Depois de uma viagem profunda pela carreira de James Wan, que tal seguir com as postagens especiais que irão homenagear grandes cineastas do terror moderno com um nome que, apesar de ter um currículo bem curto, já conseguiu garantir sua estrela na calçada da fama do terror da atualidade, Ari Aster.
Nascido em Nova Iorque, em 15 de julho de 1986, Ari Aster é um diretor de cinema, roteirista e produtor nascido de uma família judia, sendo sua mãe uma poetisa e seu pai um músico, ele possui um irmão mais novo. Com quatro anos Aster assistiu seu primeiro filme, Dick Tracy (1990), um longa que possui uma cena onde um dos personagens dispara uma arma Tommy em frente a uma parede de fogo, uma cena que, segundo Aster, o fez pular da cadeira e correr por seis quarteirões da cidade de Nova York enquanto sua mãe tentava pega-lo. Ainda em sua infância, a família de Aster se mudou para a Inglaterra, onde seu pai abriu uma boate de jazz em Chester, no condado de Cheshire, voltando para os EUA, em Albuquerque, Novo México, quando ele tinha 10 anos. Com 12 anos, Aster começou a desejar se tornar roteirista, chegando a escrever seus seis primeiros roteiros de longa-metragem ainda durante o ensino médio. Foi durante esse periodo que Aster começou a ficar obcecado por filmes de terror, frequentando as locadoras locais até esgotar a seção de terror de todas as locadoras que conhecia, criando um desejo por mais filmes que ele não encontrava, e que acabaram o motivando a escrever mais roteiros, dos filmes que ele sentia que queria ver.
Em 2004, Ari Aster se matriculou na College of Santa Fe, onde começou a estudar cinema enquanto escrevia para a Weekly Alibi , um jornal semanal de notícias, artes, cultura e entretenimento do Novo México. Em 2008 ele se formou na Santa Fe, quando dirigiu seu primeiro curta Herman’s Cure-All Tonic, produção de 12 minutos, protagonizada por Guy Perry, com roteiro de Anayat Fakhraie e focada em um farmacêutico que, enquanto vende um produto emblemático inventado por seu pai, enfrenta pedidos obsessivos, críticas severas de seus clientes e a pressão vinda de seu pai por seu comportamento raivoso e desprezível. O curta, que teve um orçamento de mil dolares, se destaca ainda mais para nós, brasileiros, por a farmácia cenário ter, como trilha de fundo, um instrumental de Garota de Ipanema, de Tom Jobim, tocando. Posteriormente, em 2010, Aster foi aceito no programa de pós-graduação do American Film Institute (AFI), onde completou um Mestrado em Belas Artes com foco em direção, onde estudou com Alejandro de Leon e Pawel Pogorzelski. Seu trabalho de conclusão foi o curta The Strange Thing About the Johnsons, de 28 minutos, protagonizado por Billy Mayo, produzido por de Leon, com direção de arte de Pogorzelski e que posteriormente exibido em festivais de cinema, sendo lançado em 22 de janeiro de 2011 no Slamdance Film Festival. O drama sombrio com toques de terror doméstico foi concebido enquanto Aster discutia tabus com seus amigos, incluindo Brandon Greenhouse, que se tornou um dos protagonistas do curta, ele narra sobre laços pertubadores de família abordando abusos, incesto e tabus, mostrando o inicio do interesse do diretor em abordar o bizarro e inusitado em suas produções. O longa, apesar de abordar uma temática sensível e polêmica, chamou muita atenção, chegando a viralizar depois que vazou online em novembro de 2011. Um dos curtas mais rejeitados de Aster foi lançado pouco tempo depois, TDF Really Works, um vídeo de 2 minutos que é um falso anúncio do dispositivo “Tino’s Dick Fart” (que dispensa explicações).
