Review | Os Irregulares de Baker Street [Season 1]

Nota
3

“Tem alguma coisa em Londres.
A escuridão chegou na cidade.”

Numa Londres vitoriana, do século 19, Bea, Jessie, Spike e Billy precisaram se unir para sobreviver nos becos da Rua Baker, criando uma pequena família desregular, e precisam arrumar dinheiro para pagar suas despesas, o que os leva diretamente até o número 221b da Rua Baker, onde o Doutor John Watson e seu sócio, Sherlock Holmes, precisam de ajuda para se infiltrar no submundo de Londres e conseguir informações cruciais para suas investigações de elite. Agora que estão oficialmente trabalhando como detetives particulares, o grupo ganha um novo sentido a seus dias, uma nova renda para sua salvação e começam a entender suas verdadeiras habilidades enquanto imergem no mundo sobrenatural que habita as ruas de Londres.

Criada por Tom Bidwell para a Netflix, a série foge das inspirações literárias para desenvolver uma história completamente original para os Irregulares, grupo criado por Arthur Conan Doyle e que figura em alguns livros da série de Sherlock Holmes. Nos livros, o grupo é formado por crianças de rua que conseguem transitar pelas ruas de Londres e ouvir sem ser percebido, mas na série o grupo vai além, se tornando um grupo de agentes que servem para ir aos lugares onde a presença elitista dos investigadores não será bem vista. Com a superficialidade dos relatos sobre o grupo nos livros, a série acabou tendo uma abertura para criar muito mais sobre os personagens, tendo liberdade para fazer a formação de uma forma original e muito mais diversa. A série explora mais a fundo os grandes mistérios da 221b, expandindo sua mitologia ao trazer os mitos da Ordem Hermética da Aurora Dourada (na série chamada apenas de Golden Dawn), uma sociedade secreta surgida na Inglaterra em 1888, e ao brincar com a mente dos fãs de Sherlock, que passam boa parte da série vendo Watson, Sra. Hudson, Inspetor Lestrade e até Mycroft Holmes desfilando pela tela, o que alimenta cada vez mais o desejo de conhecermos o misterioso sócio do médico de Baker Street, de vermos a persona e a aparência do Sherlock dessa realidade, um Sherlock que parece muito diferente do homem que conhecemos nas outras adaptações de Conan Doyle.

O papel de Royce Pierreson como Watson é um catalisador na trama, todo o mistério que envolve a vida do médico parece projetar as missões do grupo, e todos os seus segredos parecem alimentar nossa dúvida sobre suas verdadeiras intenções. Royce é obscuro e adiciona um mistério maior na trama, quem ele realmente é? o que realmente ele busca? para que realmente serve todos os artefatos em seu porão? Mas os Irregulares são os verdadeiros astros da trama, Bea é a líder deles, uma garota teimosa, feroz e protetora que conhece Watson e acaba aceitando sua proposta como forma de ajudar sua ‘família’ a sobreviver. Interpretada por Thaddea Graham, a personagem é cheia de camadas, ela é inteligente, ela é astuta, ela é maternal, e acaba se tornando o centro de um insosso triângulo amoroso. Jessie é a irmã de sangue de Bea, ela cresceu estando sempre doente, o que faz Bea sentir uma enorme necessidade de protege-la, mesmo depois que é revaldo que sua doença existia por conta de seus poderes reprimidos, Jessie tem o dom da Psicometria, que a permite ver as memórias daqueles em quem ela toca. Um papel que é muito bem executado por Darci Shaw, adicionando uma graça e um representatividade no show que não da para ser explicada, pena a atriz ter tão pouco tempo de tela e seu plot ser deixado apenas como plano de fundo.

