Resenha | Último Turno

Nota
5

“Sempre é mais escuro antes do amanhecer.”

Cinco anos após ser detido em uma tentativa fracassada de massacre, Brady Hartsfield, o diabólico Assassino do Mercedes, se encontra em um estado vegetativo, preso em uma cama na Clínica de Traumatismo Cerebral, mais conhecida como Balde. Segundo os médicos, qualquer coisa perto de uma recuperação completa é, no mínimo, improvável. Mas sob o olhar fixo e a aparente imobilidade, algo começa a despertar no quarto 217. Algo realmente maligno.

Enquanto isso, o detetive aposentado Bill Hodges trabalha em uma agência de investigação com sua sócia, Holly Gibney, a mulher que desferiu o golpe que apagou Brady. Mas, o convívio pacato dos dois é alterado quando eles são chamados a uma cena de suicídio que tem uma forte ligação com seu nêmesis. Algo tão macabro e terrível que pode ser o seu caso mais perigoso até então.

“Z-Boy quer conversar com você!
Você quer conversar com Z-Boy?
S N”

Quando iniciou essa trilogia, Stephen King tinha como objetivo navegar por águas diferentes do seu convencional, contando uma boa história de detetive que nos colocava não só na mente do protagonista como na do seu algoz. Mas, durante sua jornada, o autor regressou a seu modus operanti, sem perder a essência da nova dinâmica. Pois bem, dois livros depois, King constrói uma finalização para sua saga, demostrando um cuidado exemplar com um leve toque sobrenatural que tanto amamos em suas narrativas. Último Turno não poderia ter um nome melhor. Finalizando com maestria a história iniciada em Mr. Mercedes, a obra traz um ar de despedida, que nos acompanha desde a iniciação de sua narrativa até os momentos finais de sua construção.

King aproveita o conhecimento prévio do leitor para tirar o máximo de aflição em suas linhas, colocando cada peça em seu devido lugar enquanto prepara seu xeque-mate emocional, que nos deixa verdadeiramente entregues àquilo que ele nos apresenta. Cada singelo toque é friamente pensado para nos despertar uma tensão latente, que nos acompanha desde o seu prólogo, onde o autor faz questão de revisitar uma das cenas mais brutais da saga sob uma perspectiva diferente. Com capítulos curtos e bastante frenéticos, a obra não te deixa respirar, te jogando em cada evento como se não houvesse amanhã (e em muitas das situações, isso se mostra mais literal do que imaginamos). Como acompanhamos o ponto de vista de diferentes personagens, sabemos de muita coisa antes do protagonista, a ponto que, em certo momento, esperamos apenas a culminação das jogadas feitas, ansiosos para que o detetive chegue ao ponto que já descobrimos.

Mas, engana-se quem acha que essa escolha apaga o interesse na obra. Ao contrário, ele acende ainda mais nossa vontade de ver o embate que tanto ansiamos.
Boa parte disso está em seu antagonista, que retorna ainda mais terrível do que conhecemos. Brady surge mais sádico e maldoso do que quando o deixamos. Despertando com poderes macabros, o Príncipe do Suicídio consegue alongar suas garras em verdadeiros jogos mentais que, não só levam suas vítimas a beira do abismo, como as empurram de cabeça na direção da escuridão. Com um controle sobrenatural, o rapaz agora consegue possuir mentes alheias, o que desencadeia um plano de vingança que pode derrubar não só seus inimigos, mas toda uma cidade que o subjugou. Afinal, ele possui uma lista bem longa e pretende riscar cada um dos nomes que está ali presente.

Embora Hodges seja o seu contraponto, ele perde parte do protagonismo ao longo da trama. Não me entenda mal, sua trama ainda se mostra emocionante e cativante, mas, próximo de outros fatores, ele perde um pouco do seu brilho. Hodges passa por arcos de finalização, e sobre o peso de uma doença que o desabilita, ele encontra forças para seguir adiante. As dores constantes e o cansaço paralisante trazem uma urgência na resolução do seu novo caso, principalmente quando ele aponta para pendências que deixou ao longo da sua carreira e que precisam, mais do que nunca, estarem sanadas o quanto antes. Jerome é outro personagem que sofre com esse apagamento, sendo destinado a aparecer em momentos chaves apenas para não ser esquecido na trama. Uma pena, pois o personagem sempre possuiu um ótimo potencial que nunca foi totalmente explorado.

Mas, se dois terços do trio original se apagam, um verdadeiramente brilha. Holly é simplesmente divina nesse ultimo volume. Acompanhar a evolução que a personagem teve ao longo da trilogia é sublime, principalmente quando nos deparamos com toda a expertise e sagacidade que a personagem adquiriu com seus anos como detetive. Em muitos momentos, ela rouba o protagonismo para si, se mostrando alguém ainda mais interessante de acompanhar do que o próprio protagonista.

É importante lembrar que o livro aborda temas pesados que podem despertar gatilhos nos leitores, além de estar longe de ser uma leitura fácil. Embora seja uma obra de ficção, King deixa claro a alta taxa de suicídios nos Estados Unidos e ao redor do mundo, demostrando o cuidado que devemos ter ao abordar tais temas.
O livro ganha uma capa mais colorida e marcante, que condiz com a trilogia ao mesmo tempo que deixa seu impacto. O rio de sangue, repleto de peixes coloridos e com o esqueleto a mostra causam um desconforto fascinante, que nos convidam a conhecer seu conteúdo assim que os avistamos na prateleira. A tradução impecável da Regiane Winarski é outro ponto positivo, assim como a diagramação maravilhosa que a Suma apresenta no volume.

Sombrio e visceral, Último Turno tem como objetivo encerrar com chave de ouro uma trilogia bastante curiosa. Embora seja o mais próximo do mestre que conhecemos, a obra consegue apresentar um conteúdo único que nos deixa empolgados a cada segundo de sua trama. Não é a toa que a trilogia se mostre presente em tantas listas do autor, principalmente quando encaramos que o verdadeiro monstro é a maldade humana no fim das contas.

“Vou nadar, pelo mar, pelo tão lindo mar…”

 

Ficha Técnica
  Livro 3 – Trilogia Bill Hodges

Nome: Último Turno

Autor: Stephen King

Editora: Suma de Letras

Skoob

Preso em um espaço temporal, e determinado a conseguir o meu diploma no curso de Publicidade decidi interagir com o grande público e conseguir o máximo de informações para minhas pesquisas recentes além, é claro, de falar das coisas que mais gosto no mundo de uma maneira despreocupada e divertida. Ainda me pergunto se isso é a vida real ou apenas uma fantasia e como posso tomar meu destino nas minhas mãos antes que seja tarde demais...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *