Review | The Falcon and the Winter Soldier [Season 1]

Nota
4

“Aliados viraram inimigos. As alianças foram desfeitas. O mundo está quebrado.”

A batalha contra Thanos e o Blip afetaram dramaticamente o mundo inteiro. Com a volta dos mortos, a ONU criou o Conselho de Repatriação Global, um órgão mundial incumbido de ajudar às vítimas do Blip a reconstruir suas vidas, mas no momento que todo o suporte e os recursos foram destinados aos que retornaram, os que sobreviveram e já estavam passando dificuldades passaram a ser esquecidos, o que fez surgir os Ápatridas, um grupo terrorista liderado por Karli Morgenthau que busca dar valor aos que realmente precisão, uma facção que força Sam WilsonBucky Barnes a se unirem para combate-los, um grupo terrorista formado por pessoas que tomaram o Soro do Super Soldado ao mesmo tempo que o governo americano anuncia John Walker como o novo Capitão América, usando uma roupa semelhante à de Steve e o escudo que Sam entregou para o Museu do Capitão América.

Depois do enorme sucesso de WandaVision, é chegado o momento de viajarmos para um novo conteúdo original da Marvel Studios no Disney+, uma nova produção que foge completamente do caráter psicológico da série da Feiticeira Escarlate, mas que ainda consegue debater muito sobre a nova realidade do mundo pós-Thanos. Criada por Malcolm Spellman e dirigida por Kari Skogland, a série começa se concentrando na responsabilidade que caiu sobre os ombros de Sam após receber o manto de Capitão América no final de Avengers: Endgame, com todo o dilema social, moral e ideológico que ele não consegue enfrentar, mas logo nos leva adiante ao nos apresentar 3 novas linhas antagonistas. De um lado temos a América, sempre preconceituosa e querendo dominar o mundo, ela é representada por meio da parcial CRG, que está ajudando demais os retornados e marginalizando os refugiados, as mesmas pessoas que passaram os últimos 5 anos ajudando os países a se reconstruir, e há também a representação por meio de Walker, um soldado exemplar que esconde segredos obscuros, e que é um grande exemplo da corrupção que o poder pode proporcionar, o homem era uma figura de respeito, mas assumir o manto ilegitimamente começa a mexer com o psicológico dele e a transforma-lo, uma transformação que chega ao seu ápice quando ele perde uma pessoa muito importante, criando um colapso na identidade dele e a destruição de um símbolo.

“O poder só faz a pessoa ser mais o que ela é, não é?”

A segunda linha antagonista é representada pelos Ápatridas, um grupo que luta por justiça, que tem ótimas motivações, mas que acabou sendo corrompida pelo poder do Soro do Super Soldado. A série nos leva a conhecer Karli mais a fundo, começamos a entender sua causa, a apoia-la, ao mesmo tempo que vemos ela sendo transformada pela corrupção do mundo, ela sendo vilanizada pelos seus esforços de ajudar aos outros, mas é também nessa transformação que começamos a entender a garota, uma menina que foi vítima da sociedade e que tem um visão melhor de mundo, uma criança que foi destruída pela supremacia americana e acabou sendo forçada a virar uma suprematista para poder lutar de igual para igual. A terceira linha antagonista é a mais misteriosa, o Mercador do Poder, uma figura poderosa que existe nas sombras, a pessoa responsável por reativar os estudos sobre o Soro do Super Soldado, que conseguiu amostras do sangue de um antigo Super Soldado e incumbiu o Dr. Wilfred Nagel de estuda-lo e replicar a formula, o mestre por trás de marionetes poderosas que surge como um coringa, observando de cima a guerra entre os antagonistas que surgiram até então, e esperando o momento certo para atacar e mostrar sua verdadeira força.

A série é protagonizada, prioritariamente, por Anthony MackieSebastian Stan, que precisam lutar para se encaixar nesse novo mundo pós-Blip. O Sam de Mackie precisa entender os novos dilemas que sua família enfrenta, tendo que encarar o impacto que seu sumiço por 5 anos teve para a vida da sua irmã e seus sobrinhos, precisando se readequar aos novos serviços que um Vingador pode prestar e à crise financeira que sua irmã se encontra, sendo forçada a vender o barco da família pra saldar suas dividas. Já o Bucky de Stan passa por uma fase muito mais sombria, ele precisa se redimir dos crimes que cometeu como Soldado Invernal e lutar para se transformar no Lobo Branco, com um caderninho listando os nomes daqueles que o contrataram para que possa fazer justiça, tudo como parte de sua terapia obrigatória para conseguir o perdão completo do governo. A trama se completa com o John Walker de Wyatt Russell, um condecorado soldado das forças armadas americanas que tem um passado obscuro e tenta, a todo custo, honrar o legado de Steve Rogers, um legado para o qual nunca foi escolhido verdadeiramente para ostentar, um legado para o qual não está psicologicamente pronto para representar, um legado que nunca coube a ele assumir. Temos ainda a complexa Karli de Erin Kellyman, uma garota inocente que se deixa levar pela causa e pelo poder e começa a ser transformada no que há de mais obscuro na luta pela justiça, no lado mais negro do poder revolucionário.

