Review | Sintonia [Season 1]

Nota
3.5

“Hoje é bailão acelera essa nave veloz // Quem tá é nós, quem tá é nós”

DoniseteFernandoRita são muito mais que amigos, eles possuem uma ligação mais forte que o sangue, eles são irmãos de vida e cresceram juntos enfrentando os mesmos problemas na favela, mas a vida as vezes muda as caminhadas e, agora, cada um precisa seguir o seu caminho, testando até onde a amizade deles pode resistir aos problemas que surgem. Donisete, ou melhor, MC Doni tem o sonho de virar cantor de funk, e tem o dom para tal, ele consegue fazer as rimas surgirem e escreve músicas excelentes, mas para chegar ao sucesso é preciso lutar e resistir a muitas armadilhas no mundo da música. Fernando, o Nando, está envolvido no mundo das drogas, ele faz parte da gangue de Badá e tem como objetivo de vida subir dentro da organização, mostrando ser capaz e inteligente o suficiente para fazer parte da elite do tráfico, o que faz Nando viver momentos que colocam em xeque sua dignidade várias vezes, mas que em certos pontos parecem ser a necessidade que a vida lhe mostrou. Já a Rita aprendeu desde nova a se virar sozinha, e é justamente nessa vida que ela se tornou ambulante em estação de metrô, mas o destino tira sua vida dos trilhos e só lhe resta achar proteção nos braços da igreja.

Sintônia é a nova produção nacional da Netflix, que chega no catalogo no dia 9 de Agosto de 2019, e parece mostrar uma trama muito mais caricata e fantasiosa do que realmente a favela é, dando uma impressão de que estamos vendo a típica “favela para gringo ver”, mas de certa forma, mesmo que sendo superficial, a trama não deixa de cumprir sua proposta. Com produção do Los Bragas, produtora da atriz Alice Braga, a série pega os três pilares principais da favela e os explora de todas as formas possíveis, apesar de vermos muito da trama religiosa parecer caminhar na corda bamba, chegando aos limites onde hora parece ser crédula, mostrando que a igreja explorada na série é séria e escrupulosa, mas certas partes incomodam por beirar a crítica, parecendo que estamos vendo uma série que quer criticar certas atitudes mas se segura (e muito) para não chegar a esse ponto. Por outro lado, os dois outros núcleos são tirados de letra pela direção de Konrad Dantas, mais conhecido como KondZilla, que utilizou toda a sua experiencia com a produção de funks para explorar o mundo de MC Doni e aproveitou toda a experiencia de ex-detentos para explorar o núcleo de Nando.

Quando o assunto é o elenco, volto a citar que Konrad teve a paciência, e ideia genial, de trazer atores formados dentro de um presídio paulistano para os papeis de fundo da trama, o que possibilitou mostrar a realidade dentro da favela através da exteriorização de experiencias próprias de cada um na hora de atuar, dando um tom mais real e sem grandes distanciamentos, além do compromisso, que é uma característica nata daqueles que estão querendo reconstruir sua vida após cumprir pena. Já no elenco principal temos Bruna Mascarenhas, atriz que foi escalada às pressas para interpretar Rita, mas vive a maior evolução dentro da série, passando por tantas camadas e tantos enredos que não tem como achar um defeito em sua atuação; Christian Malheiros que vive Nando, e parece ser o mais preso dentro da trama, algo que entra em contraste com o fato de o ator já ter recebido prêmios em festivais por suas atuações passadas, o Nando não consegue expressar bem o drama da vida no crime, o que faz o roteiro romantizar seus atos a um ponto que incomoda, enquanto o ator não constrói uma justificativa plausível; Por último temos João Pedro Carvalho, o MC JottaPê, um dos contratados do KondZilla que já fez sucesso na atuação durante a infância ao fazer parte da telenovela Chiquititas mas ressurge agora num papel maior e interpretando um personagem que parece ter sido criado perfeitamente para ele, mas que, em muitas cenas, não reflete realidade. A trama de Doni parece oscilar o tempo todo, ora temos ele como um sonhador e lutador, logo depois ele vira orgulhoso e irremediável, para em poucos minutos o vermos como egoísta e burro, e acabar nessa montanha russa de momentos que parecem ser uma eterna indecisão sobre a construção do personagem.

Com uma fotografia que consegue se manter, o show chega mostrando belas cenas da favela, conquistando com cortes aéreos, mas parece não saber aproveitar plenamente desse visual, começando a se repetir e escolher cenários que não engrandecem seu roteiro, roteiro esse que não contribui tão bem para o show, já que foca muito mais em criar três guerreiros a ponto de não conseguir desenvolver o impacto deles na trama e nem as consequências de seus atos (exceto no caso da Rita, que parece sofrer o tempo todo com as consequências de todos os atos). A trilha sonora da série é outro destaque do longa, e não tinha como não ser após ser deixada nas mãos do KondZilla, onde fica claro que numa trama que gira em torno do funk a melhor escolha é deixar a trilha com um dos maiores produtores de funk do Brasil. No fim das contas, os seis episódios de Sintonia constroem uma linha, impulsionam seus personagens até um ponto crucial e nos deixam na espera de saber se o show pode ter uma nova chance de seguir e explorar mais a fundo seu potencial ou se será mais uma produção Netflix que vai ser cancelada.

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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