Nota
“Confesso que rolou um arrependimento de quando eu falava que queria ficar em casa fazendo nada.”
Em plena pandemia, todo as medidas de segurança e o confinamento podem ser enlouquecedores, e é isso que Murilo está descobrindo a cada dia que passa. Trancado sozinho em seu apartamento, Murilo precisa lidar com o ‘novo normal’, aprendendo a cozinhar para si próprio, as vezes pedindo comida e tendo que planejar diversas formas de higieniza-las, mas sempre tendo que conviver com os conselhos paranóicos de sua mãe, Marilia, que acredita em tudo que recebe no Whatsapp, e com a sua vizinha super-higiênica, Adelaide, com quem compartilha as situações mais tensas da quarentena, tudo isso enquanto pede uma ajuda ou outra de Dalva, sua diarista que, de sua casa, ajuda Murilo a entender como se virar com higiene e compras de casa sozinho.
Diário de um Confinado é um inusitado projeto da Globoplay criado pelo ator Bruno Mazzeo e a diretora Joana Jabace, que são marido e mulher, convivem na mesma casa e tiveram a sorte de, em conjunto, terem todas as qualidades para criar um projeto de casa. Bruno, que é ator e roteirista, ficou responsável por protagonizar a série, já Joana, que é uma meticulosa diretora, fez com que a série rapidamente tomasse um ar de produção pré-pandemia, surpreendendo ao fazer a série não parecer nada com as ‘lives’ que já permeiam a quarentena. Além da dupla excepcional, o longa conta apenas com mais uma pessoa contracenando pessoalmente: Debora Bloch, que coincidentemente mora no mesmo prédio do casal e acabou sendo convidada para interpretar Adelaide. papel no qual a atriz dá um show de carisma.
Mas não é só o elenco presencial que faz a série funcionar, o show ainda conta com diversos outros nomes de peso, que surgem através de videos chamadas (em sua casa) interpretando os diversos outros personagens que fazem parte da antiga rotina de Murilo ou que entram na rotina de confinamento, em sua busca por interagir com o mundo. Temos a presença constante de três nomes de peso: Renata Sorrah, Fernanda Torres e Lázaro Ramos. Renata surge como a mãe paranoica do protagonista, o que completa o tempero humorístico que torna essa série tão espetacular; Fernanda vive a terapeuta Leonor, que junto a seu filho (Joaquim Waddington) mostra o quanto a insanidade da pandemia pode afetar até os profissionais da saúde mental; e Lázaro fecha o trio no papel do Dr Guilherme Lemos, que passa a ser incomodado a todo momento por um Murilo praticamente hipocondríaco, imaginando que cada sintoma que sente pode ser uma indicação de ter contraído o Covid.
O elenco ainda conta com as diversas participações, como é o caso de Lúcio Mauro Filho que interpreta Serginho, um amigo de Murilo que surge em algumas conversas com ele e até faz aniversário durante a quarentena, nos levando a refletir sobre as vergonhosas festas online, que se tornam um tédio cheio de vergonha alheia rapidamente; Dandara Mariana, Luana Martau e Luciana Paes, aparecem interpretando Tati, Marcinha e Viviane, três garotas que Murilo flerta quando entra em grupos de paquera online, nos remontando à complicada situação dos solteiros, que resolvem buscar um namoro online; Arlete Salles entra na trama como a Tia Rita, a tia rica de Murilo que é chamado pelo homem quando ele precisa de algumas dicas culinárias, gerando um verdadeiro caso de família online numa videochamada conjunta de Murilo, Rita e Marilia.
Marcos Caruso faz uma participação na trama como Leopoldo Quaresma, o sindico do prédio de Murilo, que surge no episódio que nos leva a refletir sobre a dinâmica da vizinhança em meio ao confinamento e sobre a inexistência de desculpas para fugir da reunião de condomínio; temos ainda a inusitada presença de Matheus Nachtergaele, que mora num prédio próximo de Mazzeo e acabou cruzando com o casal numa gravação na rua, o que fez ele rapidamente ser convidado a participar da série interpretando Jayme, um conhecido qualquer que Murilo encontra na rua e nos leva a refletir a importância imensa que o encontro físico com uma pessoa conhecida pode ter para nossa sanidade.
O que torna a série tão engraçada é o simples fato de estarmos presenciando a realidade sendo representada na nossa tela, quase como se estivéssemos assistindo um reality show da vida real e não uma ficção, algo que todos vão se identificar imediatamente. Lembrando que, quem não se identificou, não está vivendo a quarentena de verdade. Com seus doze episódios de 10 minutos, o show lembra muito uma releitura do saudoso Cilada, tendo seu humor ainda mais potencializado pelas olhadelas de Mazzeo para a câmera, entrando no enredo para dar todo o tom de cumplicidade com o público, que no decorrer da trama não pode evitar se identificar com o personagem, e quebrando a quarta parede de uma forma sensacional, muito mais natural do que as cenas de conversas que Murilo tem com o público, mesmo que todo o conjunto da obra seja o diferencial que faz a série ter se tornado tão essencial. A pandemia segue com tudo, e mesmo com a flexibilização da quarentena, nunca é tarde para rir um pouco do nosso triste sofrimento.
“É estranho? É estranho. Mas o que é que não está estranho nesses tempos?”
Icaro Augusto
Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.