Como se não bastassem as diversas pessoas envolvidas nessa guerra, a série vai mais a fundo no desenvolvimento do MCU ao expandir esse universo e evoluir tramas que haviam ficado na geladeira. Temos a volta, majestosa, de Daniel Brühl e seu Barão Zeemo, que encontramos em uma prisão em Berlim e acaba sendo um apetrecho necessário para Bucky e Sam na caçada pelo segredo de Karli, esse vilão desperta uma personalidade muito mais cativante, que aos poucos vai nos conquistando tanto quanto Loki, evoluindo sua trama até que exista um potencial futuro animador. Durante a passagem do trio em Madripoor, uma cidade que é muito importante para o universo da Marvel nos quadrinhos (principalmente para os X-men), acabamos reencontrando Sharon Carter, que se tornou uma fugitiva desde Guerra Civil e segue se exilando do grande vilão americano, que a caça a todo custo mesmo após o perdão forçoso que tivemos em Ultimato. A trama ainda nos presenteia com a presença das Dora Milaje, que comandadas por Ayo são enviadas para capturar Zeemo, o assassino do rei T’Chaka, o que termina se tornando uma bela execução de poder, superioridade e poder feminino, orgulhando a todos pela representatividade poderosa que a Marvel está sendo capaz de criar.

Indo fundo num grande debate politico e moral, a série foge completamente dos dilemas psicológicos de WandaVision e nos leva a encarar o monstro americano da supremacia politica. A série quer deixar claro que não existe apenas o bem e o mal, existe uma terceira opção muito mais tortuosa e complexa, que é a opção que nos deixa cara a cara com o conceito de herói. É através de Bucky que vemos uma grande redenção moral, uma luta contra o passado e para se provar como um novo homem, mas a chegada de John Walker na série muda completamente os dilemas, ele conquista nosso ódio a primeira vista para logo depois ser desconstruído para nos deixar cada vez mais em duvida, será que John é realmente um bom homem que quer honrar o legado ou ele é apenas o pior herói que existe, capaz de manchar completamente o significado do título ‘Capitão América’?

“Talvez ele tenha errado sobre você, e se ele errou sobre você, pode ter errado sobre mim.”

Há um misto de emoções em “The Star-Spangled Man” (episódio 2), onde somos apresentados oficialmente a Isaiah Bradley (um personagem com grande importância para os quadrinhos e que abre uma porta chave para o MCU) e somos forçados a ver a penosa crítica racial frente à forma que Sam é tratado pela policia, que o trata como inferior por ser um negro e logo depois muda completamente de comportamento quando o reconhece como Falcão. Temos um grande choque com o final de “The Whole World is Watching” (episodio 4), quando o mundo inteiro vê a destruição de um símbolo enquanto assistimos a desconstrução da causa dos Ápatridas e as consequências de uma atitude egoicamente motivada. Mas o verdadeiro show surge com “One World, One People” (episódio 6), a season finale que conclui toda a evolução de seus personagens e nos leva ao momento que tanto esperávamos desde o anuncio da série, um final cheio de emoção, fanservice e surpresas que vai deixar qualquer um aplaudindo de pé.

Se podemos ter uma certeza no final, é que o legado de Steve Rogers foi muito mais que o escudo, não é um escudo que faz o Capitão América, mas o homem por trás do escudo que constrói o símbolo, o legado de Steve não foi o escudo, mas sim a semente de honra que ele plantou dentro de Sam e de Bucky, e é justamente essa semente que vai se desenvolvendo durante a produção e vai nos levando ao desenrolar perfeito. The Falcon and the Winter Soldier pode não ser o espetáculo visual que cativou a todos com WandaVision, mas ele é, com toda a certeza, um espetáculo moral capaz de conquistar uma outra parte de nossa alma, capaz de nos fazer refletir sobre politica, raças e posição social, fazendo todos refletirem sobre poder e sobre submissão, uma série capaz de nos mostrar que a verdadeira honra é quebrar os estigmas e ser o melhor de si mesmo.

“O mundo está de cabeça para baixo. Precisamos de um novo capitão, e não vai ser o Walker.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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