Spike é o esperto do grupo, ele tem uma rapidez em sua fala e em seu pensamento, o que o faz ser a lábia do grupo, o que os ajuda a se sair mais inteligentemente das situações e a alcançar informações cada vez mais secretas de forma mais rápida. McKell David prova muita habilidade com sua atuação, ele se torna para Os Irregulares o que Michael Peña acabou se tornando para o Homem-Formiga. Billy é o mais velho do grupo, ele rapidamente se torna a presença paternal e os  músculos do time, ele é pavio curto e está sempre disposto a resolver os problemas na violência, o que leva o grupo a poder ir mais fundo nas sombras de Londres sem medo do perigo. Infelizmente Jojo Macari não consegue explorar todas as camadas de seu papel de forma eficiente, e sua paixão por Bea, o que o leva para o triangulo amoroso principal da trama, parece só afundar ainda mais seu personagem no lodo do tédio que parece empestear a série. O último membro do grupo é Leo, um Irregular a parte que é, na verdade, o Principe Leopold (livremente inspirado no Duque de Albany), um príncipe que sofre de hemofilia e resolve sair escondido de seu castelo para se aventurar pelas ruas de Londres, o que o leva a conhecer Bea e, enquanto esconde sua verdadeira identidade, se unir ao grupo. O papel é assumido por Harrison Osterfield, que parece ser uma boa base para muitas tramas paralelas (principalmente por sua doença e por ter fugido do castelo para poder viver como um adolescente normal), mas que acaba sendo resumido a se tornar o cérebro requintado do grupo, que fornece as informações maiores, e a ser o terceiro membro do triangulo amoroso formado com Billy e Bea.

Sendo uma adaptação dos livros de Sherlock ao mesmo tempo que é uma trama completamente original, a série consegue unir o melhor dos dois mundos enquanto tenta se embrenhar pelo terreno do sobrenatural, enquanto nos atiça com o mistério que circunda a identidade do Plague Doctor e sua conexão com a Fenda, mas começa a se perder quando começa a usar o passado de Alice Cook, a mãe de Bea e Jessie, para se conectar com o passado de Sherlock e Watson e com o significado da Fenda. O ápice da obra é quando vemos conexões do roteiro com as lendas da Astrum Argentum de Aleister Crowley, usando o ocultismo como a maior fonte de seu mistério, mas essas conexões não duram até o final da série, tendo seu maior destaque em “Ipsissimus” (episódio 3), quando o show vai mais fundo nas referencias à história sobrenatural de Londres, nos levando a fundo na Golden Dawn e apresentando seus membros, que na verdade parecem ser homenagens a grandes membros da sociedade secreta original. Temos Alan Crowley (Aleister Crowley), R.P. Breakwater (W.B. Yeats), Patricia Coleman Jones (Pamela Colman Smith), Dion Cross (Dion Fortune), Gustav Felkin (Gustav Meyrink e Robert William Felkin) e Richard Wynn (William Wynn Westcott), uma trama que leva diretamente para os conceitos que Crowley introduziu na Golden Dawn e na Silver Star, e que se mostram de grande importância para mitologia da série.

Com seus oito episódios de cerca de 50 minutos, Os Irregulares de Baker Street começa nos cativando, nos prendendo às suas tramas sobrenaturais e a seus ‘mistérios semanais’, mas logo começa a ir perdendo sua graça, como se fosse perdendo o espirito que chamou atenção em seus primeiros episódios. O show pode até começar executando perfeitamente a função de transportar o brilhantismo das obras de Arthur Conan Doyle para o terreno do sobrenatural e das séries teens, mas o show se prejudica no momento em que começa a desenvolver mais seu lado teen, deixando a desejar no teor sobrenatural e de mistério, iniciando de forma empolgante e cheia de potencial, mas acabando de uma forma maçante e duvidosa. Assumindo o papel de ser um Stranger Things do século 19, a série acaba tendo tantos clichês que perde a chance de ser melhor construída, trazendo elementos que o impedem de ser melhor e que, talvez, pudessem ser expandidas em uma segunda temporada (que não vai acontecer já que a série foi cancelada), no final, nos resta agradecer por ter tido a chance de conhecer Darci Shaw e Thaddea Graham, duas atrizes que tem muito potencial a ser explorado e merecem ser escaladas para uma produção onde possam ser realmente aproveitadas.

“Não se afaste demais. Esse é só o começo.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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