No mesmo ano Aster lançou Beau, de 7 minutos, curta focado na história de um homem neurótico de meia-idade que passa a ser assombrado por uma cadeia de eventos perturbadores cada vez mais sinistros, novamente protagonizado por Mayo. Com 17 minutos, Munchausen (2013) é o terceiro curta roteirizado e dirigido por Aster, nele vemos a história de uma mãe superprotetora, interpretada por Rachel Brosnahan, que, com medo de enfrentar o desgosto de ver seu filho ir para a faculdade, resolve atrasar sua partida deixando-o doente, mas acaba indo longe demais e não consegue mais reverter o que fez. O roteiro foi inspirado nos filmes da Pixar, principalmente na comovente cena de abertura de Up, e as gravações foram financiadas através de uma campanha de crowdfunding iniciada em 2012 e que arrecadou 16.175 dólares. O curta foi lançado, ainda inacabado, durante o Fantastic Fest em 23 de setembro de 2013, e depois em uma exibição limitada no American Film Institute em 27 de junho de 2014, sendo, por fim, lançado globalmente pela Vice Shorts em 21 de fevereiro de 2015. Ainda em 2013 veio Basically, um curta de 15 minutos também protagonizado por Brosnahan, dessa vez focado em uma jovem atriz brilhante mas ácida, que conduz o público através das dificuldades de sua vida privilegiada em uma série de quadros clínicos. Em 2014 foi a vez de The Turtle’s Head, curta de 12 minutos focado em um detetive idoso, misógino e desprezível, se tornando uma bizarra comédia noir que zomba dos charmosos protagonistas sexistas do movimento através de um protagonista que é uma caricatura grotesca alimentada por um desejo sexual anacrônico, ele é considerado como o trabalho que melhor expões o tom para o estranho senso de humor de Aster.
C’est La Vie (2016) é outro exemplo do humor negro de Aster, a trama de 8 minutos explora uma espécie de diário de viagem apocalíptico pelas ruas de Los Angeles, onde um sem-teto agressivo repreende o espectador em relação às circunstâncias de sua vida e ao erro de tudo. Um perfeito complemento de Basically, esse curta aborda a mesma dinâmica de intereração com o público enquanto o protagonista expõe a verdade sobre o declínio da civilização e da sociedade como conhecemos. Foi com seus curtas, principalmente The Strange Thing About the Johnsons e Munchausen, que Aster acabou chamando a atenção da A24, produtora que acabou o acolhendo e comprando o primeiro longa-metragem do cineasta, um filme que ele descreveu como tragédia familiar que girava em torno da artista de miniaturas Annie Graham, e que no decorrer do desenvolvimento passava a se transformar em um pesadelo completo. Foi assim que nasceu Hereditário (2018), um filme cuja protagonista interpretada por Toni Collette trazia diversos traços em comum com a protagonista de Rachel Brosnahan em Munchausen, que trazia influências, como o próprio Aster assumiu, de Carrie (1976) e O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante (1989) e que buscava abordar tramas da dinâmica familiar como trauma e luto. O roteiro do filme foi inspirado no incidente real que aconteceu em Marietta, Geórgia, em 2004, onde John Kemper Hutcherson decapitou, acidentalmente, seu amigo de infância, Frankie Brohm, em um poste de telefone quando este colocou a cabeça para fora do veículo para aliviar os sintomas de sua embriaguez. Hutcherson seguiu dirigindo com o cadáver sem cabeça após o incidente e, enquanto o homem dormia, um transeunte notou o corpo de Brohm no veículo na manhã seguinte e notificou as autoridades.
Hereditário acabou sendo lançado no Festival de Cinema de Sundance em 21 de janeiro de 2018 e nos cinemas nos Estados Unidos em 8 de junho do mesmo ano. O filme ainda se envolveu em uma polêmica antes do lançamento quando, por um erro tecnico, seu trailer acabou sendo exibido em uma sessão de cinema para um público familiar, numa sessão com cerca de quarenta crianças, e criou um pequeno pânico no teatro. Após o lançamento, o longa foi aclamado pela crítica com a atuação de Toni Collette, recebendo ainda elogios especiais ao longa e arrecadando mais que oito vezes o seu orçamento, se consolidando como o filme de maior bilheteria da A24 em todo o mundo e sendo eleito pela Rolling Stone como o filme mais assustador de 2018. Não tardou para que Martin Karlqvist e Patrik Andersson, executivos da B-Reel Films, contatassem Aster para dirigir um filme de terror ambientado na Suécia, proposta que ele acabou rejeitando, pois sentia que não tinha como juntar Suécia e terror em alguma trama que funcionasse, até que o roteiro começou a se formar em sua mente e ele decidiu criar um filme focado em dois personagens que estão passando por tensões de relacionamento, criando um filme de rompimento vestido nas roupas de um terror folk. Conforme o próprio Aster falou, Midsommar – O Mal Não Espera a Noite (2019) foi inspirado em Um Romance Moderno (1981) para se tornar um tipo de “O Mágico de Oz para pervertidos”, sendo produzido pela A24 e lançado nos cinemas nos Estados Unidos em 3 de julho e, como seu antecessor, recebendo várias críticas positivas, principalmente à direção de Aster e o desempenho de Florence Pugh. Com uma bilheteria quase seis vezes maior que seu orçamento, o longa teve a versão do diretor, com 171 minutos, lançada na Film Society of Lincoln Center, como parte de programação do Scary Movies XII em 20 de agosto do mesmo ano, e Aster foi indicado ao prêmio de Melhor Roteiro no 29º Gotham Independent Film Awards.
