Review | Heartstopper [Season 1]

Nota
5

Charles Spring (Joe Locke) é um adolescente que teve tempos muito difíceis no Colégio Truham só para meninos, devido a vários ataques de bullying após descobrirem que Charlie era gay. Mas nesse novo início de ano ele se mantém confiante, já que ele tem uma amizade sólida com seus amigos: o cinéfilo Tao Xu (William Gao), o amante de livros Isaac Henderson (Tobie Donovan ) e a desenhista Elle Argent (Yasmin Finney), que saiu do colégio após se assumir trans, abalando um pouco a rotina dos seus amigos. Mas além das suas amizades, Charlie se sente confiante com seu relacionamento com Ben Hope (Sebastian Croft), que mesmo sendo escondido e servindo apenas para o Ben dar uns beijos antes da aula, ele sente que o Ben ainda vai conseguir sair do armário e assumir o relacionamento dos dois. Mas, o mais improvável acontece, quando ao ser designado a sentar ao lado de Nick Nelson (Kit Connor), uma amizade inusitada acontece: Nick, um atleta de rugby do colégio, poderia ser amigável com Charlie, o mesmo garoto que sofreu bullying inclusive por diversos membros do time de rugby? Após ficarem mais próximos, Nick acaba convidando Charlie a participar do time de rugby para tentar ajudá-lo a se enturmar com o resto do colégio, e mesmo relutante Charlie aceita o convite. Mas será mesmo que isso vai dar certo? Da série de quadrinhos de grande sucesso do site Tapas, escrito pela brilhante Alice Oseman, Heartstopper é uma série de grande sucesso da Netflix que promete deixar nossos corações quentinhos. 

Iniciado em 2016, Heartstopper é uma série de quadrinhos, que atualmente conta com 6 volumes, criada a partir de diversos outros livros da mesma autora que contam as histórias da irmã do Charlie, Tori Springs (na série interpretada por Jenny Walser), e posteriormente dando origem ao livro Nick and Charlie (2015), que deu origem a série de quadrinhos de grande sucesso. Durante o lançamento do sexto volume dos quadrinhos, em 2021, a autora anunciou a produção da adaptação na Netflix em formato de série, que levou a ansiedade de diversos fãs ao redor do mundo. Dirigido por Euros Lyn e com o roteiro adaptado para televisão pela autora Alice Oseman, Heartstopper contou com 8 episódios na sua primeira temporada, adaptando 3 capítulos da webcomic. Apesar de ser uma série adolescente, a obra de Alice Oseman procura uma abordagem diferente de outras séries da mesma temática, incluindo a forma de lidar com questões LGBTQ+, trazendo mais leveza mesmo com temas muitas vezes bastante pesados. As atuações de Heartstopper segue bastante o padrão das mesmas obras adolescentes da Netflix, sem grandes inovações para o gênero. O que realmente torna-se um destaque entre os episódios são as animações de reações, que se tornou muito característico de séries e filmes adolescentes, como é muito utilizado em filmes brasileiros, como Alice Júnior que se utiliza de animações simples como corações, raios e textos em neon para refletir os sentimentos dos personagens, o que condiz muito também com o contexto de Heartstopper, fazendo um link entre os elementos estéticos dos quadrinhos, só que dessa vez transportado para o live action.

A primeira temporada de Heartstopper foca bastante na auto descoberta enquanto LGBTs adolescentes. Ao contrário de outras obras do gênero, a série foge de estereótipos de sofrimento trazendo um ambiente mais acolhedor para os seus personagens, o que não quer dizer que não há conflitos na série, muito pelo contrário, mas que há uma complexidade muito maior em abordar outras questões além de apenas a violência LGBTQfóbica. A série se apresenta bem balanceada com relação ao seu material original, adaptando quase que fielmente os quadrinhos, em alguns momentos cena por cena e frase por frase. Mas a série se destaca mais do que os quadrinhos, tendo mais liberdade em aprofundar o desenvolvimento dos seus personagens secundários, em especial da Elle Argent. Elle, nos quadrinhos, se mantém distante dos meninos, até por ter mudado de escola, fazendo com que quase não haja desenvolvimento de sua história, o que não acontece com sua personagem na série. Muito bem atuada por Yasmin Finney, acompanhamos a Elle em seus primeiros dias na escola nova, descobrimos mais do seu passado no colégio antigo, assim como acontece com o Charlie, e temos diversos momentos das perspectivas de seus sentimentos, o que de fato não acontece nos quadrinhos e traz uma excelente representatividade trans, o que é importantíssimo especialmente em uma série adolescente. 

Além de Elle, outras duas personagens que são melhor exploradas na série são Tara Jones (Corina Brown) e Darcy Olsson (Kizzy Edgell), desenvolvendo não só o relacionamento das duas, que são personagens secundárias importantes especialmente nessa primeira temporada, mas também por trazer discussões importantes sobre a identidade das duas. Ainda assim, a série mantém o personagem do professor Ajayi (Fisayo Akinade) da mesma forma que os quadrinhos, sem muitos desenvolvimentos além do suporte emocional de Charlie e postergando de fato seus momentos de aprofundamento para a segunda temporada. A maior surpresa da série foi na verdade a adição de uma personagem não existente nos quadrinhos e que não está no núcleo principal de personagens, Imogen Heaney (Rhea Norwood), que serve como um conflito para Nick e Charlie, visto que a mesma nutre sentimentos por Nick e força bastante sua interação com ele, servindo como quebra de expectativas muitas vezes, mas que funciona bastante para a série, trazendo uma tensão que não existia nos quadrinhos. Outra surpresa foi a troca de personagens entre Aled Last pelo Isaac, que não só recebeu críticas dos fãs por ser um personagem querido pelo fandom que foi cortado, mas também por ter sido trocado por um personagem que perpetua estereótipos negativos para a comunidade assexual, visto que Aled é um personagem demissexual e Isaac foi confirmado como um personagem assexual, embora não tenha tido nenhuma desenvolvimento na primeira temporada. 

Heartstopper veio para agradar demais os fãs dos quadrinhos, mas também para conquistar muitos novos fãs, e tem todos os motivos para isso. A série que a princípio parece ser boba e de fácil resolução tem um desenvolvimento gradativo de temáticas, além de discutir com perfeição temas como sexualidade e gênero para o público infanto-juvenil. Com uma ótima representatividade no elenco, especialmente no elenco coadjuvante, Heartstopper dá um exemplo de como desenvolver casais aquilianos (entre dois meninos), casais sáficos (entre duas meninas) e também uma ótima representação trans com a personagem Elle.

 

Ilustradora, Designer de Moda, Criadora de conteúdo e Drag Queen.

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