Review | Reality Z [Season 1]

Nota
3

“Mortais de todo o Brasil, hoje tem sangue na Casa dos Deuses.”

O Rio de Janeiro segue normal, protestos por toda a cidade, gritaria na Assembleia Legislativa e um reality show que mobiliza a população para mais uma eliminação, poderia estar tudo normal na rotina caótica do Brasil se não fosse um detalhe: zumbis começaram a aparecer pela cidade e estão infectando os cariocas. Quando o apocalipse zumbi toma o Rio, os estúdios do Olimpo se tornam o único local seguro, onde Nina, produtora do programa, se une a TK, Augusto, Marcos, Verônica, Madonna e Cleide, os participantes que seguem confinados dentro do reality, para sobreviver, e onde Brandão, o diretor do programa, precisa aturar Jéssica, a última eliminada, ao mesmo tempo que precisa lidar com sua ganancia e se proteger de Divina, a apresentadora do programa que foi infectada.

Em outra área do Rio, Ana Schmidt, a arquiteta responsável por construir a casa do reality, está confinada em sua casa com seu filho, Léo, remoendo sua demissão e tentando sobreviver a seu novo status quo, criando um plano de como sobreviver a esse novo mundo, tentando chegar nos estúdios para conseguir abrigo e uma forma de pedir ajuda. Depois de fugir da Assembléia, onde era acusado de corrupção, o Deputado Levi resolve usar todo o seu poder para ditar as regras, convocando o Sargento Robson e Sargento Cardoso para defende-lo, e mostrando toda a tirania que um corrupto pode assumir num apocalipse, ao mesmo tempo que somos levados a presenciar uma incrível crítica à parcialidade policial. Cada um dos sobreviventes passa por uma intenso teste de sanidade, sendo levados ao extremo do seu psicológico, algo que nos é exemplificado quando Augusto e Verônica precisam matar uma amiga para sobreviver, ou quando Nina e TK se encontram com Policial Lopes e Policial Mello, que chegaram num nível de medo psicótico, que torna eles uma ameça a vida dos sobreviventes tão grande quanto os zumbis.

Reality Z é uma adaptação de Dead Set, minissérie criada em 2008 por Charlie Brooker, e tem o próprio Brooker na produção, assumindo o posto de nova produção de terror brasileira da Netflix, que chegou ao catálogo do streaming no dia 10 de junho de 2020. O reality representado na série lembra muito vagamente os moldes do Big Brother Brasil, algo que acaba sendo inevitável já que ele se baseia numa série do grupo Endemol (empresa dona dos direitos dos Big Brothers de todo o mundo) que era praticamente uma paródia do Big Brother UK. O grande problema do longa é justamente o fato de não ser uma ideia original, sem o apoio da Endemol, a produção perde completamente satirização do BBB, que é justamente o ponto alto da série original, e precisa se desenvolver com uma versão caricata (e vergonhosa) de um reality, que tenta se ramificar para outros temas brasileiros, criando uma visão completamente nova, horrível e degradante. Isso se torna ainda pior quando consideramos que os 5 primeiros episódios de Reality Z são extremamente fieis aos roteiros de Dead Set, o que faz com que as alterações do roteiro brazuca estrague completamente tudo de bom que tinha no original.

O reality vai fundo nos clichês, trazendo o bonitão homofóbico, a gostosa fria, o tiozão tarado, entre outros, que fazem a subtrama ser tão incomoda quanto as atuações de Sabrina SatoGuilherme Weber, que apesar de terem menos tempo de tela, são odiosos a ponto de se tornarem mais antagonistas na trama do que os próprio zumbis. A luz no fim do túnel chega na forma de Ana Hartman, a estreante que carrega a trama nas costas, tendo uma evolução surpreendente e o arco mais relevante dos dez episódios de cerca de 30 minutos, ao lado dela temos João Pedro Zappa, que como TK apoio muito bem o arco de Hartman, mesmo que seu personagem sofra quedas de personalidade decepcionantes. Com uma ascensão tardia temos Luellem de Castro, que inicia a série apagada, totalmente sem voz, mas, logo que recebe espaço, se mostra a cereja no bolo de empoderamento feminino, tomando as rédeas de sua narrativa e levantando questões polêmicas, munidas de uma crítica ácida, e transita entre assuntos como racismo, força policial e estupro. São Hartman e Luellem quem lideram a situação, imponto um protagonismo ilimitado, algo que nos surpreende ao percebermos que tão poucos se destacam numa série que traz Sato, Weber, Ravel AndradeCarla RibasEmílio de MelloJesus Luz Leda Nagle no elenco.

Trazendo uma nova reviravolta a cada dois episódios, o show brilha com a caracterização de seu principal elemento: os zumbis. Com uma maquiagem extremamente convincente, os monstros preenchem a tela com violência e destruição, sem brincar em serviço, nos agradando com o seu maravilhoso banho de sangue. Uma pena que a série não tenha o mesmo primor em todos os campos, como é o caso de sua trilha sonora, tão incoerente quanto inoportuna, não casando em praticamente momentos nenhum com as cenas que são empregadas, cooperando mais com o sentimento de arrependimento de ainda estar acompanhando esse disparate do que com uma imersão na trama. A direção de Cláudio Torres está mais para uma falta de direção, que nos deixa surpresos com o fato do filho de Fernanda Montenegro, que já trabalhou o roteiro e direção de clássicos nacionais como A Mulher Invisível e O Homem do Futuro possa estar mesmo trabalhando na direção e roteiro dessa série.

Junto com todo o fracasso de roteiro e atuação, outra coisa que choca na série é a sua morbidez. De uma hora para a outra, várias pessoas se veem obrigadas a se trancar, buscando abrigo e sobrevivência, algo que nos lembra bastante a pandemia de Covid, seria isso apenas um timing perfeito? Uma enorme coincidência? Seria de bom gosto estrear uma série que reflete tão bem o confinamento social num momento como esses? É terrível irônico o quanto a série parece se inspirar em nossa realidade, o vírus zumbi parece acometer o Rio assim como o Corona tomou o mundo, e a trama em volta do Olimpo nos lembra o que aconteceu com o BBB20, onde o programa seguiu, sendo considerado como o lugar mais seguro em plena pandemia, chegando até a ganhar alguns dias a mais pela boa audiência.

A arte parece ter imitado a vida até quando não pretendia, nos mostrando o quanto a mentalidade brasileira é clara nesse assunto, trazendo de uma forma ‘divertida’ uma reflexão à realidade, onde muitos insistem em sair da quarentena, onde a corrupção e arrogância consegue se sobrepor à contaminação, onde o racismo e o preconceito sobrevivem dentro dos piores cenários, e onde cada um dos ‘sobreviventes’ alcançam uma clareza surreal, tão obvia e ao mesmo tempo tão incomum.

“Não repitam os nossos erros.
Sejam melhores.
Sejam… Mais humanos.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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