Em 2021, Aster voltou para o mundo dos curtas se enveredando por um novo caminho, o de produtor executivo. Apoiando os chilenos Cristóbal León e Joaquín Cociña, Aster se uniu à equipe tecnica de Los Huesos, curta em stop-motion para o público adulto de 14 minutos lançado em 8 de dezembro de 2021 e que conta a história de uma menina que usa cadáveres humanos e invoca os espíritos de dois Secretários de Estado para um ritual de libertação do reino do Chile da sua herança feudal, curta que ganhou o Orizzonti Award de Melhor Curta-Metragem no Festival de Cinema de Veneza. Em fevereiro de 2021, a A24 anunciou a produção de um novo filme de Aster, um filme chamado Disappointment Blvd que trazia Joaquin Phoenix como protagonista, um filme que se inspirava no curta Beau, de 2011, que já tinha sido sido pré-roteirizado por Aster desde 2014, época que o rascunho vazou na internet. Posteriormente rebatizado de Beau Tem Medo, o longa lançado em 20 de abril de 2023 foi inicialmente definida por Aster como uma comédia de pesadelo, um “Senhor dos Anéis judeu”, como se tivessem entusiasmado um garoto de 10 anos cheio de Zoloft e o pedido para fazer as compras. O filme protagonizado por Joaquin Phoenix, ao contrário de seus antecessores, acabou não sendo o mesmo sucesso de bilheteria e crítica, tendo recebido criticas mistas e sendo considerado o material mais fraco do cineasta. Ao mesmo tempo, Aster voltou a atuar como produtor executivo em El padre bueno, curta espanhol de 15 minutos dirigido e roteirizado por Jorge Canadá Escorihuela. Lançado em 11 de março de 2023, o curta conta a história de um adivinho e pai de uma família que está afogado em dívidas quando recebe a missão de encontrar água. Em agosto de 2022, Ari Aster foi anunciado como produtor de um longa da A24, Dream Scenario, longa escrito e dirigido por Kristoffer Borgli, com Nicolas Cage, Julianne Nicholson, Michael Cera, Tim Meadows, Kate Berlant, Dylan Baker e Dylan Gelula no elenco. O filme estreou como filme de abertura do programa Platform Prize no Festival Internacional de Cinema de Toronto em 9 de setembro de 2023 e deve ser lançado nos cinemas mundiais em 10 de novembro de 2023.
Outra produção futura produção da A24 que terá Aster como produtor é Death of a Unicorn, comédia de humor negro escrita e dirigida por Alex Scharfman e que conta com Paul Rudd e Jenna Ortega como protagonistas. O longa é um dos poucos projetos da atualidade que têm autorização do Sindicato dos Atores (SAG-AFTRA) para continuar suas gravações, graças ao fato da A24 não ter laços com a Aliança dos Produtores de Filme e Televisão de Hollywood (AMPTP). Durante uma entrevista para o NY Times, Aster ainda revelou que seu próximo projeto, que se chamará Eddington, provavelmente deve ser um western que terá o envolvimento de Phoenix, mas não revelou se será produzido pela A24, já numa entrevista ao La Reppublica, da Itália, Aster revelou que o longa será ambientado em uma cidade fictícia de mineração de cobre no Novo México, durante a pandemia que assolou o mundo com a COVID-19, um faroeste revisionista com uma boa parcela de noir, como uma fusão de comédia sombria ocidental e filme noir. Em 2021 Aster ainda assinou um contrato inicial de TV com a A24, o que indica que a produtora e o cineasta podem criar séries juntos num futuro próximo. Apesar de possuir apenas três longas-metragens lançados, Ari Aster já é considerado por muitos como um dos mais promissores cineastas do terror hollywoodiano na atualidade, seus trabalhos demonstram uma solidez na direção e bastante inventividade em seus roteiros recheados de estranheza, o que torna impossivel notar o brilhantismo desse cineasta. Aster é muito vinculado ao fenômeno do pós terror, termo criado pelo jornalista Steve Rose, do The Guardian, para definir narrativas elaboras focadas nos horrores internos, obras que geralmente abordam críticas sociais, características pessoais, código moral ou ambientes diurnos para explorar o gênero, mas ainda é algo muito abstrato e limitativo, considerados por muitos como uma marginalização para alguns filmes de terror e visto até com certo preconceito.
FILMOGRAFIA DE ARI ASTER
Icaro Augusto
Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.