Nota
“Pela família, a gente é capaz de qualquer coisa, não é? De matar e morrer.”
Depois de ter sido dada como morta e assumir a identidade de Janete, Verônica se dedica a tentar derrubar a máfia que surgiu no Orfanato Cosme e Damião, que promove abuso e corrupção, de onde saiu Anita e Brandão, mas sua investigação acaba a levando direto para a nova sede do esquema, o Orfanato Casa dos Santos, financiado pelo misterioso Ministro Matias Carneiro, o homem no comando de uma poderosa igreja e de diversos crimes. Agora que perdeu seu pai para a máfia e que descobriu sobre um misterioso chefão apelidado de Doum, Verônica se vê arrastada para o meio de uma teia de dramas familiares que envolve Matias, que usa sua igreja para abusar sexualmente e psicologicamente de mulheres que buscam cura espiritual, e cujas vítimas incluem sua esposa, Gisele, e sua filha, Ângela. Uma rede de investigações que a leva mais a fundo por trás da tenebrosa máfia envolvendo os orfanatos, em um perigoso esquema de tráfico e a aproxima da dedicada Delegada Glória Volp.
Depois de um primeira ano intenso, está na hora de Verônica derrubar de vez o que o Cosme e Damião começou. Uma mulher contra um sistema, essa é a verdadeira proposta que surge por trás da série, e Raphael Montes e Ilana Casoy entregam toda suas potências criativas para construir essa sequência. Renovada oficialmente em 10 de novembro de 2020, a série ganhou um segundo ano menor, composto por seis episódios, mas que acabaram tendo sua duração aumentada para 50 minutos, mas sem dimuir a intensidade da trama. Verônica se torna mais decidida nesse novo ano, passando por um processo de transformação em justiceira, longe de sua família, ela perde sua ancora (seu pai) e seu braço direito (Nelson), o que lhe dá um novo gás para se enfiar de cara limpa na sujeira de Matias e fazer de tudo para leva-lo para trás das grades. Com um claro aprendizado, a trama deixa de lado a ideia de multiplos plots paralelos e vai seguindo uma única estrada, mesmo que deixe claro que há varios caminhos investigativos para chegar ao mesmo objetivo: prender Matias.
Tainá Müller volta com tudo ao papel de Verônica, a furia e a meticulosidade surge impregnados em suas ações, apesar de as pessoas ao redor começarem a cairem muito facilmente. É palpavel a evolução da personagem, mesmo que ainda falte um pouco mais de cuidado em suas ações, e algumas conveniencias do roteiro acabem a beneficiando. O grande embate de Anita e Verônica, aguardado desde a primeira tempora, finalmente acontece, e é uma cena enxuta o suficiente para agradar os espectadores sem virar uma barriga na trama. Reynaldo Gianecchini surge com uma frieza interessante como Matias, ele é um líder religioso e parece ter um dom, algo que a trama deixa nas entrelinhas ao ponto de ficarmos em dúvida se acreditamos ou não nesse dom de cura, que ele usa através de um ritual, estuprando suas fiéis enquanto sua esposa assiste e o auxilia. Matias surge como uma figura controversa e incomoda, representando tantos casos de crimes encobertos pela fé, nos forçando a nos perguntar até onde um estupro pode ser perdoado pela fé. E é justamente por essas linhas pequenas da justiça que o trabalho de Verônica, novamente, fica dificil, como fazer esse homem ser preso? Como para-lo? É aí que surge a Ângela de Klara Castanho, uma vítima que não está completamente imersa no dominio de Matias, a brecha que Verônica precisava para derrubar o imperio de Matias por dentro, mas antes ela precisa fazer a menina enxergar o monstro que seu pai é.
A trama se fortalece ainda mais pelas tantas outras personalidades que constroem toda a jornada que envolve Verônica e Matias, mesmo que com menores tempos de tela. Camila Márdila entrega uma tensão clara na sua atuação, uma esposa submissa que guarda uma sombra no seu passado e, do seu jeito, tenta proteger a filha do marido, mas que age de forma tão discreta que nem a menina entende suas ações, mas é ela quem protagoniza uma reviravoltas mais surpreendentes do show em “Doúm” (2×06). Isabelle Nassar (Olga), Elisa Telles (Julia) e Pedro Caetano (Juiz Pedro Rossi) são apenas engrenagens em meio ao sistema criminoso de Matias, mas conseguem marcar o suficiente em suas poucas aparições, deixando claras suas personalidades, motivações e objetivos. Por outro lado, Ester Dias, que como a Delegada Glória Volp deveria assumir o co-protagonismo ao lado de Verônica, não consegue espaço na tela para se destacar, a trama insinua em vários momentos a existência de um passado sofrido da mulher ao tentar se enfrentar Matias, mas não aprofunda essa história o suficiente, deixando muito mais um ar de dúvida sobre a indole da delegada do realmente uma segurança, sem nos deixar saber qual seu real papel no rumo das coisas.
Apesar de melhorar muito seu enredo, a segunda temporada de Bom Dia, Verônica perde pontos quando o assunto é a transição do elenco. A jornada de Verônica, por escolha do roteiro, é marcada pela perda de pessoas importantes e a aproximação de outras pessoas essenciais para seu avanço, mas essa transição não funciona tão bem quanto se precisava, visto que a perda interfere muito na forma como Verônica precisa agir e as adições parecem não ser eficientes o suficiente para preencher a lacuna narrativa que surge. Muitos novos personagens surgem e, apesar de terem uma contribuição importante para a trama, em sua maioria não funcionam com a dinâmica de Verônica, precisando passar por todo um processo evolutivo até realmente funcionarem junto com a justiceira, o que prejudica meados da temporada. Não, isso não significa que a série deixou de ser boa e envolvente, mas a medida que a ação da série aumenta, ela vai perdendo sua realidade, abrindo espaço para o excesso de clichês e conveniências surgirem no roteiro, como o fato de Verônica estar se escondendo mas andar de cara limpa pelos diversos lugares, deixando um rastro amador demais considerando a proposta de crescimento que a personagem deveria ter alcançado. Extremamente pesada, chegando a evocar memórias de criminosos reais que nem vale a pena citar, a trama de Matias coloca o dedo na ferida da nossa sociedade e ainda consegue criar uma conexão plausivel com Brandão, serial killer que antagonizou a primeira temporada, e deixar um empolgante cliffhanger para a terceira temporada.
“Unha, carne e sangue”
Icaro Augusto
Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.