Nota
“O que você esperava de um dia que já começou arruinado pelo k-pop? Eu odeio tudo que vem da Coreia!”
Carol é uma adolescente de 17 anos, filha de uma bailarina brasileira e um sul-coreano, mas depois que sua mãe morre e seu pai decide voltar à Coreia do Sul, a abandonando, ela escolhe negar sua ascendência rejeitando tudo que seja coreano, principalmente o K-Pop e o K-Drama. Mas sua vida, que já é uma constante jornada de superação, aceitação e autoconhecimento, começa a ficar mais caótica quando a tudo de origem coreana começa a ficar popular entre os adolescentes brasileiros, e piora ainda mais quando ela descobre que seu guarda-roupa é na verdade um portal mágico que conecta seu quarto ao apartamento do ACT, o mais famoso grupo de k-pop da atualidade, que está em hiatus. Como se não bastasse essa descoberta, Kyung-min, que está com um bloqueio criativo, decide se hospedar no seu quarto para mudar de ares e conseguir a inspiração necessária para escrever a tão esperada música do comeback do grupo, o que faz com que ele e Carol precisem conviver diariamente ao mesmo tempo que ela tenta esconder do resto do mundo a presença do k-idol em seu quarto e recebe periodicamente visitas de outros membros do grupo.
Criada por Andréa Midori, Alice Andreoli Hirata, Gabriel Jubé, Letícia Kamiguchi, Pedro Penna, Palas, Mariana Suzuki e Marina Esodrevo, Além do Guarda-Roupa é uma extremamente ousada proposta abraçada pelo HBO Max. O que aconteceria se o Brasil, conhecido por suas intensas e realistas novelas, resolvesse fazer um k-drama? Seria esse o pontapé inicial para o surgimento dos B-Drama? Talvez não tenha sido esse o pensamento do grupo de executivos quando resolveu unir a proposta extremamente dramática dos K-Drama com uma pitada brasileira, mas parece ter sido o resultado dessa jogada. Com o Brasil sendo o terceiro pais que mais consome doramas no mundo, era natural esperar que essa estética um dia pudesse ser absorvida e replicada em terras tupiniquins, e é justamente nesse ponto que Além do Guarda-Roupa surpreende, se não fosse pela presença de alguns atores brasileiros e a sincronia impecavel de alguns personagens falando português, ele poderia facilmente passar por um drama coreano, principalmente pela competencia exemplar do elenco coreano do filme. A série sabe fluir, mesmo tendo uma protagonista chata na maioria das vezes, ela explora questões de amor, amizade e raízes.
Sharon Cho comanda o desenrolar da produção como protagonista, tudo no enredo é focado em entendermos os traumas de Carol, o que a leva a negar suas origens e adiciona uma camada dramática à série, ao mesmo tempo que temos pequenos flashs da infância de Kyung. Apesar de a personagem não cativar o suficiente, é o female gaze quem dita o ritmo do show, cheio de olhares em camera lenta, filtros que suavizam a pele dos atores e aquele véu ludico que é marca registrada nas produções coreanas, tudo gira em torno do amor e da luta, divisando a proposta coreana da brasileira. Carol é filha de uma bailarina e sente muita culpa em relação à morte da mãe, algo que tenta expurgar ao lutar para ser uma bailarina tão boa quanto sua mãe, mas sofrendo com as dores do abandono e de como teve interferencia direta nos eventos que mataram sua mãe. Mas ao mesmo tempo que ela luta para se provar, ela encontra o maior obstaculo na dinamica de gata borralheira que vive ao ser explorada por sua tia, Regina, que passou a cria-la e a colocou para trabalhar no café da familia, sendo sempre rispida quando a sobrinha mostra interesse em seguir a carreira da mãe como bailarina, e sua prima, Luisa, que se acha uma empreendedora nata e faz diversas chantagens emocionais para levar Carol a fazer tudo que ela precisa para gerir seu K-Café. Mas o lado coreano da trama de Carol desflora como o triângulo amoroso que surge entre ela, o bad boy Kyung e o doce Dae-ho, dois melhores amigos que são opostos e acabam mexendo com o coração da garota.
A construção dos arquetipos acaba se tornando uma das bases mais fortes do desenrolar da trama. Kim Woo-jin (ex-integrante do Stray Kids) é quem ganha mais tempo de tela como o main dancer Kyung, líder do ACT, um garoto ranzinza, com ar de superioridade, que chega ao quarto de Carol tomando conta de tudo, incapaz de obedecer as regras e presunçoso o suficiente para se colocar num pedestal e julga-la, mas o que começa como uma tensão logo se transforma em uma amizade e começa a florescer como um amor. Kim Jin-kwon (membro do Newkidd) traz uma veia mais doce e sentimental para o grupo, surgindo como o all-rounder Dae-Ho, um compositor carinhoso que quer cuidar de seu melhor amigo e acaba despertando amor a primeira vista de Carol, sempre lutando para convencer a brasileira a acolher seu amigo e ajuda-lo na jornada para salvar o grupo. Yoon Jae Chan (do ex-duo XRO) interpreta Sang-Mok, o main vocal do grupo, ricaço de nascença e mega mimado, que apesar de ser o que menos se esforçou para estar ali, é um dos que mais valoriza o grupo. O grupo se completa com o ator Lee Min-wooka, interprete do main rapper Chul-Woo, com uma alma de artista e super antenado em outras culturas. O elenco ainda se completa com as participações do divertido Lucas Deluti no papel de Diguinho, o vizinho de laje de Carol e amigo de infância, que esconde do pai que é gay e tem um crush por Chul-Woo, da incrivel Júlia Rabello no papel da megera tia Regina, que passou a criar Carol depois que ela ficou sem os pais e acaba oprimindo a garota pelo rancor que guarda do balé desde a morte de sua irmã, da engraçada Sabrina Nonata, que no papel de Nayara vive a maior fã do ACT, que por conveniência do destino se torna grande amiga de Carol.
Leve e divertido, Além do Guarda-Roupa é uma bela combinação Brasil-Coreia, mostrando que não precisa ser oriental para fazer um bom dorama, apesar do problema com sua protagonista morna, a série compensa com seus outros personagens complexos, apesar da dinâmica Gata Borralheira que existe entre Carol e sua tia. Com direção geral de Marcelo Trotta e codireção de Paula Kim e Sabrina Greve, o show entrega, em seus dez episódios de cerca de 40 minutos, uma mistura interessante do melhor das produções brasileiras com a estrutura milimetrica das produções coreanas, temperando com um pouco de criticas leves ao lados sombrio de cada cultura ao mesmo tempo de que constroi uma trama divertidade e envolvente. O show ainda consegue trazer atores coreanos contracenando com os brasileiros, o que acaba entregando uma dublagem um pouco tosca, de uma forma natural, e quase nos faz relevar a presença de Pyong Lee num forçado papel de empresário da ACT.
“Quando duas pessoas que se gostam se encontram, tudo fica em câmera lenta”
Icaro Augusto
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Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.