção narrativa. No fim das contas, o impacto depende de quão longe o espectador está disposto a ir em uma experiência que valoriza o choque acima de qualquer narrativa ou desenvolvimento de personagem. Embora a estética excessivamente grotesca possa alienar uma parte da audiência, o filme sabe onde deseja ir — e chega lá sem hesitar, entregando ao público cenas que são tanto uma provocação visual quanto um teste de resistência.

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *