Nota
A violência gráfica sempre esteve presente no gênero do horror, mas poucos filmes se comprometem a ir tão longe quanto aquele que traz um palhaço assassino como sua figura central. A expectativa não é a tensão psicológica ou o medo sugerido; aqui, o terror é explícito, desenhado em cenas detalhadas de dor e mutilação. O que você sente não é uma leve inquietação, mas um choque visceral, uma experiência que testa os limites daquilo que o espectador pode aguentar. Há uma sensação de que, em cada nova sequência, o diretor tenta encontrar um limite, uma linha que ele pode atravessar e fazer o público recuar, mas será que ele encontra?
Em Terrifier 2, a sequência do infame slasher de 2016, o palhaço Art retorna para transformar novamente a tela em uma verdadeira galeria de horrores. Diferente do primeiro filme, que já se destacava pelo tom cruel e pelo uso abundante de gore, o segundo leva a violência a outro patamar. Se antes já havia quem torcesse o nariz para a brutalidade gráfica, agora o filme se estabelece de vez como uma obra que aposta no grotesco sem desculpas. Ao longo de suas duas horas e vinte minutos, o espectador é bombardeado por uma violência que ultrapassa o usual do gênero, com mortes coreografadas com precisão quase artística, mas não sem perder de vista o desconforto físico que elas causam.
O filme segue a adolescente Sienna (Lauren LaVera), que se vê no caminho de Art, o palhaço assassino. O enredo, no entanto, não é o ponto focal aqui, e sim o pano de fundo para a exibição de uma violência desmedida, explorada de forma quase caricata. A trama parece funcionar apenas como um fio condutor para que o diretor Damien Leone possa mergulhar mais fundo em seu show de horrores. Embora Sienna ofereça uma certa profundidade emocional em meio ao caos, não há como negar que ela e os outros personagens existem em grande parte para serem vítimas de Art, que novamente é brilhantemente interpretado por David Howard Thornton.
Visualmente, Terrifier 2 é um banquete para os fãs do gore. As cenas de assassinato não são apenas brutais; elas são prolongadas, detalhadas e, em muitos momentos, parecem existir apenas para desafiar o público a continuar olhando. O uso de efeitos práticos é impressionante, e o trabalho meticuloso em cada ferida aberta, cada membro dilacerado, é um testemunho do compromisso de Leone com o impacto visual do horror. No entanto, essa abordagem visual explícita acaba, por vezes, parecendo gratuita, ultrapassando o limite do necessário para contar a história e se tornando um espetáculo do grotesco pelo grotesco.
É importante destacar que Terrifier 2 não é para todos. Sua proposta é clara: perturbar, chocar e provocar reações físicas com sua violência exagerada e visceral. O filme não faz concessões para um público mais sensível, e sua natureza gráfica é, ao mesmo tempo, seu maior trunfo e sua maior fraqueza. Há quem veja na abordagem brutal uma crítica ao próprio gênero, uma exploração da fascinação do público pelo sofrimento alheio. No entanto, para outros, a violência gratuita pode ser um motivo para questionar se há substância além do choque.
Apesar de suas sequências chocantes, o filme possui uma aura quase nostálgica. Ele evoca o espírito dos slasher movies dos anos 80, onde o sangue era derramado em baldes e o assassino tinha um certo carisma perturbador. No caso de Art, seu silêncio e expressão grotesca criam uma figura que mistura o bizarro com o amedrontador. Ele não é um vilão que corre ou persegue, mas sim um que se diverte com o sofrimento de suas vítimas, tornando-o ainda mais aterrorizante. Essa indiferença em relação à dor humana é o que torna Art uma figura tão marcante no horror contemporâneo.
Ao mesmo tempo, o filme falha em se equilibrar entre o gore e uma narrativa envolvente. As subtramas sobre o passado de Sienna e sua ligação com Art são mal desenvolvidas, e o que poderia ter sido um arco narrativo interessante acaba se perdendo no meio da carnificina incessante. Isso faz com que o filme, em alguns momentos, pareça arrastado, estendendo-se mais do que o necessário para mostrar a próxima morte.
Terrifier 2 é uma obra feita para os fãs mais devotos do horror extremo, aqueles que buscam uma experiência visual que os tire de sua zona de conforto. É uma celebração do grotesco que desafia o espectador a continuar assistindo, mesmo quando o estômago pede o contrário. Para os que buscam um slasher de impacto, o filme entrega exatamente o que promete: sangue, violência e uma sequência de imagens perturbadoras que vão ecoar na mente por algum tempo.
Victor Freitas
Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.